Por Milena Carbonari Krachevski
Na composição integral do ser humano, a ciência identifica as dimensões física, psíquica, social e espiritual como sendo, basicamente, as principais que possuímos. Mesmo que em algumas abordagens filosóficas e antropológicas apareçam mais ou menos dimensões, trataremos, por ora, dessas quatro.
No geral, o desejo humano tende a buscar somente o lado positivo de cada uma dessas dimensões, às vezes num afã quase neurótico por saúde, beleza, alegria, euforia, êxtase etc. Assim, se estamos em um ambiente social, queremos nos sentir amados e acolhidos, buscamos ser bem vistos pelas pessoas que estão por perto. Se num ambiente profissional, desejamos o reconhecimento por nossos feitos, os feedbacks positivos dos superiores etc. Também queremos – às vezes exigimos – aceitação do nosso parceiro afetivo quando estamos numa “bad”, queremos elogios quando tiramos boas notas ou apresentamos um bom trabalho acadêmico e por aí vai.
Se fizermos um honesto exame de consciência, muito provavelmente nos identificaremos com alguns ou muitos desses exemplos. Entretanto, a proposta que faço aqui é para olharmos com mais receptividade para situações tão humanas quanto a alegria, o prazer, o riso, a paz. Por que não acolher também a tristeza, a frustração, a raiva? Como diria o poeta Terêncio: “nada do que é humano me é estranho”; podemos alargar o significado dessa frase reconhecendo que tudo o que é humano pode agregar, trazer mistérios reveladores, apresentar novas realidades que antes estavam encobertas pela luz da harmonia.
Não precisamos buscar sofrimentos; inevitavelmente as dores se apresentam a todas as realidades humanas. Contudo, é possível fazer escolhas dentro das circunstâncias mais opacas e densas que somos levados a provar vez ou outra. A perda, o luto, o fracasso, a inveja, a vergonha e tantas outras emoções não precisam receber nossa invariável resistência e rejeição. Se adotarmos posturas de negação frente aos sentimentos menos agradáveis, provavelmente eles persistirão e se agravarão ao longo do tempo.
A proposta, assim, é lançar um novo olhar para as emoções negativas, e não apresentar resistência a elas. Assim como acolheríamos a alegria, podemos receber a tristeza como uma companheira que tem algo a dizer nesse determinado momento. Quanto tempo essa hóspede irá permanecer? Talvez o tempo da aprendizagem do novo, o tempo da quebra de um tijolo dentro do peito, quem sabe o espaço entre você e a maturidade, entre você e a verdadeira liberdade interior.
Se aparecer a inveja, o ciúme, permita-se um olhar profundo para dentro de si e pergunte-se: o que essas emoções têm a me dizer? Pergunte à angústia, à ansiedade: onde querem me levar? Que lugares dentro de mim devo olhar com mais cuidado, onde devo depositar mais amor, ternura, em quais cantos escuros devo me demorar com mais paciência? No final das contas, essas emoções tão facilmente rejeitadas, podem ser amigas que o auxiliarão a encontrar respostas e a despertar o lado criativo que há dentro de você.
Os momentos de passagem tendem a ser desafiadores. Angustiamo-nos quando não enxergamos o outro lado do caminho, quando falta o horizonte e os consolos. Entretanto, se nos dispusermos a abaixar nossas resistências ao que é inesperado e desagradável, haverá a oportunidade de descobrir que, quando estamos na sombra, podemos observar a luz com mais nitidez. E então, o novo se abrirá em forma de crescimento, maturidade, humildade, paz etc.
Coragem! A aventura do autoconhecimento certamente te levará para vales, montanhas, lagos e abismos, mas é um desafio que te fará mais autêntico, maduro e livre.