Por Alexandre A. Loch
Algumas linhas para entendermos em que pé estamos nas ciências da mente hoje em dia.
Por muito tempo a psiquiatria foi colocada na posição de uma ciência não médica. Antes do surgimento dela, por exemplo, as doenças mentais grosso modo recaíam em duas categorias. Ou eram fruto da má fé do indivíduo (depressão vira preguiça, transtorno obsessivo-compulsivo é chatice, e assim por diante), ou eram problemas espirituais (Joana D’Arc ouvia vozes e foi queimada por heresia).
Ao longo do tempo a psiquiatria foi criando espaço dentro da medicina e, com as neurociências, definitivamente fincou o pé como uma ciência médica. Não há fenômeno psíquico sem seu correlato cerebral, neuronal. E o ponto em que nos encontramos é este: o de saber como o ambiente muda o nosso cérebro.
A psicanálise que você faz no divã está mudando suas redes neurais. O exercício muda a neurotransmissão de serotonina. E assim por diante.
E a bola da vez é a meditação. Ou “mindfulness“, que é um tipo de intervenção psicológica baseada na meditação, e que acaba sendo usada nas pesquisas por ter um formato mais ou menos fechado e mensurável.
Intuitivamente sabe-se que meditação melhora o estado de espírito das pessoas. Por conseguinte, deveria melhorar também quadros depressivos. Mas fazia-se necessário que seu efeito fosse demonstrado cientificamente. E isso tem sido feito nos últimos 20 anos. Tanto que Alberto Chiesa e Alessandro Serretti, dois pesquisadores da Universidade de Bologna, reuniram um grande número de trabalhos científicos sobre mindfulness em uma revisão publicada alguns anos atrás.
Estudos em depressão avaliaram que a prática de mindfulness associada ao uso de antidepressivo é melhor do que apenas o uso da medicação na prevenção de recaídas. Quando não consegue prevenir as recaídas, a mindfulness as atrasa significativamente.
Em outro trabalho, pessoas que estavam apenas tomando medicação tiveram uma recaída da depressão em média 69 dias após melhora do quadro. Para aquelas que associaram mindfulness à medicação esse tempo foi muito maior, de 204 dias.
Em outra publicação, o que é mais surpreendente: mindfulness associada à retirada gradual da medicação tem resultado igual à manutenção do remédio. Ou seja, em casos já estabilizados há bastante tempo, a prática de mindfulness possibilitou que o antidepressivo fosse lenta e gradualmente retirado.
Com relação aos efeitos cognitivos pelos quais a mindfulness age, observou-se que ela diminui as ruminações depressivas. Algo que pode ser muito pernicioso para a pessoa com depressão são os pensamentos circulares, as ruminações; pensamentos negativos que não deixam a mente da pessoa.
A meditação reduz essas ruminações. Além disso, ela também diminui os pensamentos discrepantes, aqueles que fazem que você tenha uma imagem negativa e irreal sobre você mesmo, perpetuando dessa maneira o quadro depressivo.
E para realizar a ligação da qual falamos no começo do texto, entre ambiente e cérebro, estudos mais recentes observaram alterações causadas no cérebro pela prática da meditação. Um deles observou que, em pacientes com depressão, há um aumento da plasticidade em redes neurais relacionadas à doença em praticantes da meditação. Além disso, mindfulness aumenta a espessura de algumas camadas do córtex em regiões específicas, o que é sinal de saúde do cérebro.
Sim, hoje em dia é muito difícil parar até para pensar, o que diríamos de parar para meditar. As demandas do dia a dia são cada vez maiores, e a rapidez dá o tom de nossa música cotidiana.
A meditação vem na contramão de tudo isso. Mas é uma contramão necessária. Pois não adianta tomar remédio e ficar de braços cruzados esperando que o mesmo faça efeito sozinho.
Por falta de tempo, confiar apenas na medicação, sem mudar todo o resto que certamente tem algum papel na causa da depressão, não é suficiente. Isso é perpetuar a correria, o atropelamento, a fugacidade das coisas.
Para a depressão, deve haver também uma mudança nos hábitos, na maneira de pensar, nas rotinas de pensamento. Dar um tempo ao seu cérebro. Ajudá-lo, e se ajudar.
Referência: Chiesa A, Serretti A (2011). Mindfulness based cognitive therapy for psychiatric disorders: A systematic review and meta-analysis. Psych Res 187:441-453.
Imagem de capa: Shutterstock/Luna Vandoorne
TEXTO ORIGINAL DE BRASILPOST
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