Por Beariz Vichessi

Pediatras e educadores são unânimes sobre o quão difícil é a tarefa de educar os filhos. Nos consultórios médicos e em reuniões pedagógicas, uma das questões mais comuns levadas pelos pais tem a ver com a forma de lidar com as crianças: “Estou mimando demais?”. No entanto, mimar não é necessariamente algo ruim, que estraga as crianças, como costumam dizer os mais velhos. Mimar pode ser, sim, fazer algo bom.

De acordo com Monica Picchi, neonatologista e pediatra no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, não há nada de errado em comprar algum brinquedo para dar à criança quando ela está doente, para tentar alegrá-la um pouco. Ou faltar no trabalho para lhe fazer companhia e prestar cuidados em uma situação como essa. “Esses mimos são bons”, diz a médica.

Também não é mimar pegar no colo ou fazer carinho quando o filho se machuca. Nem reservar um tempo do dia para não ser interrompido por ninguém para brincar com ele. Ou acompanhar o dever de casa. “O problema está em fazer esse tipo de coisa sem necessidade real, tirando a autonomia da criança (principalmente a partir dos cinco anos), impedindo que ela resolva situações por conta própria quando tem condições para isso, antecipando-se ao pedido dela (que às vezes nem ocorre), ou, pior, ter essas atitudes para fingir que não é negligente e tentar apaziguar a própria culpa por não dar atenção como deveria”, afirma Mônica.

O uso da palavra mimo, para Vânia Grecco, gestora pedagógica do berçário e da educação infantil do Colégio Elvira Brandão, em São Paulo, e psicóloga especialista em desenvolvimento infantil, deveria ficar restrita ao sentido de dar um presentinho, um mimo para alguém. “Quando a criança está doente e quer colo, ela não está sendo mimada, está sendo acolhida. É uma forma de ajudá-la a lidar com o que está acontecendo com o corpo dela”, fala.

Os pais também devem levar em conta a idade das crianças para analisar o que fazem. Até os quatro primeiros meses, por exemplo, bebês precisam ser acolhidos sempre. Pegar no colo não vai deixar ninguém mal acostumado. Pelo contrário. Nessa fase da vida, eles precisam de acolhimento e de muito contato pele a pele para se sentirem bem e seguros. “Choram, reclamam ou até mesmo esperneiam por alguma necessidade real. Pode ser fome, frio, calor, dor ou falta de acolhimento. Não fazem isso por birra ou porque estão mal acostumados. São indefesos”, declara Felipe Lora, pediatra no Hospital Infantil Sabará, em São Paulo.

Somente a partir do quinto mês de vida do bebê, ele aconselha os pais a tomarem um pouco mais de cuidado com o excesso de colo em resposta a qualquer reclamação da criança. “Às vezes, ela reclama um pouquinho e volta a dormir, basta esperar um pouco. Mas é claro que se chora mais é preciso checar se não há nada de errado. Fralda suja, febre, fome, incômodo provocado por alguma peça de roupa. Costumo indicar que se espere por dez minutos antes de pegar no colo em caso de choro, caso contrário, a criança acostuma e fica mimada em relação a isso”, diz Lora.

Monica enfatiza que, por volta dos sete meses, as crianças já têm condições de adormecer no berço. “Se a criança só dorme embalada, no colo de alguém, é porque foi mimada assim”, afirma.

Linha tênue

O limite entre mimar e acolher é muito tênue. Por conta disso, os pediatras recomendam que os pais sempre estejam muito atentos ao comportamento dos filhos, analisando se as atitudes das crianças têm a ver com uma necessidade real ou um capricho, e ao próprio comportamento, avaliando quais pedidos atendem e como. “Geralmente, a criança que é atendida sempre e por qualquer coisa passa a não dar valor nem demonstra estar confortada, alegre ou mais calma. Está mimada do ponto de vista ruim. Não importa o que os pais façam, ela simplesmente quer que façam”, diz Lora.

Lora e Monica ainda ressaltam que a criança é mimada por alguém, ou seja, os adultos precisam se responsabilizar por isso. “Quando os pais impõem um horário para dormir e eles mesmos quebram a regra diversas vezes –com o famoso ‘só hoje vou deixar, coitadinho, quer brincar mais’– estão mimando os filhos. Assim, eles vão entender cada vez menos negativas para seus pedidos, seja lá quais forem”, afirma Monica. Para não mimar as crianças de um modo ruim, ela recomenda, inclusive, que as famílias economizem na quantidade de “não”. “As negativas precisam ter peso e valor. E isso não quer dizer que é para falar muito ‘sim’, mas arcar com as tomadas de decisão”, fala.

Vânia ressalta a importância de os pais ensinarem aos filhos a lidar com frustrações, aprendizagem importante para toda a vida. E isso não quer dizer fazê-los esperar a ponto de pararem de chorar por exaustão. Esse é o estresse negativo, segundo ela. O adequado é explicar à criança que o que ela quer será feito, mas ela precisa esperar. “Esse é o estresse positivo”, diz.

A respeito de elogios, Lora recomenda que os pais analisem os momentos que eles fazem sentido de serem ditos. “Elogio sem mérito, além se ser mentiroso, mima a criança, que passa a desvalorizar a fala dos pais”, afirma.

No caso de famílias com dois ou mais filhos, compreenda que, embora sejam irmãos, as crianças são diferentes e precisam ser cuidadas e atendidas cada uma a seu modo. Fazer uma coisa para um pode ser mimar do ponto de vista negativo. Para outro, pode ser acolhimento. “As pessoas têm ritmos diferentes. Um filho pode precisar de ajuda para escovar os dentes até certa idade, enquanto o outro já faz isso desde muito pequeno, por exemplo. Acompanhar o primeiro na tarefa não tem nada a ver com mimo, tem a ver com educar”, diz Monica.

TEXTO ORIGINAL DE UOL

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