Por Laura Pires no Médium
Meu maior aprendizado esse ano foi que as outras pessoas nunca são o problema, nem a solução, e que nossas questões são sempre internas. Tudo aquilo que nos incomoda nos outros diz muito sobre nós mesmos e nada sobre os outros.
Comecei a refletir acerca disso lendo sobre Comunicação Não-Violenta e foi o que me estimulou a focar mais em autonomia pessoal do que em tentar responsabilizar outras pessoas por tudo que me incomoda nelas. Se hoje sou muito mais segura de mim mesma e tenho muito mais autoestima do que já tive na vida, é porque escolhi me responsabilizar pelos meus sentimentos e usar isso como guia para minhas relações. Mas o que exatamente significa se responsabilizar pelos próprios sentimentos?
Essa aprendi na terapia. Em dada ocasião, eu estava me sentindo rejeitada e cheguei no consultório esbravejando, cheia de razão. Minha psicóloga pegou comigo minha linha do tempo e revemos, desde a infância, diversas situações em que o sentimento foi de rejeição, de sentir que não importo para as pessoas. E aí ela disse que é como se eu tivesse um botãozinho. Às vezes as pessoas fazem coisas que apertam meu botãozinho, mas o botãozinho é meu. Pessoas que não têm esse botãozinho não se sentiriam dessa forma na exata mesma situação.
Vou exemplificar com uma enquete que fiz no Facebook.
A opção vencedora foi letra B. Alguns responderam letra F (o que é óbvio), mas acabavam caindo na B ao justificar, com uma exceção ou outra para amigos que você já sabe que demoram mesmo pra responder. Alguns outros responderam letra G, mas com ressentimento, do tipo “não acho normal cobrar, porque se a pessoa quisesse falar comigo, falaria”, ou seja, existe uma leitura orgulhosa de que não vai cobrar resposta porque já está incomodada de não ter recebido. Uma amiga disse que não cobra, porque “a ausência de resposta já é uma resposta”. Mas quanto tempo uma pessoa tem que ficar sem responder pra você interpretar como “ausência de resposta”?
Se quer saber qual opção da minha própria enquete eu marcaria, é a letra E. Para mim, até um dia depois, entendo que a pessoa pode estar ocupada, enrolada, chateada; dois dias depois, até estranho se for alguém com quem falo com muita frequência, mas ainda enquadro nas mesmas possibilidades; entre três dias e uma semana depois, minha leitura é de que a pessoa esqueceu mesmo. Nesse momento, se for importante, mando outra mensagem pra lembrar (ou seja, cobro resposta).
Acontece que, pra muita gente, esse esquecimento é inaceitável. Por causa do meu botãozinho, também já achei que fosse. Me sentia extremamente rejeitada, abandonada até, se alguém esquecesse de me responder. Não queria nem saber o motivo. Pensava: se desse a mínima pra mim, teria lembrado. Dois anos atrás, escrevi o texto A falácia da frequência afetiva, defendendo exatamente isso. Hoje em dia, discordo do texto quase inteiro. Pessoas que claramente não têm esse botãozinho já discordaram bastante na época em que o publiquei.
Há sim aquelas pessoas que não se importam conosco e pelas quais nos desgastamos a troco de nada, mas as coisas não são tão categóricas assim e nem são sempre o caso. Quando uma pessoa não se importa, isso fica evidente de diversas outras formas; não se resume a demorar pra responder mensagem ou nos procurar com menos frequência do que as procuramos.
Não acho mais que o esquecimento das pessoas seja sobre mim. Inclusive, se a gente for parar pra pensar bem, isso não deixa de ser narcisista: a pessoa pode estar passando por uma série de problemas ou simplesmente estar com outras coisas na cabeça e a gente fica ofendido por ela não parar tudo pra falar com a gente no tempo em que achamos adequado. Cada um gira em torno de seu próprio mundo.
No tempo em que passamos nos preocupando que alguém demorou pra nos responder, também demoramos pra responder outras pessoas. Só que os nossos próprios motivos, nós conhecemos. Nossas atitudes são totalmente justificadas pelo contexto que nós sabemos que existe. Com os outros, não temos como saber, mas presumir de cara que é sobre nós é narcisista. É dar importância demais ao nosso botãozinho.
Um amigo uma vez estava no hospital com a mãe, quando recebeu uma nude. Algumas horas depois, a moça se mostrou ofendida com a falta de resposta. Ele ficou putíssimo, pois estava passando por uma situação séria, que nada tinha a ver com ela. A mãe morreu naquela noite. Claro, a moça da nude não tinha como imaginar uma tragédia dessas, mas justamente por não ter como saber, não deveria presumir. Por que, quando uma pessoa demora pra responder, nossa primeira reação é achar que estamos sendo rejeitados?
Há uma série de fatores que faz qualquer um responder mensagens em mais ou menos tempo. A não ser que haja um contexto prévio de rejeição naquela relação, não há motivo externo nenhum pra que nosso primeiro impulso seja interpretar como rejeição. A questão é toda nossa. (Também acho uma boa ideia mandar um oi e se certificar de que a pessoa está disponível antes de mandar nudes.)
Às vezes, nós estamos nos sentindo mal por algum motivo e, se alguém que a gente gosta ou está de flerte não nos responde no nosso tempo, aquilo parece o fim do mundo. Em momentos de mais leveza, nem percebemos o tempo passar e não interpretamos aquele tempo como demora. É mais difícil quando sofremos de depressão e ansiedade, pois são doenças que mexem muito com nossa forma de internalizar o que acontece conosco.
Tudo fica muito pesado e dolorido e a tendência é pensarmos demais em nós mesmos e fazermos muita tempestade em copo d’água, porque é assim que vemos as coisas. Mas já parou pra pensar que a outra pessoa pode estar deprimida ou melancólica também?
Vivemos tempos difíceis, todo mundo está passando por problemas, um montão de gente sofre de depressão, ansiedade e outras crises. Às vezes, aquela pessoa que julgamos não se importar conosco está envolvida demais com suas próprias crises para conseguir nos dar essa atenção que precisamos.
E nós também somos pessoas envolvidas demais com nossas próprias crises para conseguir dar a atenção que essas pessoas precisam. Nesse contexto, acho bem compreensível que nem sempre as pessoas consigam estar presentes e nos ajudar. Porque nós também não conseguimos.
Ritmos compatíveis
As pessoas têm tempos diferentes — que também podem variar de tempos em tempos — e isso não nos diz respeito.
Se você tenta manter uma relação, de qualquer tipo, com alguém que demora pra responder muito mais tempo do que você considera adequado e você se sente mal com isso, há opções:
Você pode concluir que isso não funciona pra você e decidir se afastar da pessoa. Acredito que isso alivia algumas dores, mas acentua outras. Além do mais, dentro de você, nada foi resolvido, então, logo você começa a ter o mesmo problema com outras pessoas.
Você pode explicar pra pessoa que isso te faz sentir mal e pedir pra que ela mude os hábitos. A meu ver, tentar fazer alguém mudar é dar murro em ponta de faca. Como nesse caso é uma simples mudança de hábito, acho até possível conseguir efeitos práticos, mas, mesmo assim, acredito que esse é o tipo de coisa que só desgasta a relação.
Você pode aceitar que a pessoa é assim e que sentir-se mal com aquilo é uma questão sua. Isso implica em aceitar que aquele é o tempo dela, e trabalhar dentro de você pra não se sentir mal toda vez que aquilo acontecer, afinal, não é sobre você. Em outras épocas, escolhi a primeira opção, pois não sabia lidar com aquele sentimento ruim. Atualmente, me inclino mais para a terceira opção. Acho produtivo, para o bem de relações entre pessoas de ritmos diferentes, nos acostumarmos a não ler as pequenas ausências dos outros como uma ofensa pessoal.
De todo modo, podemos escolher nos relacionar ou não com pessoas que não funcionam no nosso ritmo e podemos escolher também nossa atitude diante disso. São só as nossas atitudes que podemos controlar e, quando entendemos nossos próprios padrões de reação em relacionamentos, podemos cuidar melhor de nós mesmos e cultivar relações mais saudáveis.
Imagem de capa: Shutterstock, tommaso79
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