Por Maynara Fanucci
Voltei para casa lendo notícias no Facebook sobre o “trágico” término do casal Angelina Jolie e Brad Pitt. As especulações sobre o divórcio, a princípio, giraram em torno de traição, drogas, álcool e divergência quanto à criação dos filhos. Motivos à parte, só se via uma enxurrada de tristeza e frustração alheia sobre o divórcio do ex-casal nos status de Facebook. Comentários do tipo “parei de acreditar no amor agora” começaram a pipocar também dizendo que não acreditavam que o relacionamento tão “perfeito” e lindo tinha dado “errado”. E eu só conseguia pensar o quanto nossas mentes estão programadas de uma maneira distorcida da realidade para acreditar que existe certo e errado em relacionamentos. Ou para acreditar que a única maneira de “dar certo” é seguindo o clichê “felizes para sempre”, coisa que eu gostaria de dizer que considero por vezes muita sorte (ou resiliência) mesmo por parte do casal (ou por parte de uma das pessoas).
Aqui bem longe do “viveram felizes para sempre” dos estúdios Disney, existe a nossa vida real de cada dia. Existe o pegar ônibus lotado, tropeçar na calçada, contar o dinheiro no fim do mês, conhecer outras pessoas e, principalmente, mudar. Eu mesma mudo um pouco diariamente, não tem muito como controlar. A vida envolve pessoas que, por mais parecidas que sejam entre si, possuem diferenças. Histórias, sentimentos, sensações, percepções, sonhos, prioridades e vontades distintas. Ou, por mais que sejam similares, elas mudam ao longo da vida, principalmente depois de 10 anos. Eu não sei quem serei daqui a 10 anos, mas talvez eu olhe para esse texto e pense: “Como alguém pôde publicar isso algum dia? Como eu pude escrever isso?”. Nós todos mudamos, e que bom que mudamos.
O problema maior foi constatar como nossos conceitos de “certo” e “errado” em relação a relacionamentos são excessivamente romantizados, principalmente por mulheres no que diz respeito ao “amor eterno” e “felizes para sempre”. Ou hipersexualizados pelos homens, que em sua maioria só conseguiam comentar que “não acredito que o Brad fez algo para aquela mulher maravilhosa se separar dele”, porque claro, Angelina é uma mulher muito bonita dentro dos padrões estabelecidos e respeitados na nossa sociedade, portanto, não deveria ter “sido deixada” por um homem, ou tido motivos para tal. Mas, no fundo, ninguém sabe o que aconteceu. E justamente as pessoas que não sabem o que aconteceu foram as que pareceram mais sentir o turbilhão de emoções do término alheio. E eu digo uma coisa: romantizar relacionamentos que você não sabe a história toda ou não faz parte é simplesmente correr o risco de estar romantizando situações de abuso psicológico e físico, ou brigas e traições. Até mesmo quando não envolve nada disso, pode ser porque as pessoas não estão sendo felizes juntas. Só porque o mundo acha que eles formam o casal “ideal” e “perfeito” não faz deles automaticamente ideais ou perfeitos, muito pelo contrário. Só quem sabe o que aconteceu pode decidir a partir do que se viveu e tomar atitudes para continuar ou terminar.
Não é porque um casal parece bem por fora que isso significa que eles estão realmente bem. Se envolver brigas, traição, abuso de álcool ou drogas e divergências quanto à relação dos filhos, provavelmente é melhor que exista a separação, por mais que as pessoas temam a palavra e a situação em si, além de tudo o que ela envolve. Separação nem sempre é fácil, principalmente quando um dos lados não a deseja. E eu penso que, na grande maioria dos casos, existe um certo benefício para mulheres pelo término, não mencionando as exceções. Quantas amigas eu vi terminando com seus namorados e pensei: “Esse cara nunca a mereceu”. Quantas mulheres você conhece que se doavam incondicionalmente para um relacionamento abusivo, ou alguém que simplesmente não se importava? Quantas tiveram sua autoestima diminuída por isso, sem que ao menos percebessem o que estava acontecendo?
Por mais que o fim de relacionamentos, principalmente os traumáticos, sejam doloridos e exijam um processo de recuperação, já vi muitas mulheres que saíram de relacionamentos abusivos, que terminaram porque a relação estava insustentável ou porque elas chegaram ao seu limite. Por mais que doa, existe do outro lado a libertação. Mulheres que, de alguma forma, colocaram fim a situações que não mais toleravam, sem mais ter medo de estarem solteiras de novo ou sem medo do que os outros vão falar. E que, de alguma forma, se livraram de uma certa culpa que carregavam sozinhas. Culpa que as mulheres geralmente carregam por todos os problemas do mundo e principalmente pelo término de um relacionamento. Já que, de alguma forma, a sociedade as culpa pelo fim de namoros, casamentos, uniões estáveis, porque se algo deu errado, foram elas que não se esforçaram o bastante, mesmo quando elas são o elo mais forte da relação, suportando o insuportável, superando o insuperável.
Minha vó me contou há 3 dias atrás que uma conhecida da família se separou do marido depois de 25 anos de casada, porque ele havia a traído diversas vezes. Eu só consegui ficar feliz por essa mulher finalmente ter tido coragem de colocar um fim nisso e sinto muito principalmente pela dor dos anos que ela teve que aguentar esse tipo de comportamento do marido, isso se não teve que aguentar coisas piores. Não sinto tanto pela dor da separação que ela deve estar enfrentando apesar de ter empatia, porque sei que isso vai cicatrizar com muito mais facilidade do que a dor causada por outras atitudes, como por exemplo as seguidas traições.
No mundo real, talvez nós mulheres devêssemos reprogramar nosso cérebro. Não só para relacionamentos, mas para todo o resto com o que fomos duramente socializadas. Não é simples e, como eu disse, não tenho a fórmula. Mas acredito que a consciência seja o primeiro passo do processo. E para os que estão achando que um casamento de 11 anos deu “errado”: eu já me considero vitoriosa e participando de um grande acontecimento quando chego a um terceiro encontro com uma pessoa, sinto que não tenho nem roupa apropriada para a ocasião. Quem dirá noivar, casar, passar 11 anos ao lado de alguém. “Dar certo” pra mim é viver de acordo com o que te faz bem e com o que você acredita naquele momento, vivendo a verdade. Viver verdade é sempre mais importante do que viver mentira. Solidão nem sempre é fácil, mas também faz parte do processo de autoconhecimento. Se o relacionamento não faz mais parte da sua verdade, não precisa existir. Eu tento pensar na maior coisa que eu conheço: o Universo. Se nem o Universo e as estrelas são infinitos, por que você acha que um relacionamento tem que ser?
Segundo o IBGE, a média de vida de um cidadão brasileiro é de 72,7 anos. Onze anos de relacionamento equivalem a pouco mais do que ⅙ de vida. Sabe o que é dividir a vida em 6 e viver um pedaço inteiro com uma pessoa? É muito tempo. Os filmes românticos são responsáveis por muitas frustrações na vida e o amor romântico é duramente usado para manipular mulheres. Mulheres que acham que para encontrar o “príncipe encantado” precisam disputar espaço e atenção com outras, que acreditam que vale tudo para ter um relacionamento, por mais que você não consiga lembrar o último momento bom que teve com a outra pessoa. Não é porque os filmes te doutrinaram a acreditar que só o “felizes pra sempre” funciona que temos que desconsiderar as complexidades que envolvem um relacionamento real fora dos estúdios Walt Disney. Eu tenho certeza que, depois de 11 anos, a vida das princesas mudou drasticamente. Mas isso os contos de fada não vão te contar.
Imagem de capa: Shutterstock/Lauren Elisabeth
TEXTO ORIGINAL DE BRASILPOST
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