De Liliane Prata

Ainda tem quem encare a terapia de casal como o último recurso de uma dupla infeliz às vésperas do divórcio. Não é. Cada vez mais, ela pode e tem sido usada para solucionar um conflito entre parceiros que anda emperrando a vida a dois. Aliás, de maneira geral, quanto antes se buscar auxílio, melhor.

“Senão, pode ser tarde demais”, avalia Ailton Amélio da Silva, professor de psicologia da Universidade de São Paulo (USP) e autor de Relacionamento Amoroso (Publifolha), entre outros livros do gênero.

“É comum o casal procurar um profissional só quando já há muito desgaste e mágoa na relação. Aí, fica difícil mesmo reverter o quadro”, admite. Ele e outros três especialistas, todos com larga experiência em atender cônjuges (e mesmo noivos e namorados que ainda não vivem juntos), ajudam a entender melhor do que se trata (ou não) o divã a dois e como aproveitar o tempo em frente ao terapeuta para levar o relacionamento adiante.

1. O objetivo é ficar junto, ou separado e feliz

Manter o casal unido e em harmonia é o objetivo maior. “Se a decisão de se separar já está tomada por ambos, não é necessário procurar um terapeuta, mas um advogado”, resume Flávio Gikovate, psicoterapeuta e autor de livros como Uma Nova Visão do Amor (MG Editores).

Caso apenas uma das partes queira o fim ou se ninguém está pensando em terminar, mas os conflitos estão perdurando ou trazendo angústia, então há questões a ser trabalhadas. Qualquer que tenha sido o motivo, se depois das sessões cada um resolveu ir para o seu lado, não significa que o processo deu errado.

“Se for para se divorciar, que a separação se dê de forma amena para o bem de cada um e dos filhos, se houver. A tendência é que os conflitos se agravem no momento da separação. Nisso, o profissional pode ajudar bastante”, diz Gikovate.

2. A vida amorosa não tem que ser um mar de rosas

“Em um relacionamento, vários elementos entram em jogo”, lembra Ailton Amélio. Da história de vida ao temperamento de cada um, passando pelo comportamento na cama. E da mesma forma que há uma variedade de temas envolvidos, há também possibilidades de desacordos. A questão não é evitá-los, mas ter capacidade de lidar com eles quando aparecem.

“Isso pode significar tanto solucioná-los como decidir que vale a pena conviver com eles”, diz o psicanalista Luiz Hanns, autor de A Equação do Casamento (Companhia das Letras).

3. Nem tudo se resolve com conversa

O diálogo pode ser curativo em muitos casos, mas não é a saída para tudo. “Às vezes, o conflito não tem solução, mesmo que os dois se gostem”, diz a psicanalista Mena Mota, de São Paulo. Isso em geral ocorre quando os projetos de vida são muito distintos – um quer filhos, o outro não, por exemplo.

“Entrar em acordo pressupõe abrir mão, o que faz parte de toda relação. Mas, quando as visões de mundo são muito diferentes, pode acontecer de um se anular para satisfazer o outro”, afirma. Essa estratégia, aprende-se (quase) sempre, costuma ter tempo limitado.

4. O processo às vezes é desgastante

Para Hanns, muitos têm mais resistência à terapia conjunta porque ela em geral surge em função de conflitos. “Na individual, cada um apresenta só sua versão dos fatos”, acrescenta. “Na de casal, sua visão pode ser contestada pelo outro, gerando confronto.”

Choro e até ofensas são reações comuns. E aí cabe ao profissional ajudar a organizar a conversa.

5. Não há juiz

O papel do terapeuta é o de mediador, não de fã de um dos parceiros nem tampouco de juiz da situação ou dono da verdade.

“Cabe ao bom profissional procurar entender aqueles indivíduos e o casal como um todo. Ele é como um hacker que tenta entrar no software de cada um para buscar um ponto de convergência entre ambos e fazer a costura”, pondera Gikovate.

6. Você não precisa contar tudo

Na terapia individual, todo conteúdo que o paciente apresentar é bem-vindo, inclusive devaneios que passam pela cabeça, fantasias, sonhos… Mas, quando a sessão é dividida, algumas questões podem ser mantidas do lado de fora – e até devem.

“É claro que tem de haver uma boa dose de entrega, mas não é preciso falar tudo”, avalia Hanns. “Certa vez, uma paciente disse que o ex era mais bem-dotado. O marido ficou magoado e não conseguiu superar isso. A vida sexual ficou prejudicada. São coisas que podem vir à nossa mente, mas que, se o outro souber, são capazes de fazer um estrago.”

Dê prioridade ao que vem provocando angústia e que, compartilhado com o outro, pode levar a uma nova etapa do relacionamento.

7. O problema pode ser pontual

A terapia também é útil (e muito) para resolver situações específicas, como dificuldades para chegar a um acordo sobre as finanças ou a educação dos filhos e até transtornos no relacionamento com os parentes, por exemplo.

“Já trabalhei de forma bem-sucedida vários tipos de questões mais focadas em três meses de terapia”, conta Mena.

8. Não basta ir, tem que participar

Como na terapia individual, é preciso sentir empatia pelo profissional e se envolver com o processo. “É muito comum que um dos parceiros não esteja disposto a se expor ou investir na relação, enquanto o outro está”, diz Hanns.

“Cabe ao terapeuta perceber isso e trabalhar a questão. Até porque, se a indisposição permanece, o trabalho fica inviável.” Em casos assim, é possível que se proponham algumas sessões individuais para entender o que está acontecendo. “Às vezes, preparo o paciente sozinho para que ele se expresse melhor em conjunto”, explica Mena.

9. O que acontece no consultório fica no consultório

Vocês dois são reservados e ficam desconfortáveis com a ideia de se expor? “Nem detalhes da profissão eu pergunto”, afirma Gikovate. E a privacidade é sempre respeitada. Mesmo o que se fala no divã individualmente, se houver sessões só com um dos parceiros, não é compartilhado na conversa a dois sem autorização.

Mais: os terapeutas não costumam debater os problemas dos pacientes na mesa de bar. “Se necessário, por motivos profissionais, falo com colegas sobre algum caso, mas omitindo nomes e detalhes para que os pacientes não sejam identificados”, diz Silva.

10. Se quiser, volte sempre

Os casais podem retomar as sessões depois de meses ou anos longe do consultório. “Tenho pacientes que são cíclicos”, diz Silva. “Outros resolvem a questão que os trouxe e não aparecem mais.”

O retorno pode se dar por um novo motivo ou pelo mesmo. Longe de sinal de fraqueza, indica maturidade – para resolver o que perturba a relação.

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