Não é preciso muita coisa, basta um assunto um pouco mais polêmico e a histeria coletiva se instaura. Insultos, xingamentos, farpas são trocados em algo que deveria ser um diálogo, a troca de ideias, de argumentações, de vivências, acerca de alguma coisa.
E nesse processo de ruptura cognitiva e comunicativa, há a formação das bolhas. Isoladas, sozinhas, e extremamente sensíveis ao toque do outro, acima de tudo, se este outro pensa diferente.
Contemporaneamente, com o desenvolvimento das tecnologias da informação e, consequentemente, o aperfeiçoamento da internet e suas redes sociais, cada indivíduo, isoladamente, passou a adquirir um porta-voz, um espaço em que pode dizer tudo que pensa sobre qualquer coisa. É como se existissem especialistas para tudo, embora o mundo ande mais sem respostas do que nunca.
Evidentemente, a possibilidade de possuir um espaço autonomamente para discorrer sobre o que se pensa é algo extremamente maravilhoso para a comunicação. No entanto, para que esta ocorra, faz-se necessário a presença de um interlocutor. Ou seja, para todo aquele que fala, é preciso que exista alguém que escute. Sem esse processo não há o estabelecimento de um canal comunicativo, e sim, de um espelho que apenas reflete o que eu mesmo falo.
Do mesmo modo que acreditar que a comunicação se baseia somente em aceitações, likes e corações é ingenuidade ou falta de entendimento de como funciona verdadeiramente uma rede social.
Nesse sistema, têm-se pessoas sedentas por falar, mas jamais desejosas por ouvir, implicando, por conseguinte, a dificuldade da comunicação, embora, paradoxalmente, se viva em um mundo cercado de cabos e fios. Esse problema do ouvir já era anunciado por Rubem Alves, que certa feita disse:
“Sempre vejo anunciando cursos de oratória. Nunca vi curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir.”
Desse modo, toda vez que alguém discorda de um argumento dado, ao invés de haver uma análise racional acerca do que foi dito e, por conseguinte, a construção de um contra-argumento, buscando enxergar a problemática em um panorama mais amplo; ocorre o lançamento de palavras que destroem a possibilidade da formação de um diálogo e, consequentemente, um debate no plano das ideias, de forma racional, humana e respeitosa.
Há, assim, o fortalecimento das bolhas e da perda da função da linguagem, que é reduzida constantemente a um patamar de animalidade. Os sujeitos fechados em si mesmos, não conseguem enxergar o que os cerca, vivendo como ilhas afetivas, isoladas de todo e qualquer pensamento estranho. Vivendo como “medianeiras”, paredes sem janela, vida sem abertura para o novo.
“As pessoas, as cidades, o mundo está cheio de gente fechada, não só pela arquitetura, mas pessoas fechadas em si, em sua solidão, em seu mundo. Pessoas que foram “construídas” como medianeiras, paredes sem janela, vida sem abertura para o novo.”
Contudo, sendo a comunicação de vital importância para o desenvolvimento humano do indivíduo, o que podemos esperar de uma sociedade que vai na contramão da comunicabilidade?
Talvez a resposta esteja no crescimento das intolerâncias, dos preconceitos, dos extremismos, dos fundamentalismos, demonstrando mais uma vez a paradoxalidade dos nossos tempos, bem como, a urgente necessidade de revisitar o nosso ser, buscando compreender que existimos enquanto seres sociais e, portanto, precisamos estar abertos ao novo, já que janelas fechadas tornam o ambiente completamente sufocante e irrespirável. O que só pode levar a autodestruição, porque sem ar puro, nem mesmo as bolhas conseguem se manter cheias.
Imagem de capa: Melvin Sokolsky- fotógrafo americano
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