COMPORTAMENTO

Amo a maternidade, mas ela não me ama

Por Érica Donahue

“Amo a maternidade, mas a maternidade não me ama.”

Esse era um mantra disfuncional que eu repetia diariamente, mas que, de algum modo, me ajudava a conservar a aparência de sanidade que ainda me restava. Eu simplesmente não tinha nascido para essa coisa de ser mãe, e não era minha culpa. Algumas mulheres têm vocação natural para ser mães, e outras, não. Talvez eu fizesse parte da última categoria, só isso.

Mas eu desejei tanto ter um filho! Ao longo de toda a gravidez eu me alegrava profundamente ao pensar nele. Eu acariciava minha barriga, conversava com meu bebê, pensava nele, cantava para ele, cuidadosamente repassava todos os detalhes de seu quarto, suas roupinhas, seus artigos para o banho.

Meu filho era meu mundo antes mesmo de vir ao mundo, mas, mesmo assim, de repente eu me senti desligada da vida. Eu me criticava todos os dias, o tempo todo, por não sentir prazer nas tarefas diárias que acompanham a condição de ser mãe.

Sob alguns aspectos, eu ansiava por voltar à minha vida antiga. Parecia que eu estava fracassando sem parar. A condição de mãe simplesmente não parecia certa para mim. Alguma coisa tinha mudado.

Ao mesmo tempo, não havia nada que eu quisesse mais do que ser uma mãe maravilhosa. Eu sentia falta de meu filho quando não estávamos juntos e não via a hora de estar com ele de novo.

Mas, quando estava com ele, eu me sentia sozinha e solitária; alguns dias, ficava contando os minutos até a hora da soneca dele ou de ele ir dormir à noite. Eu não entendia esses sentimentos de maneira alguma, não sabia de onde vinham.

Eu não estava presente. Estava perdida. Tinha caído numa toca de coelho e ficava fazendo as coisas automaticamente, sem estar presente. Eu me odiava, mas amava meu filho infinitamente.

Comecei a pirar diante do paradoxo de tudo isso.

A depressão chegou correndo numa velocidade para a qual eu jamais poderia ter me preparado.

E, para agravar as coisas ainda um pouco mais, eu sou terapeuta. Terapeuta familiar. E estava ali: me afogando e lutando para me manter à tona na vida, no casamento, na maternidade, na saúde mental, e sem conseguir encontrar uma maneira de sair daquela situação.

Eu estava sendo devorada viva pelo sentimento de culpa e de vergonha que tomava conta de mim todos os dias. Me sentia para lá de avassalada. Eu precisava encontrar um jeito de parar de me afogar, porque o barco estava afundando.

O medo de ser julgada ou não ser compreendida paralisava meus dedos, que normalmente iam querer voar com minhas emoções e me deixar dar vazão a meus sentimentos do modo que eu sempre fiz, que é escrever.

Eu queria poder dizer que houve uma saída simples para eu me tirar dessa situação, mas não houve. Eu dei nome ao meu problema e, desse modo, o fiz diminuir um pouquinho. Esse é o primeiro passo.

Conversei com amigos, familiares, terapeutas e médicos. Pouco a pouco fui encontrando maneiras de cuidar de mim mesma outra vez (espiritual, emocional e fisicamente), para que eu pudesse cuidar de meu filho. Para que pudesse lhe mostrar autenticamente a mãe feliz e divertida que existe dentro de mim, mas que em alguns dias parece que não consegue sair para fora.

Dizem que é preciso uma aldeia para criar uma criança. E talvez para criar uma mãe, também.

Hoje em dia estou me sentindo como eu mesma outra vez, mas não esqueci a dor pela qual passei naquela época. Às vezes ainda sinto medo, porque aquilo chegou sem aviso prévio e foi embora sem dar adeus, então é possível que ainda esteja escondido diante de minha porta. Não sei se e quando vamos nos encontrar de novo.

Mas o que eu hoje sei é que consigo superá-lo. Acho que todos podemos, com a ajuda e o apoio certos.

A depressão pós-parto e a depressão de modo geral são bichos feios e tenebrosos, e as melhores entre nós muitas vezes as enfrentamos sozinhas. Não sabemos como falar sobre isso ou pedir ajuda. Eu sei, pessoal e profissionalmente, que compartilhar com outros o que estamos vivendo ilumina aquela escuridão e ajuda a reduzir um pouco daquele estigma.

Somos todas humanas, nada mais. Mas é constrangedor admitir para qualquer pessoa que temos depressão pós-parto, especialmente para outras mães e ainda mais para nós mesmas.

Então esta é a história de como superei a depressão, me reconquistei e voltei a me SENTIR como a mãe que intelectualmente sei que sou, apesar de minha mente às vezes me dizer outra coisa.

Se você enfrenta ou já enfrentou sintomas de depressão pós-parto, por favor compartilhe este artigo e inclua sua experiência. Quanto mais pudermos conversar sobre isso, nos enxergar na experiência de outras pessoas e validar nossas experiências, menos vai pesar a depressão e mais estaremos interligadas.

TEXTO ORIGINAL DE BRASILPOST

Psicologias do Brasil

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