Por Lorena Fleury de Moura
O massacre de Realengo despertou o debate acerca da possibilidade de o comportamento de tais autores ser mais bem explicado pelos chamados transtornos mentais. Dentre os vários especialistas que buscaram explicações para o comportamento de Wellington, o atirador da escola do Rio de Janeiro, alguns chegaram a apontar a esquizofrenia como uma possível justificativa para sua ação.
A esquizofrenia demonstra-se como um desafio para todos os estudiosos em psicopatologia. Embora já descrita e estudada há mais de cem anos pelas mais variadas abordagens e áreas do conhecimento, ainda continua como fonte de especulações e poucos achados significativos, seja em relação aos seus determinantes e ou ao seu tratamento. Assim, uma questão pode surgir a partir de tais discussões: o esquizofrênico representa algum risco para a sociedade ou para si? Para isso, entendamos primeiramente o que se entende por esquizofrenia.
A explicação trazida pelo DSM-IV-TR, o Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (2000/2002) da Associação Americana de Psiquiatria (APA), afirma que a esquizofrenia se caracteriza por dois ou mais dos seguintes sintomas, se presentes por um período de um mês: delírios, alucinações, discurso desorganizado, comportamento desorganizado ou catatônico e sintomas negativos, isto é, embotamento afetivo, alogia (redução ou ausência do falar) ou avolição (incapacidade de iniciar e persistir em atividades dirigidas a um objetivo; falta de vontade).
A abordagem estruturalista, tão comum na psicologia, não nos fornece explicações sobre as variáveis controladoras da esquizofrenia, apenas descrevem a topografia do comportamento. A literatura tradicional considera a existência de possíveis fatores orgânicos que afetariam a mente, produzindo alterações comportamentais, sendo interpretadas como sintomas de um processo mental subjacente, explicando assim a esquizofrenia.
Ao contrário, Análise do Comportamento, de abordagem funcionalista — em que se busca compreender os estímulos antecedentes e consequentes do comportamento -, volta-se para as relações estabelecidas entre a pessoa e seu ambiente. Por esse prisma, dizer que o indivíduo representaria um risco para a sociedade ou para si mesmo por ser diagnosticado como esquizofrênico seria simplificar em demasia um fenômeno já complexo por natureza: o comportamento humano. O que deve ser tomado como foco de análise são as relações desse indivíduo com seu ambiente – relações tanto imediatas como pregressas, ou seja, de sua história de vida.
O comportamento, seja ele agressivo, violento ou até mesmo suicida, está inserido em uma complexa rede de contingências, assim como qualquer outro comportamento. Tais categorias podem acontecer em qualquer contexto psicopatológico. Além disso, atribuir a causa de um dado comportamento a um transtorno seria endossar a circularidade dessas explicações: “é agressivo pois é esquizofrênico; é esquizofrênico pois é agressivo”, por exemplo.
A pessoa não pode ser considerada um risco simplesmente por ter sido diagnosticada como esquizofrênica. Só a rotulação não nos aponta as causas do comportamento: quando surgiu, como ocorre e em que condições. A esquizofrenia em si não é uma garantia da ocorrência de comportamentos violentos. Só será possível afirmar algo mediante uma avaliação funcional dos comportamentos individuais, uma vez que o espectro de comportamentos relacionados à esquizofrenia é amplo e pouco consistente.
Como foi descrito anteriormente, os critérios para o diagnóstico da esquizofrenia, além de variados, não são patognomônicos, ou seja, não são exclusivos deste transtorno. Logo, se na abordagem estruturalista já é difícil determinar de qual transtorno se trata, do ponto de vista funcionalista a investigação das contingências envolvidas é uma condição si ne qua non para a compreensão do fenômeno. De certa forma, pode-se dizer que há tantos “comportamentos esquizofrênicos” quanto há esquizofrênicos.
Portanto, só é possível determinar se alguém se torna ou pode se tornar um risco para a sociedade ou para si por meio de análises funcionais das contingências em que essa pessoa se insere. Caso contrário, permaneceremos no campo especulativo, tateando um mar de possibilidades psicopatológicas e fornecendo explicações inconclusivas.
Lorena Fleury de Moura é Psicóloga Clínica, Especialista em Psicopatologia e Mestranda em Processos Clínicos pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
Imagem de capa: Shutterstock/sfam_photo
TEXTO ORIGINAL DE COMPORTE-SE
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