Parecem dias como água que vão passando ao relento e me deixam cada dia mais só.

Talvez desgrudar de sua imagem Presa em mim.  Porque desejar não se faz mais presente na forma nem no ruído e quando o corpo torto Pede um abrigo Não tenho outro consolo

Senão a estúpida ideia de lhe agradar.

Assim passam os nós, os dias e sua imagem não se torna esfumaçada como outras

 No fundo te irritas como qualquer ser humano normal. Se fazes de fato ou de fita

 Pouco sabe minha alma tão seca e ávida, mal sabem meus olhos avulsos permanecendo soltos e longínquos dos seus. Mudo a palavra, mudo o rumo da minha estrada

Para estar com você. Quem sabe desta vez apenas pagamos  na memória o que antes foi.

Cansei das palavras faladas e repetidas. Me deixe dialogar. Me prenda em sua rede e me deixe solta leve, flutuar. Cansei.

Um dia ainda com memória saberei me dizer o que não me chateou Talvez uma página de mim que voava sobre a mesa  e você não soube ler.

Te culparei e não te invejarei enquanto viva. Tuas manhas e teus traços de horror escritos na parede ilusória que há poucos momentos nos separava e jamais serviu para unir nada.

Queixas. Tolices. Avant jour. Reclamações de que/ Se a alma solta e sem culpas acha seus caminhos ao andar do vento,/ Ao sabor das ruas.

E quando o estômago aperta e diz ai que fome, já a alma escolheu outro alimento…

Falar com todos já cansou. te ver é sempre excitante. Reflito e vejo no ar um tanto de saliva e dor. Jamais o esqueci. Nem das marcas, dos ódios, dos dessabores da paixão.

Mesmo com sono, tempo e fome, me sinto leve.

Quero ser leve. Quero apenas viver em imensa liberdade, já que a vida tem prazer.

A vida tem prazer ……

Já quieta, calada e sexy, caminho para a rua e de novo seu vulto desaparece com os passos

E te mato, neste instante, te matei de novo. Não esqueço de estar atenta,  séria e não me acostumei com tua morte súbita. Caminho com as pernas bambas Talvez coisa de quem. Quer cair. Ouço nitidamente sua voz no escuro. Era uma voz meio grave, um tanto rouca que me dizia palavras nulas. Ouço você com a precisão de quem desmaia. A embriaguês voluptuosa de sua voz me caia no colo e me agitava o olhar.

Era sempre o desejo Era sempre o sempre eterno momento De nos termos, nos devorarmos, até dormirmos calados e felizes.

Lugar comum, leitor? Onde você estava  aquela hora que não me sabia?

Contanto o êxtase Ahh O êxtase sempre foi meu. Aquele prazer estonteante De quem não teme?

De quem se esquece. Se dá Tem prazer em prazer. Depois de prazer e prazer E muito prazer E mais prazer. Não nos cansávamos. Falávamos por aquele único canal.

Sensório, calado, Com a respiração presa e solta gozamos unicamente maravilhosamente calados. Com erros de sintaxe. Com erros de língua. E sua língua era nativa.

Por pouco eu só sabia ler a língua do silêncio. Por que meu deus,  ainda a palavra proibida dos puritanos cowboys plenos de ira. Por desdenhar a pobreza nobre De quem goza de graça. Sem ritmo, sem cor. Na eternidade de nossos corações dormíamos abraçados. Às vezes não. Mas foi sempre o sono dos saciados. Saberia dizer o sabor de suas danças?

Saberia ainda lhe abraçar com tanto desejo?

Não. O tempo se foi. cruel e seco na toalha estirada sobre a cama. Não quero me secar.

Sua lembrança É meu encanto. Eu sei que é densa, Que ainda reclama.

Porém, impetuosa e louca me agarro a ela. E gosto. Nunca mais.. O tempo foi passando. Eu aprendi a calar-me nas noites eE a sentir o pavor do meu corpo flutuante na atmosfera.

Um verdadeiro pavor. Não conseguia mais dormir sem prazer e cada dia pedia a Deus. e deus não me ouviu.

Viu em que me transformei  em voz seca, rio sem curva água sem. Por que me des-pencou  do céu dos dançarinos. Porque simplesmente e portanto me arrancou  do paraíso. E era paraíso sim Fosse o preço que custasse. Fosse a honra, fosse o grito. Era meu paraíso que de aflita não concebo De doída não adoeço Porém não temo. O dia, o sol, a brisa, tudo  em que me vejo mulher. Tudo é quase um mero advérbio uma palavra neutra. O querer dos olhos abertos e sem. Qual é este querer?

E quando eu lhe faltei? Quando pode saber que minha respiração minguava quando tu- você, qualquer pronome. Soube que eu vivi. E você,  Quando? . Detesto este movimento. Qual? O seguido ao seu. Me trai, me consome e toda vez que bebo, é você que está bebendo. E toda vez que rio. E toda vez que falo. O comando é seu. É você que bebe da minha boca É você que fala de minha garganta. É seu  meu olhar morto. É sua, minha figura magra. É seu o que me imagino.

Fernanda Villas Boas

Fernanda Luiza Kruse Villas Bôas nasceu em Recife, Pernambuco, no Brasil. Aos cinco anos veio morar no Rio de Janeiro com sua família, partindo para Washington D.C com a família por quatro anos durante sua adolescência. Lá terminou o ensino médio e cursou um ano na Georgetown University. Fernanda tem uma rica vida acadêmica. Professora de Inglês, Português e Literaturas, pela UFRJ, Mestre em Literatura King´s College, University of London. É Mestre em Comunicação pela UFRJ e Psicóloga pela Faculdade de Psicologia na Universidade Santa Úrsula, com especialidade. Em Carl Gustav Jung em 1998. É escritora e psicóloga junguiana e com esta escolha tornou-se uma amante profunda da arte literária e da alma, psique humana. Fernanda Villas Bôas tem vários livros publicados, tais como: No Limiar da Liberdade; Luz Própria; Análise Poética do Discurso de Orfeu; Agora eu era o Herói – Estudo dos Arquétipos junguianos no discurso simbólico de Chico Buarque e A Fração Inatingivel; é um fantasma de sua própria pessoa, buscando sempre suprir o desejo de ser presente diante do sofrimento humano e às almas que a procuram. A literatura e a psicologia analítica, caminham juntas. Preenchendo os espaços abertos da ficção, Fernanda faz o caminho da mente universal e daí reconstrói o caminho de volta, servindo e desenvolvendo à sociedade o reflexo de suas próprias projeções.

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