Por Alejandro Tovar para o EL País
Se a vida ter der limões, faça uma limonada. Muito bonito. Mas você não gosta de limonada. É azeda e te obriga a fazer aquela cara… “picassiana”. Mas melhor não dizer isso em voz alta, não verbalizar, porque vão te chamar de pessimista. Vão dizer que é um fraco, que não sabe curtir a vida. Então é preciso continuar sorrindo. Porque se você sorrir para a vida, ela te sorrirá de volta. Porque se você se convencer disso, tudo correrá bem. Porque, se você é capaz de sonhar, é capaz de fazer. E assim por diante.
Esse é o caminho para a felicidade. Tem certeza? Dúzias de estudos afirmam que não, que deixar-se arrastar pela depressão e pelo desânimo é tão ruim como evitar os problemas e sorrir sem nenhum fundamento, criando assim uma tendência contrária ao otimismo mal compreendido e defendendo a necessidade de, por que não, estar de cara amarrada de vez em quando.
Uma das vozes mais decididas na luta contra a sobrecarga de felicidade é a da ativista norte-americana Barbara Ehrenreich. Em seu livro Sorria: Como a Promoção Incansável do Pensamento Positivo Enfraqueceu a América, ela lança sua alternativa ao que chama de “meia realidade”, aquela caravana de mensagens ilusórias em que a sociedade parece acreditar. Ehrenreich teve um câncer de mama e, durante seu processo de cura, comprovou que ninguém lhe permitia sentir-se assustada, preocupada.
Mas não cedeu: por que não teria medo em uma situação tão crucial? Em sua tese, ela afirma o que lhe parece mais lógico: olhar para o outro lado não resolve os problemas nem faz você se sentir melhor, só aprendendo a administrar as emoções de forma correta é que se pode viver realmente conectado com os sentimentos e levar uma vida condizente com aquilo que está ocorrendo.
“Um medo não ouvido pode levar, com o tempo, a ataques de pânico descontrolados, assim como uma tristeza ignorada pode transformar-se em depressão”, diz Ángel Luis Sánchez, psicólogo e diretor do Instituto de Desenvolvimento
“Pretender experimentar só emoções positivas é tão absurdo quanto impossível”, afirma Rosana Pereira, psicóloga da clínica Haztúa e especialista em Psicologia Positiva, que acrescenta: “É evidente que, diante uma situação normal, é preferível ser otimista, mas as emoções ditas negativas cumprem uma função adaptativa que nos ajuda a sobreviver”.
Porque a raiva, a tristeza, o estresse e o medo são mecanismos que, bem administrados, nos permitem adaptar-nos a nossa realidade e vislumbrar soluções ou rotas de fuga. “É assim desde que o homem é homem: o homem das cavernas não tentava dialogar com um guepardo nem fazia caso omisso quando o animal ia atacá-lo; simplesmente fugia o mais rápido possível movido pelo medo de ser devorado”, constata Pereira.
Sentimentos como medo, raiva, esgotamento ou frustração devem servir como motor de mudança, devem revelar-se como o germe que aciona o pensamento crítico e a busca de alternativas. Negá-los só fomenta a rigidez emocional e ainda traz um grau extra de mal-estar a quem já se sente mal por uma situação negativa: saber-se incapaz de sorrir para a vida.
Segundo Ángel Luis Sánchez, psicólogo e diretor do Instituto de Desenvolvimento, ignorar esses alertas é perigoso: “Um medo não ouvido pode levar, com o tempo, a ataques de pânico descontrolados, assim como uma tristeza ignorada pode transformar-se em depressão”.
Por isso, eles não devem ser evitados, mas tampouco se pode permitir que subjuguem a vontade. “O importante é que ninguém fique preso no derrotismo e que entenda que tudo que sente é uma resposta lógica ao que lhe acontece”, continua Pereira, estabelecendo assim a linha divisória entre os fundamentos da Psicologia Positiva e as frases categóricas dos gurus da felicidade. E define a primeira como um complemento da Psicologia tradicional, uma vez que “não se limita a arrumar uma situação de dor emocional, mas mostra as pautas para administrar melhor essas emoções adaptativas negativas e ensina a enfrentar os problemas e obter maior bem-estar”.
“Pretender experimentar só emoções positivas é tão absurdo quanto impossível”, diz Rosana Pereira, psicóloga da clínica Haztúa e especialista em Psicologia Positiva
Ela sabe que a Psicologia Positiva, às vezes, é associada àquelas frases categóricas e ao otimismo irresponsável e mal compreendido. “Existe muita gente atuando sem qualificação e os gurus fazem um desfavor à Psicologia. É preciso desconfiar de toda sentença categórica; não podemos nos esquecer de que a Psicologia é tudo, menos categórica”, porque fala e trabalha com pessoas, e cada uma reage de forma distinta. Nessa linha caminham também outros estudos que indicam os riscos de uma Psicologia Positiva mal aplicada.
A pesquisadora María Prieto-Ursúa, do departamento de Psicologia da Universidade Pontifícia Comillas de Madri, fala da tirania da atitude positiva. Ela diz que, de fato, às vezes é complicado sentir-se feliz vendo o telejornal, mas que prescindir dessa carga de sofrimento nos afasta da solidariedade, da sensibilidade e da vontade de melhorar a situação. E ressalta que muitos seguidores entusiastas da Psicologia Positiva podem ter interpretado mal sua mensagem levando-a ao extremo, à “necessidade de manter uma atitude positiva ou de otimismo em todas as circunstâncias”.
Não. Porque, assim, será impossível confrontar o que está acontecendo e concentrar-se em achar uma solução. “Um otimismo excessivo pode nos fazer confiar demais no futuro e não nos esforçarmos o suficiente para alcançar aquilo que pretendemos”, confirma Ángel Luis Sánchez.
Assim, quando alguém te convidar a deixar os problemas de lado e sorrir para a vida, talvez seja bom explicar a utilidade de estar triste, aborrecido, com raiva, de atravessar todas as fases emocionais que os problemas desencadeiam. Ou, quem sabe, responder a seu sorriso mostrando a língua. Se a vida te der limões… siga em frente. Será preciso continuar trabalhando para transformá-los em laranjas.
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