Antônio da Silva Costa nasceu em Parnaíba, cidade do interior do Piauí. Sua mãe, desde cedo, alertava seus professores. “Esse menino tem um problema sério de manhosidade. Não quer nada com nada. Só pensa em assistir tevê, principalmente filmes desses antigos, e ficar na janela vendo as moças passarem.”
Ela estava certa. Esta era a rotina de Antônio quando criança e adolescente. Não gostava de futebol, preferia correr na estrada. No bairro, todos o conheciam. Aonde ele passava, parava e contava histórias, conversava, sempre carregou um bom número de ideias pra entregá-las a quem estivesse disposto a ouvi-lo.
Começou a trabalhar, aos 16 anos, numa mercearia. Arrumava as prateleiras, tirava a poeira do chão, vendia, contava as moedas, dava troco. Do salário parte era pra ajudar na comida de casa, parte para realizar o sonho de sua vida. Ser fotógrafo.
Um ano depois, finalmente, ele achou conseguir metade do que precisava. Ninguém o ouvira reclamar. Sabia que para ter sua primeira máquina seriam necessários três anos de economia. Errou, foram quatro anos. Finalmente comprou os equipamentos. Demorou mais uns meses até aprender a usá-los. A primeira foto foi da mãe cozinhando o baião de dois. Surgiram convites e Antônio tornou-se o fotógrafo oficial das festinhas da Paróquia.
Na mercearia, conheceu uma mulher. Ela não falava. Muda de infância, Vanessa Francisca Bezerra, encantou Antônio que a convidou para ser sua modelo. Após Vanessa, vieram outras modelos. E mais outras. Com a primeira modelo, Antônio casou-se.
A fama do fotógrafo se espalhou e ele foi convidado a participar de um evento em São Paulo. Lá, quando pegou sua máquina para registrar um rosto que lhe chamara atenção, o rosto disse:
– Como você pode ser fotógrafo sendo cego?
Cego? O que é cego? Pensou Antônio. Logo, mais questionamentos. Antônio foi descobrindo que não enxergava como os outros. Nunca foi tratado como cego, pensava que todos viam as coisas pelos ouvidos e pelas mãos.
A mãe e sua esposa muda, que só sabia lhe dizer sim com um toque nos olhos, confirmaram também.
Antônio riu, riu, riu enquanto ouvia “você é deficiente, Antônio.”
Ele, num sotaque de resistência, responde:
– Para mim que vejo com as mãos e os ouvidos, deficiente é você que só enxerga pelos olhos.
Em seguida, virou-se e fotografou o barulho que o vermelho faz.
Nota do autor: Conto inspirado no fotógrafo cego Evgen Bavca e em agradecimento à amizade do meu tio Gilvan, que 1 por cento é portador de paralisia infantil e outros 99 por cento é coragem.
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