Na exigência que impomos a nós mesmos, nunca nada é suficientemente glorioso, visível ou importante. Desvalorizamos as pequenas conquistas, que são passos gigantes para afirmar o nosso valor único e a nossa capacidade de ver para além do momento presente, para além das crises que enfrentamos. Desvalorizamos pequenos momentos que nos devolvem a capacidade de acreditar na vida, de acreditar na nossa força infinita para fazer a mudança.

Ao desvalorizarmos o que já temos, por pouco que isso nos possa parecer, tudo se torna irrelevante. Começamos a achar que apenas somos felizes se tivermos mais ou se as coisas forem diferentes. Achamos que, para estarmos gratos, algo de extraordinário tem de acontecer. Um aumento de salário, um carro novo, uma cura milagrosa das nossas dores emocionais, uma saúde de ferro, férias paradisíacas.

Enquanto nos sentirmos incompletos, enquanto sentirmos que ainda não é suficiente, afastamos a gratidão e com ela a capacidade inata de valorizar algo tão simples como o fato de estarmos agora, aqui, respirando. Nem sequer estamos falando em presentes, objetos que se recebem e que acabamos por agradecer de forma quase intuitiva. É mais do que isso!

O que sabe a ciência
A gratidão é inata ao ser humano, embora apenas em 2001 a psicologia positiva lhe tenha começado a dirigir maior atenção em termos de estudo. Concluiu-se, nomeadamente, a existência de uma relação positiva entre gratidão e bem-estar subjetivo, bem como entre a gratidão e a qualidade das nossas relações interpessoais. A gratidão influencia de modo positivo a vida, as relações e o bem-estar dos sujeitos que a sentem e a praticam.

É neste sentido que vão, também, os estudos do psicólogo Martin Seligman que concluiu existir uma relação direta entre a prática da gratidão e a felicidade que sentimos. É uma emoção positiva que amplia o sentimento de bem-estar emocional. Experienciada e praticada, transforma a nossa vida para melhor. Torna-nos mais criativos, mais resilientes, mais saudáveis, mais felizes e socialmente mais integrados, concluíram estudos conduzidos por Barbara Fredrickson, professora de psicologia.

Por que é difícil sentirmo-nos gratos?
Porque temos de aprender a ser gratos, mesmo quando as coisas não correm bem. Mesmo quando a vida não corresponde àquilo que esperávamos. Raramente nos ensinam o poder da gratidão, a olhar para as pequenas vitórias do dia a dia e para as coisas boas que já temos.  Uma simples ducha quente no fim de um dia extenuante. Um abraço dos nossos filhos. A lista é longa.

O sorriso de alguém que cruza conosco na rua. O nosso sofá, onde nos enroscamos numa tarde de chuva.  Os amigos que nos telefonam para saber como estamos. O nosso carro, que pega de manhã. Temos tanto para agradecer às pequenas coisas que já temos e que damos como adquiridas, que já não lhes prestamos atenção.

A gratidão não depende do estatuto social, do valor do nosso salário, do cargo que ocupamos, de termos ou não um curso superior. A gratidão não depende das marcas que usamos, dos lugares onde passamos férias ou do nosso carro. É um sentimento que temos (ou não temos), independentemente das nossas condições materiais, sociais ou educacionais.  A gratidão cura as nossas emoções e, através da cura emocional, curamos a nossa vida.

Quanto mais gratidão sentimos, mais a nossa vida melhora. Trata-se de uma mudança de percepção face ao que já temos. Ao elevarmos o nosso nível de gratidão, aumentamos as emoções positivas que sentimos e começamos a focar-nos nos pontos positivos em detrimento dos aspectos negativos. Desta forma, praticar a gratidão significa passarmos a ter ainda mais coisas pelas quais nos sentimos gratos.

O que você nunca pensou agradecer, mas devia:

– Relações falhadas
Cada relação que termina é uma oportunidade única para praticar o perdão e para conhecer novas pessoas que façam realmente sentido na sua vida.

– O ter-se desapegado
De pessoas e profissões aniquilantes que já não contribuíam para a sua felicidade. Se agora tem pouco, vai ter mais. Se já tem muito, vai ter mais. A gratidão é uma emoção win-win.

– Ler este artigo
Ter tempo para isso. Mais, lendo, sem ser em braille. Talvez esteja em casa, no cabeleireiro, na sala de espera de um consultório. Agradeça. Está lendo sem dificuldades.

– Sentir o vazio de amor, de tempo, de amizade, de sentido de vida
Agradeça a oportunidade que o vazio lhe oferece. Se sentir que tem pouco, agradeça o pouco. Significa que tem um campo imenso à sua frente, para produzir mais, para amar mais, para voltar a apaixonar-se. Tem espaço vazio para tudo isso.

– Erros e medos
Reconheça-lhes valor pois existiram para o fortalecer. Precisou deles para ultrapassar obstáculos em determinada altura da sua vida.

Como exercitar a gratidão passo a passo

1. Autodiagnóstico
Faça um barômetro do seu nível de gratidão. Numa escala de 1 a 20, qual considera ser o seu nível de gratidão atual? Pense, individualmente, quão grato se sente nos seguintes pontos:

– Amor/relacionamentos
– Família
– Profissão
– Saúde
– Finanças

2. Autoanálise
Tente perceber por que está se sentindo pouco grato nas áreas a que atribuiu valores mais baixos.

3. Plano de ação
Identifique estratégias e ações que possam aumentar o seu nível de gratidão atual para cada um dos setores da sua vida. Tente que o seu plano dependa essencialmente de si e daquilo que pode fazer e não dos outros ou das circunstâncias externas.

4. Partilhe a sua gratidão
Partilhe amor, esperança e alegria, mesmo em tempos difíceis. Quando você partilha alegria em situações complicadas, tudo à sua volta se transforma. A situação difícil passa a ser vista de forma mais positiva e o outro passa, também, a sentir-se grato.

5. Mude a sua linguagem
Anule expressões como “Tive a infelicidade de ficar desempregado”, “Nada me corre bem”, “Sou fraco”, “Não consigo”, “Quando as coisas correm bem, até duvido”, “Tenho um salário muito baixo”, “Ninguém me entende”, “Está tudo tão caro” e/ou “O amor foge-me”. Estas frases anulam, por completo, a sua capacidade inata para se sentir grato. E isso faz com que a sua vida fique parada no ressentimento, no queixume e na vitimização.

Texto: Teresa Marta (coach para a coragem e CEO da Academia  da Coragem)

TEXTO ORIGINAL DE SAPO LIFESTYLE

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