O ambulatório da sexualidade do Hospital das Clínicas realizou uma pesquisa sobre o nível de satisfação sexual das mulheres, obtendo o seguinte resultado: apenas 22% das mulheres confirmaram chegar ao orgasmo, enquanto 78% delas afirmaram desconhecer esse prazer.
Diante dessa estatística nada sedutora para o universo feminino, surge uma pergunta inevitável: quais fatores poderiam ser apontados como responsáveis por esse descontentamento entre quatro paredes? A resposta para essa pergunta está submersa num emaranhado de fatores que envolvem: a cultura machista, a visão do sexo como algo sujo, a interferência da religião, dentre outras questões.
A cultura machista é apontada uma vez que, culturalmente, o homem sempre recebeu permissão, estímulo e até mesmo cobrança no sentido de colecionar experiências sexuais, reconhecendo como “ostentação” a manifestação da sua sexualidade, em contrapartida, às mulheres sequer era permitido o direito de sentir desejo, percebendo, na prática sexual, o objetivo único da procriação.
A visão do sexo como algo sujo e ilícito é outro fator de peso para a interferência na qualidade do sexo para as mulheres, afinal, como estar disponível física e emocionalmente para algo que é tão “imundo”?
E o que falar da interferência da religião na sexualidade humana, em especial das mulheres? Vou relatar algo que presenciei há dois anos: num grupo de oração numa igreja, uma jovem senhora na faixa dos seus 35 anos levantou a mão e pediu ao grupo que orasse por ela, pois ela estava com a libido muito ativa e estava numa fase onde o desejo sexual dela, pelo marido, estava “fora do comum”. Em suma, ela estava incomodada por estar gostando de manter relações sexuais pelo marido, justificando-se como “usada pelo inimigo” para pensar muito em sexo. E, pasmem-se, era uma mulher bem instruída intelectualmente. Ali eu pude perceber a gravidade da situação. Oras, se a mulher sente-se culpada e pecaminosa por estar “acesa” pelo marido, é possível imaginar o grau de repressão a que ela fora submetida, concordam?
O fato é que existe uma conjunção de fatores que atuam nesse prejuízo da qualidade sexual da mulher. Considerando que para uma sexualidade satisfatória é fundamental que a pessoa conheça bem o próprio corpo, como isso será possível se há toda uma manipulação trabalhando no sentido de a mulher não se tocar, não pensar em sexo e sentir-se culpada por sentir desejo?
Diante disso, não há motivos para surpresas ao nos depararmos com essa estatística tão desestimuladora. Imaginem o universo de mulheres sexualmente frustradas que existem nesse planeta? Mulheres que são tratadas como “depósitos” de sêmen dos próprios maridos, que sequer se importam com a satisfação delas. Mulheres adoecidas emocionalmente, se entupindo de medicamentos controlados e com a autoestima destruída. E advinha quem sai lucrando nesse contexto tão “brochante”? A indústria farmacêutica e os profissionais da saúde mental.
Imagem de capa:Shutterstock/ESB Professional