Por: Laila Wahab
Advogada e psicóloga especialista em
Psicologias cognitivas
Nosso corpo está conectado com nossas mentes de forma muito mais integrada do que podemos supor. As diversas teorias não dão conta de definir os limites, onde acaba um e começa o outro, em termos de influência. Somente a partir da metade do penúltimo século neurocientistas, pesquisam e estudam mais ferrenhamente, para desvendarem os muitos aspectos que envolvem o cérebro humano, capaz de responder a muitos questionamentos que fazemos com o objetivo de garantir a existência de seres humanos conscientes de si mesmos e mais plenamente funcionais.
Muito temos escrito acerca dos sintomas psiquiátricos gerados por doenças orgânicas, mas o que dizer sobre a influência da nossa mente sobre nossa saúde física? Em tempos de pandemia, o excesso de preocupações aliado a ansiedade elevada têm aflorado vulnerabilidades que sequer conseguimos imaginar.
O corpo acaba pagando um preço as vezes alto, por tantas emoções que o afetam sobremaneira. A medicina psicossomática evidencia que não é possível entender o ser humano se não integrado em seus vários aspectos. Nos tempos atuais, ás muitas preocupações, dilemas e discordâncias crescentes, afetando diretamente os estados de humor contribuindo para o comprometimento dos transtornos mentais, com reflexo direto afetando na saúde do corpo.
Apesar de todos os estudos e avanços nas pesquisas das neurociências, tanto a psicologia quanto a psiquiatria concebem a ideia da existência de certas desordens mentais que parecem reivindicar a existência de um corpo, fato ocorrido na somatização.
A somatização pode ser entendida como um conjunto de sintomas físicos que produzem mal-estar e que não são explicáveis pelo médico só na consulta do corpo. Ou seja, são queixas de dor, sem que se possa encontrar uma causa.
Há dificuldade para explicar a origem da somatização, em atenção ao diagnóstico, e aos tratamentos; geralmente são atribuídos ao sistema nervoso somático, (a parte do sistema nervoso que leva informação sensorial e serve como canal para os impulsos elétricos que ativam a musculatura). A somatização é uma categoria de problemas físicos onde são inseridos os que não se sabe muito bem de onde vem. É tão ampla esta denominação, que dizer sobre sua origem, ligada ao funcionamento do sistema nervoso, pode causar mais problemas do que tentar localizar a causa em partes do corpo, tecido celular ou órgãos.
Em suma: esses sintomas não podem ser explicados satisfatoriamente por outro transtorno ou doença.
Nos primórdios do estudo da psiquiatria, a medicina entendia a somatização com o que a psicanálise conhece como histeria. Ainda hoje, alguns círculos acadêmicos insistem que as somatizações são resultados de problemas psicológicos que lutam para sair do inconsciente.
É estatístico que mulheres tem mais probabilidade de somatizarem que os homens. Existem correlações entre quem leva uma vida estressante. Logo, as somatizações tem um componente situacional, portanto, para compreende-las é necessário entender não só o indivíduo, mas a sua relação com o ambiente.
Mas, para que servem os sintoma ?
E
Para que serve a dor?
O sintoma pode ser uma sinalização de que algo não está bem, o sofrimento encontra formas de se manifestar. Todo sintoma tem a função de alertar e a somatização é dar nome para a dor. É passar para o soma (corpo), é a dor transpassada. O que está afligindo você? Seu relacionamento profissional? Seu casamento? Situação financeira ? Dificuldades cotidianas? Na somatização quando o paciente ouve do médico que é de fundo emocional é bem comum a descrença e a frustração, pois não se sente bem, mas ouve o médico lhe dizer, que não encontrou uma causa específica.
Mas, se a mente está relacionada com o adoecimento, será que podemos aplicar o poder da mente na cura das doenças?
Temos observado, na prática da clínica que estes sintomas podem ter na sua origem, pensamentos disfuncionais. Por exemplo: A paciente chega ao consultório se queixando de mal-estar generalizado. Os sintomas aparecem sem aviso prévio, segundo ela, os batimentos cardíacos aceleram absurdamente, parecendo um infarto, a cabeça girando, falta ar para respirar, desnorteada sem conseguir pensar com clareza sobre o que está acontecendo, ela só sabe que quer sair correndo à um pronto socorro; contudo no hospital, os médicos não encontram nada que pudesse justificar seu estado emocional.
As queixam versam em dores de cabeça e/ou enxaquecas, resfriados frequentes, asma, gastrite, dores generalizadas inclusive nas articulações, palpitacões, taquicardia, ganho ou perda significativas de peso, processos alérgicos cutâneos, são exemplos de somatizações, mas também problemas sexuais (dor durante a penetração, disfunção erétil, vaginismo). Sudorese, problemas intestinais, ou na digestão também podem ocorrer.
A ansiedade excessiva pode ser a grande vilã silenciosa, pois nem sempre o paciente se dá conta disso. Em atendimento clinico, já recebi pacientes relatando alterações emocionais, sem se darem conta da voz embargada, ofegante quando do relato. Quando perguntado sobre as preocupações, a percepção neste sentido é elevada. Sente-se incapaz de administrar questões mais complexas do dia a dia, sendo o mais frequente, dificuldades financeiras. O agravamento pode ser em decorrência de traumas causados por experiências anteriores de vida, ocasiões em que se sentiu acuado e sem recursos.
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), ser saudável é muito mais que não ser doente, ter saúde é usufruir de um bem-estar em todos estes aspectos: psíquico, biológico e social. Partindo desta premissa temos a somatização sendo uma ação sobre o corpo (soma = corpo), ou a representação física do desequilíbrio psíquico e biológico do indivíduo.
Mais uma conclusão que podemos chegar a este respeito dentre as representações psíquicas, é de que o adoecimento decorre destas experiências emocionais do indivíduo dentro de seu contexto social, sendo este, o pano de fundo no processo de somatização através de sintomas físicos, por isso, não explicáveis pelas ciências médicas e portanto consideradas sintomas de origem emocional.
Obviamente, que nem sempre que adoecermos teremos nossa mente como responsável. Todavia, em alguns casos identificaremos sim doenças emocionais como por exemplo labirintite emocional, febre emocional, etc. O único consenso a que chegam os estudiosos é de que toda pessoa angustiada, com o sistema nervoso abalado, excessivamente ansiosa, deprimida, poderá ter seu sistema imunológico fragilizado.
O sofrimento emocional faz com que nosso cérebro produza repetidamente o cortisol, o hormônio do estresse, esta repetição e intensidade na produção fragiliza o organismo e predispõe ao adoecimento. O inverso também pode ser verdadeiro, ou seja, a repercussão do adoecimento físico, pode ter conseqüências emocionais/psicológicas. Exemplo: o enfrentamento do câncer. O adoecimento provoca sofrimento mental além do sofrimento físico. Agora na atualidade em que precisamos nos manter recluídos, em razão do isolamento social, uma pessoa que não suporte ficar afastada dos demais, pode se deprimir, a depressão pode afetar seu sistema imunológico e ficar mais suscetível a outras doenças.
Nestes casos deve receber tratamento médico e psicológico. A psicoterapia pode ajudar a identificar as causas para estes sintomas e assim contribuir e muito para o reequilíbrio mental do paciente. Tudo o que está relacionado com o sistema nervoso deve ser precisa ser tratado tanto em aspectos psicológicos quanto comportamentais, uma eficaz opção para tratar das somatizações é a terapia cognitivo-comportamental.
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