Por Giovanny Gerolla
Nem todo mundo tem a oportunidade ou gosta de celebrar o Natal com a família reunida, em volta da mesa farta e com crianças correndo pela casa vestindo gorros de Papai Noel. Por outro lado, qualquer um, querendo ou não, se sente cercado pela data: nas redes sociais, no rádio, na televisão, nas conversas e pelas ruas decoradas e iluminadas.
Apesar do hábito de classificar como depressão a tristeza que muitos sentem nessa época, o sentimento não caracteriza, necessariamente, uma depressão, que é um quadro patológico. Sem encontrar sentido nas coisas que o circundam, o deprimido apresenta vários sintomas emocionais e físicos: sentimento de culpa sem razão aparente, falta de vontade de socialização, perda ou ganho de peso, distúrbios do sono, raciocínio lento, melancolia, perda de apetite, dores no corpo e na cabeça são alguns deles.
“Alguém está deprimido quando apresenta esta ‘baixa’ no humor por, no mínimo, duas semanas ininterruptas, passando por momentos de tristeza, irritabilidade e ausência completa de qualquer prazer”, afirma a psicóloga Juliana Teixeira Fiquer, pesquisadora e pós-doutoranda do Laboratório de Psicopatologia e Terapêutica Psiquiátrica do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP.
“Quem fica efetivamente deprimido no final do ano é porque já carrega consigo um histórico parecido”, diz a especialista. O verdadeiro paciente clínico chega a acreditar que aquelas pessoas felizes com o gorro de Papai Noel, na televisão, é que deram certo na vida, enquanto ele é um fracassado.
O que representam as festas de final de ano?
Este é um período que simboliza encerramento, conclusão e, como todo fim, gera tristezas: “O que provoca essa sensação é uma mistura de melancolia com frustração, pela revisão do que se passou [ou teria de ter se passado], alegrias e as expectativas sobre o que virá com o ano novo”, diz a psicóloga Maria Isabel Lima Hamud.
Entenda, portanto, que estar triste é normal, e não um sinônimo de depressão (e que não ter vontade de participar do Natal não é raro). “É difícil pensar que alguém desenvolverá um quadro depressivo apenas em função das festas de fim de ano”, diz Maria Isabel.
Obrigação de celebrar
Pessoas presenteiam para estarem presentes na vida de quem os recebe. “Ter de presentear ou ir a festas só para obter reconhecimento social, numa determinada época do ano, é fator gerador de grande sensação de impotência, principalmente quando a pessoa não pode (porque não tem condições financeiras) ou não tem vontade de presentear”, diz o analista, psicólogo e conselheiro do Conselho Federal de Psicologia, Henrique Rodrigues. De forma geral, a obrigação de celebrar e comprar é o que causa raiva e angústia.
Mas, às vezes, o ano foi pesado e na hora da retrospectiva a tristeza surge. O pesar pela morte de um ente querido, a perda de um emprego, uma separação ou doença podem significar grandes mudanças na vida –uma realidade que não se consegue afastar, por mais feliz e próxima do ideal que seja a reunião familiar. “Tais fatos corroboram e intensificam esse sentimento de tristeza e maior introspecção, comum nesta época”, diz Isabel.
Segundo ela, essa tristeza não deve ser escondida e não há motivo para prevenir a melancolia de final de ano. “Ela pode ser muito bem-vinda quando nos propicia momentos de reflexão sobre nossas escolhas que, normalmente, não temos em outras oportunidades cotidianas”.
Depressão ou não?
Para Juliana Teixeira Fiquer, no final de ano ocorre um “curto-circuito”: “Ao mesmo tempo em que nos é passada a ideia de que o consumismo vai nos realizar como pessoas, nos completar e fazer um Natal mais feliz, somos também convocados a repensar nossas vidas; olhar para trás e ver que há vazios”.
E o fato é que a vida de ninguém é perfeita. Logo, se nessa hora se instalar, por definitivo, uma depressão, o jeito será procurar ajuda médica para combatê-la. Também é recomendado que, paralelamente, a pessoa faça sessões de psicoterapia. Porém, se for apenas uma tristeza passageira, não se preocupe com ela. Ficar triste faz parte da vida e não há nada de patológico em não se identificar com as festas de final de ano.
Imagem de capa: Shutterstock/ Marcos Mesa Sam Wordley
TEXTO ORIGINAL DE UOL