Cinco de outubro de 2015, já era de madrugada, quando ouvi um barulho vindo da cozinha (copos a partirem-se), levantei-me e fui a correr ver o que se passava. Parei junto à porta quando me deparei com a minha mãe caída no chão, com um ar pálido e sem qualquer sinal de respiração. Comecei a gritar bem alto e o meu pai veio a correr, chamou uma ambulância e pediu-me para ir chamar os vizinhos. A ambulância chegou, o meu pai disse que ia com a minha mãe para o hospital e que eu tinha de dormir em casa dos vizinhos. Passei a noite toda acordado.
Finalmente, às 9h da manhã, os meus pais chegaram a casa. Segundo o meu pai, estava tudo bem, tinha sido só um desmaio decorrente de uma quebra de tensão. O dia foi passado em família e foi muito divertido. Chegou a noite, eram 22.30h quando os meus pais disseram que eu tinha de ir para cama. Fui para o meu quarto, deitei-me e passado cerca de dez minutos, comecei a tremer, com falta de ar e fui a correr para o quarto dos meus pais. Depois de tudo o que aconteceu e pensando que seria uma situação excecional, os meus pais deixaram-me dormir com eles.
O que eles não estavam à espera foi o que sucedeu nos dias, semanas e meses seguintes. Nos primeiros dias, eu ainda chegava a ir para o meu quarto deitar-me, mas passado cinco minutos já estava no quarto dos meus pais a chorar e a pedir para dormir com eles. Os meus pais diziam que eu já tinha onze anos, que não podia dormir no quarto deles e então um deles tentava levar-me de volta para o meu quarto, mas eu não queria… chorava, gritava a dizer que queria os dois. Chorava tão compulsivamente que eles ficavam assustados e acabavam por me deixar dormir no quarto deles. Nos dias seguintes, já ia direto para o quarto dos meus pais.
Desesperados, os meus pais, recorriam a todos os argumentos para me tentarem convencer a voltar para a minha cama, mas eu sabia que se chorasse mais um bocadinho, eles iam ceder. E assim foi…dias tornaram-se em semanas, que se tornaram em meses. Um dia, eles ainda experimentaram colocar a minha cama no quarto deles, mas de nada adiantou, eu queria dormir com os dois! Assim que eu conseguia adormecer, o meu pai ia dormir para o sofá da sala ou para minha cama. Durante meses, eu dormia apenas três horas por noite e nem os comprimidos para dormir que o médico receitou, faziam efeito. Após seis meses nesta situação e já desesperados, os meus pais resolveram levar-me a uma consulta de psicologia.
Uma das coisas que fizemos foi desenhar um círculo, que representava um ciclo com o pensamento, a emoção e o comportamento. Depois da minha psicóloga me explicar como funcionava o ciclo, tentamos em conjunto analisar a minha situação segundo essas três variáveis:
- Pensamento: No momento que antecedia a minha ida para a cama, eram muitos os pensamentos que me ocorriam, alguns através de imagens: “Os meus pais vão morrer enquanto eu estou a dormir.”; “Um ladrão vai assaltar a nossa casa e matar-nos.”; “Eu posso morrer enquanto estou a dormir.” Estes pensamentos e muitos outros que escrevi numa folha, fizeram-me perceber que o meu medo não era o de dormir sozinho, era outro muito maior e muito mais assustador. Segundo a minha psicóloga, estas “crenças” ativavam todo um conjunto de emoções e sensações corporais.
- Emoção: Este medo desproporcionado e fora do controlo gerava em mim uma resposta emocional – ansiedade e às vezes pânico – que eram traduzidas em sensações corporais: palpitações, dificuldades em respirar, insónias e choro compulsivo. Tudo isto por sua vez, gerava uma resposta comportamental.
- Comportamento: Correr para a cama dos meus pais e agarrar-me a eles, evitar dormir no meu quarto.
Tudo isto foi muito difícil para mim, porque eu estava tão perturbado e descontrolado que não conseguia prestar atenção ao que me passava pela cabeça. Em conjunto com a minha psicóloga chegámos à conclusão, que a reação dos meus pais à situação, apenas reforçava as minhas crenças de que: “Eu precisava dos meus pais ao meu lado para conseguir dormir. ”; “Sem eles ao meu lado, algo de mau podia acontecer”. Sem querer, todas as noites que os meus pais cediam e me deixavam dormir no quarto deles, iam alimentando em mim a confiança de que bastava eu chorar um pouco, para me deixarem dormir com eles e assim o meu medo ia crescendo. Eu era um rapaz de onze anos de volta à cama dos pais, sem qualquer hipótese de voltar para o meu quarto porque isso era demasiado devastador para mim e eu não ia aguentar perder os meus pais, pelo menos era assim que eu pensava.
Todo o trabalho com a psicóloga passava por conseguir analisar, perceber e mudar essas crenças disfuncionais, aprender técnicas de relaxamento e gradualmente estabelecer objetivos de mudança de comportamento.
A minha psicóloga transmitiu-me a confiança de que eu, com a sua ajuda, iria conseguir superar tudo isto. E a sua certeza, tornou-se a minha força! Eu não queria mais continuar a viver em função de um medo que condicionava o meu sono, a minha energia, a minha vida e a dos meus pais, e sobretudo a minha felicidade.