Reflexões

O Brasil não chora mais lágrimas e nem sangue. Hoje ele chora “lama”.

Por Ana Macarini

Debaixo da lama da barragem de dejetos de Brumadinho jazem vidas ignoradas, jazem casas invisíveis, jazem sonhos de uma vida menos sofrida. As mineradoras fazem vistas grossas às tecnologias disponíveis para fiscalizar a integridade dos muros, porque dejetos não geram lucros, porque – na opinião torta delas -, pessoas são menos importantes que dinheiro.

Há três anos da tragédia de Mariana, famílias continuam devastadas, pessoas seguem mortas e suas vidas não valem nada. Foram esquecidas. Técnicos de outras partes do mundo vieram analisar os impactos da tragédia ambiental. O solo do Brasil é palco do descaso dos órgãos públicos que deveriam nos proteger do perigo. Mas, protegem os lucros astronômicos de empresas sólidas, riquíssimas e assassinas.

A lama segue seu curso…

E eu fico aqui pensando nos perigos ao meu entorno, no quanto nos omitimos, nos calamos e também esquecemos tantas dores alheias porque saíram das pautas emergenciais das mídias digitais.

Do ponto de vista simbólico, todos nós – sem exceção! -, temos nossas barragens de contenção de dejetos. Será que em nosso microcosmo somos menos irresponsáveis em relação ao nosso lixo, à nossa lama?

Ou será que também fazemos vistas grossas à nossa falta de jeito de olhar para a dor do outro que, próximos ou distantes, travam lutas para sobreviver.

Será que somos cegos também? Cegos emocionais autocentrados em nossas dores particulares? Protegidos atrás de muros altos e seguros, nos esquivamos de olhar a lama que deixamos vazar pouco a pouco e invadir os quintais, as casas, os corações do outro?
Somos facilmente enganados por nós mesmos. Em nossas próprias urgência e dores, vamos nos encolhendo num movimento fetal, a partir do qual nos acostumamos com a única visão de nosso próprio umbigo.

Na hora máxima da dor, queremos falar a respeito; queremos postar imagens de repúdio e de solidariedade; queremos enviar água, produtos de limpeza e alimentos não perecíveis. Esse movimento nos apazigua. Temos a impressão de estarmos fazendo a nossa parte. E estamos mesmo!

Mas… e depois? Daqui uma semana… um mês… um ano…

Teremos esquecido os soterrados sob a lama de Brumadinho. Porque haverá outras tragédias mais atuais, talvez maiores, mais terríveis. E, nos acostumamos a lidar com as urgências. Nos acostumamos a travar batalhas mais próximas. Gritamos muito, somos acometidos por uma fúria diante da desigualdade, dos comportamentos abusivos, da violência contra os diferentes, do machismo, da xenofobia, da homofobia.

Vivemos absortos num redemoinho de batalha de ideias e abrimos mão de aprender a agir. Esquecemos de como se faz para arregaçar as mangas e as barras de nossas calças para ajudar a puxar o rodo para limpar a lama que cobriu o povo.

Somos culpados também! Somos omissos, não buscamos descobrir como é que age alguém que vive num país democrático! Usamos a nossa voz apenas numa cantilena repetitiva e inútil porque acreditamos que essa falação tem algum poder ou serventia.

Que a lama de Brumadinho nos revele a covardia de cada um de nós – e eu me incluo nesse “nós”. Que a lama de Brumadinho desperte em nós um desejo de fazer faxina… para limpar os dejetos da mineradora, para varrer os dejetos do egoísmo da nossa alma.

Hoje não choramos mais lágrimas e nem sangue. Choramos lama.

Psicologias do Brasil

Informações e dicas sobre Psicologia nos seus vários campos de atuação.

Recent Posts

Para a psicologia, o que significa ter muitas roupas que você não usa?

Por que temos tanta dificuldade em nos livrar de roupas que não usamos? Segundo especialistas,…

14 horas ago

Mãe recorre à Justiça para deixar de sustentar filha de 22 anos que não estuda e nem trabalha

Segundo a mãe, a ação judicial foi a única forma de estimular a filha a…

15 horas ago

Obra-prima da animação que venceu o Oscar está na Netflix e você precisa assistir

Uma pequena joia do cinema que encanta os olhos e aquece os corações.

1 dia ago

O filme da Netflix que arranca lágrimas e suspiros e te faz ter fé na humanidade

Uma história emocionante sobre família, sobrevivência e os laços inesperados que podem transformar vidas.

1 dia ago

Dicas para controlar os gastos e economizar nas compras

Você ama comprar roupas, mas precisa ter um controle melhor sobre as suas aquisições? Veja…

3 dias ago

Minissérie lindíssima da Netflix com episódios de 30 minutos vai te marcar para sempre

Qualquer um que tenha visto esta minissérie profundamente tocante da Netflix vai concordar que esta…

3 dias ago