Por Adriana Nogueira
Perguntaram-me: “Como me tratar bem, como me sentir merecedora? Uma coisa é tomar consciência; outra é conseguir mudar isso”.
Grande pergunta, mas minha psicologia é tudo, menos um “how to”. Uma pergunta dessas me deixa perplexa porque não tenho receitas. Como se faz para se amar?
Diria que, em primeiro lugar, é preciso tomar consciência de nosso não-amor para conosco. Sem saber onde está o problema e quando ocorre, não tem como consertá-lo. Então, primeiro passo: tomar consciência do problema.
Já isso é um desafio. A maior parte das pessoas não têm coragem de encarar o desamor que sentem por si mesmas e muitas delas estão tão acostumadas a se maltratar que não questionam, só sofrem. No nosso caso, temos alguém que já sabe que precisa aprender a se amar. Então, começa-se passando da tomada de consciência geral para as tomadas de consciências “particulares”: aprender a estar presentes a si próprios e perceber quando a falta de amor acontece.
Tomar consciência “em geral” não é uma tomada de consciência completa: falta a encarnação diária da nova consciência. É como um novo par de óculos. Esse novo olhar precisa reenxergar a realidade, precisa-se aplicar a nova ótica. Por isso: preste atenção em si, no que faz, no que fala e responde, em suas escolhas. Observe e anote onde e quando o desamor acontece.
Em segundo lugar, olhe para o que descobriu. Olhe-o, sem julgamentos. Como isso é difícil! Percebo que as pessoas não sabem o valor do autoconhecimento, que nada tem a ver com moral e julgamento. Autoconhecimento é saber olhar para o que é. Ninguém escolhe não se amar. Portanto, não faz sentido se julgar por causa disso. O comportamento correto é se surpreender (apesar da vergonha que também dá).
Se você não se surpreender, se pergunte por quê? Candidamente: por quê?
Pode surgir uma lista de “culpas” e “fracassos”. Ou não. Pode também não haver resposta. Interessante, não? Se aparecerem motivos para o desamor, estes precisam ser analisados, objetivamente. Se não… de onde vem o desamor? Busque o fio da meada e irá começar uma viagem ao contrário. Às vezes, não se encontra nada, ou assim parece; outras sim. Na verdade, há sempre alguma origem, é que nem sempre está acessível à memória ou à nossa consciência no nível em que está.
Mas, o fato é que ao fazer esse percurso e a tomar esse tipo de atitude consigo mesmo, o foco do desamor vai deslizando, saindo da atuação automática para a dúvida e, sobretudo, para sua reavaliação. E nisso irá se dissolvendo.
A tomada de consciência tem efeitos milagrosos, muito mais poderosos do que o aprender de cor uma suposta receita da felicidade. Ao tomar consciência do desamor, nos “desgrudamos” de sua implementação automática, que é cega. Ao questioná-lo, lucidamente já entramos em outro patamar, já estamos nos tratando bem. Já estamos criando uma nova relação conosco, um novo olhar que parte de novos pressupostos. E aí percebemos que aquele desamor vem de um olhar sobre nós estranho, esquisito… questionável.
Pode haver algo que precisamos resolver antes de nos amarmos. Se nossa consciência não está em paz não há truques que funcionem. Encare então o que precisa ser encarado. Se não houver nada para resolver, então é repetição de um padrão de relacionamento consigo que foi adquirido num passado, longíquo ou remoto (nunca recente) que precisa ser mudado. Você pode mudá-lo.
Comece dando atenção a si mesmo, conheça-se. Não viva seu dia a dia e sua pessoa como fossem um dado adquirido, mas como se fossem uma caixinha de surpresas que lhe cabe desvendar. Você é seu próprio cuidador, sua mãe e seu pai.
Imagem de capa: Shutterstock/volodimir bazyuk
Texto original de Gazeta News
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