Por Daniel Mediavilla
Nós, seres humanos, sentimos uma intensa atração pelo que nos faz mal. Adoramos as bebidas açucaradas, as comidas gordurosas e passar as férias em casal. Também desejamos ser jovens eternamente, apesar de que, como uma grande quantidade de estudos mostrou, somos mais felizes quando nos aproximamos da velhice. Pesquisas em dezenas de países indicam um padrão bastante generalizado. A maior parte das pessoas dá uma pontuação elevada quando se pergunta a elas sobre sua satisfação com a vida durante os primeiros anos da casa dos 20. Depois, essa satisfação cai, com a menor pontuação ao redor dos 50. A partir daí, a felicidade cresce progressivamente, até mesmo na faixa dos 90.
Na semana passada foram publicados os resultados de um trabalho norte-americano sobre idade e bem-estar psicológico que confirma, com algumas nuances, essa ideia. O estudo, baseado na resposta de 1.546 pessoas dos Estados Unidos e publicado na revista Journal of Clinical Psychiatry por pesquisadores da Universidade da Califórnia, de San Diego, mostra uma tendência a se sentir melhor consigo mesmo e com a vida “ano após ano e década após década”. Além disso, constatou-se o paradoxo de que, apesar da deterioração física e cognitiva, a saúde mental das pessoas idosas era melhor que a das mais jovens. Em contrapartida, os autores viram que os jovens na casa dos vinte e dos trinta anos tinham elevados níveis de estresse e mais sintomas de depressão e ansiedade. A diferença incorporada nesse artigo em relação a anteriores que exploraram as relações entre a idade e o bem-estar psicológico é que, em lugar da habitual forma de U, a progressão do bem-estar é linear dos 20 aos 90 anos.
Os cientistas continuam acumulando provas que indicam que os anos, apesar de nos tornarem mais feios e menos ágeis, nos deixarão mais felizes, mas ainda não se depararam com uma explicação completamente satisfatória que explique a tendência. Uma das possibilidades, apontam os autores, é que exista uma reserva emocional que ajude a contrabalançar a deterioração física, do mesmo modo que alguns sistemas cognitivos passivos equilibram a perda de algumas capacidades. Recentemente foi publicado um estudo que mostrava como o cérebro se reorganiza para compensar a perda de capacidade auditiva.
Outro mecanismo apontado pelos responsáveis do estudo é que com os anos se ganha habilidade na gestão das emoções e na gestão de decisões sociais complexas. Alguns estudos descobriram que com a passagem do tempo as pessoas experimentam menos emoções negativas e mostram um viés cada vez maior para memórias positivas.
Todos esses recursos, além da aprendizagem vital, podem estar relacionados com mudanças físicas produzidas pelo envelhecimento. Segundo explica o pesquisador Dilip Jeste, autor principal do trabalho, foi observado que “a amídala, a parte do cérebro associada com a percepção emocional, se torna menos sensível às situações estressantes ou negativas”. Além disso, “os níveis de dopamina no circuito de recompensa do cérebro decaem com a idade”, acrescenta. Ambas as mudanças facilitam o controle das emoções e geram uma maior sensação de bem-estar.
Estas mudanças biológicas, que mostram que muitas vezes os impulsos inscritos em nossos genes pela evolução não têm por que serem o melhor para nossos interesses pessoais, foram observadas em nossos parentes animais mais próximos. Um estudo com 500 chimpanzés e orangotangos também revelava indícios de uma crise da meia idade por volta dos 30 anos. Neste caso, porém, à subjetividade dos participantes que completam as pesquisas nas quais se avalia a própria felicidade se acrescentava que não foram os próprios primatas que julgaram seu nível de bem-estar, mas seus cuidadores.
Os autores do artigo reconhecem que será necessário muito trabalho para explicar esse fenômeno aparentemente contraditório. Esse conhecimento, além de pintar um futuro promissor para todos, ajudará a orientar melhor os tratamentos de saúde mental e adaptá-los às necessidades reais de cada idade.
TEXTO ORIGINAL DE EL PAÍS
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