Maitê Hammoud

Divórcio quando se tem filhos: adiar ou não?

Frequentemente, casais decidem pelo divórcio, mas postergam o processo para preservar os filhos. Até que ponto adiar a decisão beneficia a família?

Nos dias atuais, o divórcio parece já ter deixado de ser tabu. A sociedade tem sido mais receptiva a aceitar sem julgamentos as diferentes composições de família. Porém, quando o casal que possui filhos decide se divorciar, costumam carregar dúvidas e preocupações frequentes relacionadas aos traumas que o processo possa desencadear em seus filhos, optando por adiá-lo.

Mas, afinal, mesmo que existam as melhores das intenções neste gesto, será que esta é a melhor escolha em todos os casos?

É compreensível que os pais possuam preocupações ao considerar que são referências importantes na vida de seus filhos, independentemente da idade que eles possuem. E por esta mesma razão, dependendo da qualidade da dinâmica que a família possui no momento atual, enquanto adia o processo de divórcio, por serem referências importantes, preservar os filhos desta exposição ao adiamento é fundamental. Por quê?

Escolhemos alguns pontos em comum de benefícios e prejuízos vividos neste momento, com objetivo de elucidar reflexões agregando conhecimento para contribuir na segurança demandada para tomada de decisões, adoção de postura ou comportamentos, zelando pela estrutura familiar e contribuindo que as mudanças ocorram com a maior naturalidade possível.

Convivência e comunicação insustentável

Muitos casais que decidem se divorciar possuem inúmeros conflitos e assuntos mal resolvidos. O acúmulo de emoções que costuma combinar mágoas e raiva resultam na convivência e comunicação insustentável. Ao postergar o processo de divórcio para preservar os filhos, o casal que vive nesta dinâmica estará afetando-os da maneira oposta – expondo ao invés de preservar.

Crianças ou adolescentes expostos a dinâmica familiar que se comunica de forma violenta e brigam com frequência, podem sofrer inúmeros prejuízos a curto, médio e longo prazo. O curto e médio prazo costumam ser percebidos:

• humor triste,
• vergonha,
• baixa autoestima,
• sentimento de inadequação,
• comportamentos introspectivos,
• dificuldades de concentração,
• queda no rendimento escolar.

A longo prazo, a criança poderá apresentar dificuldades em estabelecer relações afetivas sólidas e estáveis, possivelmente por carregar memórias cognitivas e emocionais sobre a construção de família, considerando a possibilidade de desestruturação e mágoas como resultado.

O que fazer se a decisão for adiar o divórcio

Por maiores que sejam os desentendimentos entre os parceiros, ao optar em postergar o processo de divórcio por alguma razão, seja por razões práticas (recursos financeiros, divisão de tarefas ou preservar os filhos da exposição a este tipo de trauma), a escolha se tornará viável apenas diante do consenso e acordo do casal em zelar pelo respeito e bom senso. Neste sentido, é indicado que ambos façam um acordo de convivência sobre momentos de lazer, espaço, privacidade e demais fatores que acreditarem ser necessários, na tentativa de diminuir ao máximo as chances que confrontos e conflitos sejam expostos na presença dos filhos.

O tom de voz e o vocabulário escolhido para se comunicar devem compor um diálogo harmonioso. E mesmo que o desejo de divórcio seja um próximo passo implícito, postergar dentro destas condições só se tornará possível se for a vontade de ambos. Por isso, nenhum dos integrantes do casal pode possuir falsas expectativas de reconquista ou de que o plano pode ser mudado no meio do caminho supondo previamente que tudo voltará ao normal.

Além disso, os momentos em família devem acontecer naturalmente, preservando a dinâmica e funcionamento entre ambos que deverá perpetuar mesmo após a separação, considerando que a estrutura familiar ainda estará preservada, apenas mudará sua organização.

Durante o processo de divórcio

Quando a decisão é de fato tomada e se inicia o processo de divórcio, é muito importante que os filhos participem desta decisão podendo esclarecer dúvidas. É comum que dúvidas e fantasias estejam presentes na mente das crianças e adolescentes, e este é exatamente o momento para esclarecer todas elas, zelando para que em seu interior, a referência de estrutura familiar continue preservada.

Quais conflitos costumam ser mais presentes nos pensamentos das crianças e adolescentes?

Mais frequente em crianças de pouca idade (inferior a 10 anos), mas não excludente em adolescentes, é muito comum que o filho vivencie intenso sentimento de culpa deduzindo que algum de seus comportamentos (podendo ser considerados negativos) tenham motivado tamanha decepção resultante na separação dos pais. Sempre que esta questão aparece, é importante falar sobre, reforçando o fato da decisão ser tomada por eles como casal, e não como pais, não possuindo nenhuma relação com alguma característica ou comportamento que deixou a desejar.

• Fantasias de abandono: em todas as idades fantasias de abandono costumam ser vividas principalmente direcionadas ao cônjuge que deixará o lar. Fantasiam que aquele que deixa o lar está insatisfeito com o desempenho de seus filhos ou, então, buscará outra família que poderá proporcionar filhos que o farão mais feliz. Deixe objetivamente claro que a decisão não foi tomada por nenhuma razão que remeta a satisfação que possui com os filhos, explique que não existe a possibilidade de abandono e que este é apenas um momento de reestruturação e reorganização. Serão combinados horários, visitas e que o filho sempre terá acesso ao cônjuge que sair de casa, enfatizando que o vínculo estará totalmente preservado mesmo que não residam mais na mesma casa.
• Fantasias sobre terem tido oportunidades de fazer algo diferente para impedir: quando é expressa a sensação de culpa por acreditar que poderiam ter feito algo diferente que pudesse impedir o divórcio, esclareça que a opção de divórcio não deve ser entendida como um problema e não tem nenhuma relação com o amor e vínculo que possuem como família. Nada do que poderia ter sido feito impediria.
• Temores sobre a capacidade do cônjuge deixar o núcleo familiar: por conhecer a rotina doméstica da família, podem existir fantasias e questionamentos sobre a capacidade do cônjuge de deixar o núcleo familiar, como por exemplo: se sabe cozinhar, se sabe lavar roupa, se conseguirá dormir, entre outras. O cônjuge em questão deve transmitir tranquilidade sobre as medidas que adotará no novo espaço.
• Novo espaço: é comum o temor de que no novo espaço do cônjuge que sair, o filho tema não encontrar um lugar para ele, sentindo-se esquecido, excluído ou desamparado. A participação na escolha do local ou na decoração do ambiente, favorecem a aceitação e fortalecimento da segurança diante das mudanças.

Psicoterapia

Se mesmo com estas dicas e reflexões sobre comunicação e postura você continua enfrentando conflitos e temores para prosseguir com a decisão de divórcio, temendo as consequências que as mudanças poderão ocasionar em seus filhos, ressaltamos que os pais podem e devem buscar um psicólogo para receber maiores informações e orientações ou, então, buscar a psicoterapia de casal que poderá auxiliar na redução de conflitos e mágoas favorecendo a comunicação clara para tomada de decisões.

Percebendo dificuldades e conflitos antes, durante ou depois do processo de divórcio, crianças e adolescentes também poderão se beneficiar do acompanhamento psicológico favorecendo a comunicação e resolução de conflitos que permitirá a percepção de entendimento da nova estrutura familiar como algo natural que não oferece ameaças.

Maitê Hammoud
Psicóloga Clínica
CRP 06/112988
www.maitehammoud.com.br

Imagem de mohamed Hassan por Pixabay

Maitê Hammoud

Psicóloga Clínica, Formada pela Faculdades Metropolitanas Unidas, com curso de aperfeiçoamento em Psicanálise pelo Instituto Sedes Sapientiae. Atendimento de adolescentes, adultos e terceira idade. Vivência clínica com violência doméstica, transtorno de personalidade borderline, transtorno de estresse pós-traumático, psicossomática, processo e elaboração de luto, depressão, ansiedade, relacionamentos interpessoais, drogas, entre outros.

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Maitê Hammoud
Tags: divórcio

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