Ninguém nos decepciona. Nós é que criamos expectativas demais, e nos frustramos na mesma proporção

Há uma frase que diz mais ou menos assim: “Nada é eterno. O café esfria, o cigarro apaga, o tempo passa, as pessoas mudam…” Há certa verdade nessa frase; porém, acredito que as mudanças que enxergamos nas pessoas são as mudanças que acontecem principalmente dentro de nós, isto é, nós é que mudamos, e de alguma maneira, passamos a perceber a realidade de outra forma, e isso inclui a consciência que temos uns dos outros.

Você ama aquela menina instável e inconstante. Uma hora ela fala que você é o cara da vida dela, outra hora diz que está confusa. Você aceita, compreende – “afinal, ela está passando por um momento difícil” – insiste.

Você está vidrada naquele pilantra. Quando estão juntos, os momentos são intensos e perfeitos. Porém, ele some por uma semana, visualiza suas mensagens e não responde, te deixa no vácuo, te tortura com o silêncio e sinais confusos. Você chora e encharca o travesseiro com seu pranto, mas esquece tudo quando ele reaparece cheio de lábia, dizendo sofrer de “falta de tempo”.

Você espera, releva, permite, compreende. Você justifica o injustificável, perdoa o imperdoável, aceita o inaceitável. Você sofre, mas não é capaz de impor limites; sente que te faz mal, mas tem medo de exigir demais e perder; quer algo melhor para sua vida, mas ainda nutre esperanças que o outro mude e tudo se transforme.

Você constrói castelos em cima de terrenos frágeis, mergulha de cabeça em piscinas rasas, enxerga oceanos em poças d’água, guarda lugares para quem não tem intenção de sentar ao seu lado, coloca sua vida em suspensão esperando do outro uma decisão… mas quando cai o pano, você se sente enganado e quer arranjar culpados. Mas será que alguém te iludiu mesmo? Ou foi você que quis tanto, mas tanto, tanto, tanto, que acabou mentindo para si mesmo?

Há uma frase atribuída a Freud que diz: “Qual a sua responsabilidade na desordem da qual você se queixa?” Pois somos responsáveis pela realidade que atraímos, permitimos e vivenciamos. Muitas vezes nos decepcionamos com alguém, mas na verdade só passamos a enxergar a realidade tal qual ela sempre foi, nua e crua, sem as lentes da fantasia que nós mesmos projetamos. É o tal do desencantamento. No lugar da carruagem, uma abóbora. No lugar dos cavalos, ratinhos. No lugar do vestido de ouro e prata, alguns trapinhos.

O tempo traz entendimento e dissolve algumas ilusões. Vamos aprendendo a abandonar as máscaras e remover as lentes da fantasia. Um dia a gente começa a enxergar tudo como realmente é, e decide, com base na verdade, se vale a pena continuar. Sem desculpas, sem mentiras pra si mesmo, sem projeções e saltos no escuro. Aprendemos a alimentar o que é recíproco, e a amar só o que tem algo a acrescentar.

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Escritora mineira de hábitos simples, é colecionadora de diários, álbuns de fotografia e cartas escritas à mão. Tem memória seletiva, adora dedicatórias em livros, curte marchinhas de carnaval antigas e lamenta não ter tido chance de ir a um show de Renato Russo. Casada há dezessete anos e mãe de um menino que está crescendo rápido demais, Fabíola gosta de café sem açúcar, doce de leite com queijo e livros com frases que merecem ser sublinhadas. “Anos incríveis” está entre suas séries preferidas, e acredita que mais vale uma toalha de mesa repleta de manchas após uma noite feliz do que guardanapos imaculadamente alvejados guardados no fundo de uma gaveta.