Tais como árvores há pessoas fincadas no campo da firmeza, adubadas no solo do ânimo e munidas pela força da bravura. São audaciosas e destemidas por natureza. A coragem delas, às vezes, assusta os mais temerosos. Ainda que os ventos sejam contrários, não se deixam extirpar, pois estão enraizadas no terreno de seus sonhos.
Afinal, os sonhos e somente eles são a realidade mais profunda que lhes pertence. Eles falam das potencialidades trazidas desde a semente. Sonhos norteiam e apontam para as raízes. Sonhos concedem sentido e indicam em que direção se crescerá. Sonhos garantem a constância necessária para que o fundamental não se perca ao longo do desenvolvimento de suas próprias relações.
Essas pessoas semeiam esperança onde outrora habitava a desesperança. Lançam-se no plantio, mesmo sem qualquer resultado à vista de uma colheita farta. Ainda que o sol do sofrimento lhes resseque a alma, elas se mantêm fiéis a si mesmas e àqueles que lhes são mais próximos. Podem até verter um pouco da direitura proposta. Mas, passada a chuva das dificuldades, voltam a encontrar forças donde menos se esperava.
Não! Elas não possuem soluções imediatistas para os conflitos relacionais, uma vez que sabem aguardar o ciclo do tempo. São habilidosas no ofício da paciência. Compreendem que, uma hora ou outra, a primavera será suplantada pelo verão e o outono ultrapassado pelo inverno. Enfim, vivem porque se conservam psiquicamente emancipadas pela solidez do amor-próprio.
Em tempos líquidos, nos quais as relações afetivas, conjugais e familiares têm sido feitas para não durar, tem ficado cada vez mais difícil achar terrenos permanentes, quanto dirá pessoas de vínculos duradouros. Se você as encontrar, por favor, mantenha-se próximo delas. Pode ter a confiança de que ali haverá um repouso seguro para muitas tempestades.
Por outro lado, existem pessoas que passam pela existência, mais comprometidas consigo mesmas do que com os demais. Até aí tudo bem. Há de se ter uma boa dose de estima para avançar em uma sociedade tão vacilante que, ao modo dos nômades, desloca-se constantemente, sem territórios, sem fronteiras, sem raízes.
Logo, para evitar a repetição de tantos sofrimentos, é possível que alguns decidam não se comprometer com ninguém, exceto com eles próprios. É um direito de cada um e ponto. Todavia, daí pode resultar um doloroso processo psíquico, no qual se fica à mercê dos ventos, tal qual errante, caminhando a ermo, despovoado, solitário e desenraizado.
Em um sentido mais amplo, empenhados com o efêmero narcisista que cá habita, existe a possibilidade de nos tornarmos foragidos de nós e evasivos dos outros, tolhendo os embates de nosso eu mais profundo.
Por conseguinte, maldispostos e isolados, negamos toda possibilidade de estabelecer laços afetivos duradouros. Disso provêm os mais variados relacionamentos mantidos pela precariedade de seus vínculos. São precários porque foram transformados em coisas, sendo coisificados também estão submetidos à utilidade momentânea e, em seguida, ao descarte permanente. Doravante, relações precárias nos desresponsabilizam, nos tornam negligentes com vidas alheias, nos fazem precipitados nas decisões, nos colocam no lugar de levianos em questões sérias, nos dão o passaporte de aventureiros, cujo percurso final é a sentença de irresponsáveis.
Alguns dizem que nos humanizamos na experiência do encontro entre um EU e um TU. Desse encontro parece brotar o compromisso entre um líder e um liderado, entre mãe e filho, entre os cônjuges, os irmãos e os amigos. Ainda assim, não deixa de ser um arriscado salto no escuro, apto a provocar afetos e desafetos. Quem decide ficar no berço do descompromisso está protegido dos perigos e danos, das quebras e vergonhas consequentes ao existir. Aquele que decide se comprometer para além de si é porque está se responsabilizando pelas feridas e conquistas de suas andanças.
Imagem de capa: Shutterstock/Twinsterphoto
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