A nossa sociedade líquida tem dificuldades de escutar. Tudo é apressado, onde emergem o individualismo, a fluidez e a efemeridade das relações. Um mundo repleto de sinais confusos, propenso a mudar com rapidez e de forma imprevisível, como identificou o sociólogo Zygmunt Bauman.
Tal rapidez se revela na prática de alguns profissionais, que não mostram boa vontade para escutar, como por exemplo: comunicadores de rádio e televisão que falam aceleradamente, religiosos que acham que Deus é inaudível, psicoterapeutas que divagam ao perceber voz dos pacientes, professores que se incomodam com a fala dos alunos, empresários que abreviam a conversa com os funcionários e políticos que depois de eleitos ignoram a locução dos eleitores.
Há outras situações, como aqueles maridos que não prestam atenção nas palavras das esposas, pais que se irritam ao ouvir os anseios dos filhos, amigos que só querem desabafar ao invés de escutar. Os elementos neuróticos da aceleração da fala possuem a sua origem no ritmo alucinante das nossas cidades, que reforçam um estado temporário e frágil das relações sociais e dos laços humanos, afetando a saúde mental das pessoas.
A mania da pressa urbana, associada a falta de escuta, produz mal-estar na comunicação. A vida seria mais tranquila se as pessoas escutassem ao contrário de ouvir de modo superficial. Para escutar, torna-se imprescindível o uso de um mecanismo especial: saber dar atenção. Demanda, de uma escuta mais cautelosa, pois quem escuta, ouve, mas quem ouve não necessariamente escuta.
As pessoas que ouvem de maneira líquida têm dificuldades de se envolver num processo autêntico de comunicação. Escutar é mais que ouvir, gente que escuta dá atenção ao contexto da conversa, entende o assunto, percebe o que foi dito, reconhece as palavras. Contudo não é um ouvinte passivo, sabe distinguir o que é falso e verdadeiro, sem julgar.
O neurologista auditivo Seth S. Horowitz publicou um artigo publicado no New York Times, onde avaliou que ouvir de forma passiva é uma consequência do nosso sistema auditivo. Segundo o cientista, a distração digital e sobrecarga de informações estariam se tornando uma epidemia num mundo, que está trocando conteúdo por conveniência e significado por velocidade.
Mas para Seth escutar é uma ação ativa, uma arte que requer habilidade e foco, que pode ser cada vez mais melhorada. É como nos ensina, o líder espiritual do budismo tibetano, o Dalai Lama: “A arte de escutar é como uma luz que dissipa a escuridão da ignorância”
Neste mundo, somos tensionados a falar rápido e ouvir o mínimo possível, escutar não entra na lógica da modernidade líquida. Porém, a arte de escutar é um sábio conselho que os grandes mestres nos deram: Freud, Sócrates, Buda e Jesus, pois para eles uma comunicação perfeita e sem ruídos nos transforma em pessoas melhores e bons ouvintes, no sentido correto da escuta.
Imagem de capa: Shutterstock, Nuamfolio
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