Por Angelita Corrêa Scárdua
O que torna alguém feliz? É possível ser feliz 24hs por dia? Ser feliz é o mesmo que ser alegre? A felicidade exclui experiências negativas? Alguns psicólogos esforçam-se por tentar responder a essas e a muitas outras perguntas, e eu me incluo entre eles. Pouco sabemos sobre a felicidade, ao contrário, durante muito tempo, era muito mais fácil encontrarmos em abundância páginas e páginas de estudos sobre a infelicidade, a dor, a tristeza, e todo tipo de experiência que consideramos ser responsável pela infelicidade.
Embora esse cenário esteja mudando, ainda existe em nossa cultura uma busca desenfreada para entender a infelicidade: se o tópico de interesse é trabalho, encontramos substanciosos volumes sobre o desemprego, os problemas advindos da aposentadoria, a (im)possibilidade do primeiro emprego, etc.; se o assunto é saúde nos deparamos com extensas obras sobre a doença, o sofrimento físico e mental e por aí vai. Se falamos do amor – Ah! O amor! – nos debruçamos sobre a infidelidade, o ciúme, a dependência afetiva. E, no sexo, a impotência, a frigidez, a anorgasmia…
Por outro lado, essa cultura da infelicidade torna-se bastante rentável, a medida que a cada mês são lançados dezenas de livros que prometem fórmulas mágicas para a felicidade no trabalho, no amor, no sexo, nas finanças, etc. Similarmente, reportagens em revistas, jornais, programas de rádio e televisão prometem o caminho da felicidade com receitinhas fáceis e “caseiras”; ao mesmo tempo em que a literatura, a teledramaturgia e o cinema colorem o nosso imaginário com finais “felizes” para sempre”, conquistados com a vitória do bem sobre o mal.
Em paralelo a tudo isso, a Ciência oficial, àquela dos laboratórios e dos tubos de ensaio, ensaia para cada nova temporada o lançamento de um medicamento milagroso que poderá acabar com o nosso sofrimento, a nossa depressão, a nossa impotência, o nosso mau humor… ou seja, com a promessa nada sutil de nos tornar mais felizes!
Você já desejou poder resolver os problemas da sua vida num passe de mágica? Provavelmente cada um de nós, uma vez ou outra, desejou escapar da dor e da tristeza sem sofrimento, num golpe certeiro de um gole de água seguido de uma “pílula dourada” que pudesse trazer alívio imediato.
Infelizmente, ou felizmente, a felicidade não pode ser comprada na farmácia ou na livraria, ela não está a venda na concessionária de carros, ou naquele MBA que se anuncia. Sorte, ou azar nosso, não há um consórcio para a felicidade, cuja prestação seja o “passo a passo” daquele programa vespertino, ou a conquista daquela pessoa em especial.
Se o que a Psicologia investigou até hoje, sobre a experiência da felicidade, for verdade, então a felicidade é uma condição pessoal e intransferível. Não pode ser passada adiante numa fórmula, eficaz e infalível, que possa ser generalizada para todo mundo. Se há uma verdade sobre a felicidade, é que ela é fruto da busca individual de cada um pela realização do próprio desejo, e ponto!
E como é possível realizar o próprio desejo e ponto!? Antes de mais nada, é preciso descobrir qual é o próprio desejo. Entendamos desejo aqui como aqueles sonhos e condições que priorizam a nossa realização pessoal – e não a vontade de nossos pais, as pré-determinações de gênero e sociais, ou as expectativas de nossos pares, ou de nosso grupo étnico e cultural. Identificar, reconhecer e aceitar o próprio desejo não é uma tarefa fácil, exige vontade e disposição para romper com crenças, atitudes e valores que reproduzimos automaticamente, sem questionarmos se realmente é aquilo que pensamos ou queremos.
Venho estudando a Psicologia da Felicidade, há cerca de 10 anos, e, de forma surpreendente, os resultados que tenho obtido são similares aos de estudiosos de países mais ricos e prósperos que o Brasil. Tanto aqui quanto lá, há nos relatos das pessoas estudadas, algo que desponta como sendo fundamental na experiência da felicidade. Esse algo é a constatação de que: o que possibilita a vivência da felicidade não é o que fazemos, mas é como fazemos. Ou seja é a maneira com que nos responsabilizamos, ou não, pelo que ocorre em nossas vidas que faz com que nos sintamos mais, ou menos, donos de nossa própria história e, por conseqüência, mais ou menos próximos daquilo que desejamos ser.
Se responsabilizar pela própria história, implica em reconhecer as próprias limitações, assim como acena para a possibilidade da descoberta de potencialidades e vontades adormecidas/esquecidas. Portanto, não me parece que a possibilidade da felicidade se encontre acoplada a uma pessoa ou objeto exterior àquele que a busca, que possa ser medida ou calculada em receitas ou cifrões, muito menos que se encerre numa cápsula ou num conta-gotas…
Apesar de haverem hormônios envolvidos na experiência da felicidade – como há em toda experiência que envolva nossos sentidos – me sinto segura para dizer que não basta manipular quimicamente o cérebro para ser feliz, porquê felicidade não é apenas bem estar, não é apenas alívio para depressão ou mal humor. Felicidade é, antes de tudo, equilíbrio entre nossas necessidades físicas e nossas aspirações espirituais.