Este é um dos fenômenos mais curiosos da neurociência cognitiva.
Há algumas pessoas no mundo com “visão cega”: são pessoas cegas, mas que têm uma espécie de “segunda visão”, pois seu cérebro é capaz, inconscientemente, de perceber as coisas ao seu redor. A escocesa Milina Cunning perdeu a visão por volta dos 20 anos. Pesquisadores investigam seu caso há algum tempo.
“Se atirassem uma bolinha de ping-pong na cabeça de Milina, provavelmente ela levantaria seu braço e a pegaria na mão antes de ter consciência do que estava acontecendo”, disse Jody Culham, uma pesquisadora que estudou o cérebro de Cunning. “Posso me mover na minha casa sem problemas e organizar as coisas, mas não consigo vê-las. Sei que estão aqui, meu cérebro me informa disso”.
Mas como é a vida através dos olhos de Milina? Assim como ela mesma descreve:
“Quando cheguei ao hospital, era uma pessoa com visão normal. Me colocaram em coma induzido devido a problemas de saúde que eu tinha. E fiquei em coma durante 52 dias.” “Quando acordei, via tudo completamente preto. Não era capaz de ver nada. Me disseram que, enquanto eu estava em coma, sofri um derrame cerebral que me deixou cega.”
“Durante os próximos meses, as coisas começaram a mudar. Depois de seis meses, parecia que eu via alguma cor, mas ninguém acreditava em mim.” “Então, entrei em contato com um neurologista chamado Gordon Dutton. Assim que me viu, ele supôs que eu tinha visão cega”.
“Quando me encontrei com Dutton, ele insistiu em fazer alguns testes. Em um deles, ele colocava cadeiras no corredor do hospital e me pedia para caminhar entre elas. ‘Simplesmente ande no seu ritmo normal’, disse”. “Fiz isso e fiquei esbarrando nas cadeiras. Quando cheguei ao fim do corredor, ele me disse: ‘Agora caminhe um pouco mais depressa entre as cadeiras'”.
“Assim que caminhei mais depressa através delas, uma a uma, não me machuquei nenhuma vez. Foi incrível”. “Dutton me explicou o seguinte: ‘não pense muito, apenas faça. Não dê muitas voltas na cabeça’. Era meu subconsciente me dizendo como realizar essa tarefa e evitando que eu batesse nas cadeiras”.
“Consigo me movimentar pela minha casa sem problemas, mas não consigo ver as coisas. Sei que estão ali, meu cérebro me diz”. “O mesmo ocorre se a minha família deixa coisas atiradas pela sala. Digo a elas: ‘vocês têm que arrumar um pouco as coisas, senão vou tropeçar por tudo.” “Se há alguma coisa, como uma bolsa ou sapatos, consigo vê-los, passar por cima ou guardá-los”.
“É estranho que consiga ver coisas que eu não posso ver por ser cega”.
“Sei que você está sentado aqui, perto de mim…Mas não consigo vê-lo”.
Imagem de capa: Shutterstock/Vic29
TEXTO ORIGINAL DE BBC BRASIL
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