Os vídeo-games são uma alternativa de entretenimento desde a década de 70. Com narrativas dos mais variados temas, o jogador imergia em uma realidade pré-construída e executava o passo a passo da história até suafinalização. Nesta era, o jogador ficava restrito à uma história imutável, com um mapa em duas dimensões, no qual era possível somente a esquerda ou a direita da tela.
Entre a primeira e a quarta geração de consoles de vídeo-game, o domínio de exploração do mapa era algo engessado, e apenas na geração seguinte, com o advento do 3D, foi possível dar profundidade ao campo de visão da tela. Nas últimas décadas, essa revolução geométrica aproximou cada vez mais os jogos digitais da realidade, que, junto com processadores mais potentes, permitem construir mapas com áreas de 136 km², a exemplo do The Witcher3.
Esta área é maior que a cidade de Niterói, no Rio de Janeiro, que tem uma extensão de 133 km². Acompanhando o tamanho da área a ser explorada, os jogos atuais oferecem o livre arbítrio e inúmeras possibilidades de escolha em seu enredo, que esbarram em conflitos éticos, morais e de desejo. Tais decisões influenciarão o andamento da história, tornando-amais fácil ou mais difícil, com arautos impiedosos ou benevolentes.
Além deste gênero de ação histórica, outros títulos conhecidos desafiam a criatividade e a organização do jogador. Minecraft, SimCityou Simutransdemandam escolhas gerenciais, que determinam o seu desempenho, mas não nos ocuparemos destes, por enquanto. Frente à complexidade dessas narrativas, olhares curiosos e críticos voltaram-se para o mundo virtual, principalmente para títulos que envolvem ação real, com personagens humanos e armas mortais existentes.
Com facilidade, somos levados a crer que o comportamento do sujeito, fora da realidade alternativa, é determinado pelas decisões que ele toma nesta realidade. No entanto, é preciso um grau de abstração maior em relação a esta outra realidade, que, segundo nosso questionamento, aproximaria a decisão agressiva aos processos de criação, se tornando, assim como o thriller criminal dos livros, um moderno destino para as pulsões sexuais.
Antes de explicarmos como o processo de criação é possível dentro de um jogo, façamos uma introdução à sublimação em Freud, que definiu-a como um processo quediz respeito aos destinos possíveis da pulsão. Por pulsão, entende-se um impulso, que é sexual a nível psíquico e não fisiológico. A sublimação é o que eclode como a via valorizada de uma pulsão há muito anulada/suprimida com o processo civilizatório.
Sendo assim, a produção intelectual, de escrita, pintura e até mesmo o trabalho, protagonizam “a intenção de tornar-se independente do mundo exterior, buscando suas satisfações em processos internos, psíquicos, […]. Nele o vínculo com a realidade é ainda mais frouxo, a satisfação é obtida de ilusões que a pessoa reconhece como tais, sem que a discrepância entre elas e a realidade lhe perturbe a fruição” (1930, p. 39).
Um silogismo dá conta de nosso questionamento ao equiparar o conteúdo de um thriller criminal, onde pode haver um protagonista em primeira pessoa volátil e assassino, ao personagem de um jogo com as mesmas características. Diferente de um livro, no entanto, o jogador não somente consome a história, como também a cria, da forma que quiser, a partir das decisões que toma.
Nos atuais jogos, o player é, também, o escritor de sua história, dando ao jogo o status de uma nova substituição do objetivo sexual por um mais valorizado; uma realidade alternativa em que se admite, sobretudo, aquilo que a civilização deu conta de eliminar.Outro importante pontopara nosso questionamento é o teor dessas decisões.
A criança que optar por uma trajetória virtual fora da leié motivo de preocupação? Bem, como foi supracitado com Freud, a sublimação pode ser reconhecida enquanto a discrepância entre a realidade e a fantasia não perturbar a fruição do sujeito. Logo, quando este limiar se rompe, é precisoficar atento para que o entretenimento não atrapalhe os hábitos cotidianos. Decerto a relação entreos jogos digitais e a sublimação precisa ser estudado profundamente. Se trata de um assunto virgem no que diz respeito ao tema da sublimação.
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