Eloise, que nasceu em Bedford, na Inglaterra, passou parte da vida escondendo suas “peculiaridades” até ser diagnosticada, aos 27 anos, com o Transtorno do Espectro Autista (TEA), o nome oficial do autismo. Eloise hoje é doutoranda na área de psiquiatria na Universidade Oxford e tem como principal objetivo de vida fazer estudos que possam ajudar pessoas com autismo a levar uma vida próspera.
Confira abaixo,partes do depoimento de Eloise à BBC NEWS.
“Percebi que eu era diferente quando comecei a ir ao colégio. Falava de coisas que me interessavam, mas isso não parecia interessar aos outros. Por exemplo, eu gostava de psicologia, mas as outras garotas preferiam falar sobre meninos.
Eu tinha interesses muito distintos e sempre me sentia mais confortável falando com adultos do que com pessoas da minha idade. Não sabia como me tornar a melhor amiga de alguém, nem como jogar os mesmos jogos que as crianças da minha idade jogavam.
Sofri muito bullying. Certa vez, alguém cuspiu em mim, as outras crianças me olharam com nojo e eu disse: ‘você está violando a lei criminal’, ou algo assim. Não é esperado que uma criança reaja assim a uma situação dessas.
Minhas estratégias começaram na escola primária: queria encarar. Muitas pessoas com autismo são hipersensíveis a experiências sensoriais. Por exemplo, [algumas] não gostam de usar meias porque sentem que seus tornozelos estão apertados ou não gostam de luzes brilhantes ou barulhos altos.
Minha adolescência foi insuportável, porque você não quer se sentir diferente dos outros nesse período. Há uma pressão muito maior para que as meninas se tornem parte de um grupo social.
Se um menino está sozinho, ele é considerado independente. Mas se uma menina está sozinha, dizem que ela tem algum problema.
Me adaptei para tentar me encaixar. Aprendi desde a mais tenra idade que é esperado que as pessoas façam contato visual. Mas eu li que, na verdade, as pessoas não mantêm contato visual constante e isso foi uma espécie de epifania para mim.
Então, comecei a desviar o olhar por dois segundos a cada quatro frases durante uma conversa. Aprendi também que se alguém fizer uma piada, engraçada ou não, as pessoas costumam rir.
Para mim, socializar era um pouco como estar no meio da multidão e, de repente, esquecer como andar. Todos ao seu redor socializavam normalmente. Mas eu precisava pensar em cada aspecto de como montar essa sequência motora para me manter erguida. Muitas vezes, assim se sente uma pessoa com autismo tentando se encaixar.
É preciso energia, raciocínio e, embora possa parecer que você está andando como todos, é preciso muito mais esforço para parecer normal. Às vezes, eu chegava em casa e desmaiava porque estava cansada por ter tido muito contato visual.
O autismo geralmente é diagnosticado na infância. Porém, um número crescente de adultos tem recebido esse diagnóstico.
Muitos deles desenvolveram estratégias para esconder sintomas quando estavam entre pessoas neurotípicas, ou seja, aquelas que não estão no espectro. Essa prática pode causar bastante estresse a essas pessoas.
Pesquisadores da Universidade de Cardiff, do King’s College de Londres e da Universidade Bath, no Reino Unido, elaboraram uma lista de verificações de 31 pontos para ajudar os trabalhadores da área da saúde a determinar se uma pessoa está usando estratégias para camuflar possíveis características do autismo.
Na lista constam itens como:
— Prever, planejar e ensaiar conversas antes que elas aconteçam;
— Imitar frases, gestos, expressões faciais e tom de voz de outras pessoas, ou personagens de filmes, séries ou livros;
— Confiar em animais de estimação, crianças ou algum objeto interessante;
— Evitar o contato visual, mas dando a impressão de interesse olhando para a ponta do nariz ou de pé em ângulo reto com a pessoa com quem está falando;
— Fazer contato visual adequado, mesmo que não seja útil para a comunicação.
“No momento, os profissionais sabem muito pouco sobre as estratégias e o que procurar. A nova ferramenta, se considerada eficaz, pode ajudar os médicos a avaliar o autismo em adultos e a entender o quanto esse paciente pode estar trabalhando para manter as aparências”, diz Lucy Livingston, professora de psicologia da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, e diretora do estudo.
“Essa lista pode significar que as pessoas com autismo receberão um diagnóstico mais preciso e oportuno”, afirma a estudiosa.
Antes de ser diagnosticada, não entendia por que me sentia diferente. Eu estava sozinha. Assim como não entendia as pessoas neurotípicas e elas tampouco me compreendiam.
Muitos acreditam que pessoas com autismo não têm empatia, mas quando uma pessoa neurotípica fala com um autista, pode ser que realmente seja a pessoa neurotípica que mostre falta de empatia.
Quando recebi o diagnóstico, há três anos, tudo se encaixou e descobri que havia outras pessoas como eu. Não era mais a única. Se eu fosse diagnosticada quando era criança, tudo teria sido diferente: teria me entendido melhor e poderia ter tido uma identidade autista mais positiva, em vez de sentir que me faltava algo.
Estou aprendendo a ser autenticamente autista e autenticamente Eloise, mesmo que isso signifique, às vezes, me diferenciar dos outros. Com pessoas que não conheço, sinto que preciso me encaixar. Por exemplo, se eu estivesse em uma entrevista de trabalho, sentiria a necessidade de me camuflar. Mas com amigos, familiares e um círculo cada vez maior de pessoas, estou aprendendo a ser quem eu realmente sou. Isso é maravilhoso e muito libertador.
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Destaques Psicologias do Brasil, com informações de Época e BBC NEWS.
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