Prof. Dr. João Ricardo Cozac
Recebi o convite para participar do programa “Como será?”, na Rede Globo, apresentado pela jornalista Sandra Anennberg. A pauta será sobre o medo da vitória (dentro e fora do mundo esportivo) e as principais razões que transformam a ação de vencer num verdadeiro desafio de superação pessoal.
Há tempos, a literatura norte americana já demonstra essa reação emocional através da expressão “fear of success” (medo do sucesso). Para muitos, essa emoção ainda não é bem compreendida – uma vez que, o senso comum denota que “a ação de perder é geradora de medos e aflições”, certo? Errado!
O ônus gerado pela vitória tem sido muito mais pesado que o bônus por ela promovido. O caso do jogador argentino, Lionel Messi, é apenas mais um exemplo dessa dura equação vivida por diversos atletas. Após perder várias finais seguidas de importantes campeonatos – entre elas, a Copa do Mundo – Messi decidiu não atuar mais pela seleção de seu país. A mesma força social e midiática que o fez herói, agora clama por sua permanência na equipe argentina. Messi parece estar certo de sua decisão. E assim deve ser respeitado. Afinal, as massas estão sempre ávidas por representantes e heróis que possam satisfazer seus desejos e vaidades.
Não sei até que ponto as incontáveis mensagens que circularam nas redes sociais pedindo que Messi reveja sua decisão de abandonar a seleção argentina são, de fato, permeadas por um caráter de preocupação com o atleta – ser humano – ou (a hipótese para mim, mais provável) relacionadas com o contexto da perda de um grande astro dos gramados – o que tornará os jogos menos empolgantes. Ou seja: “como ficarei eu, sem o Messi dentro dos campos?”. Um movimento muito mais narcísico que altruísta.
Essa volúpia sociocultural misturada com temperos caóticos de ausência de referência familiar/afetiva e ainda associada ao inegável e perigoso convite pela construção de uma nova identidade (aqui chamamos de “status”), pode promover estados depressivos relacionados com o afastamento das bases mais genuínas (originais) sinalizadas pela representação (e expectativa) social da vitória e fama.
Essa ciranda de emoções que circula no universo social e cultural do esporte carrega elementos inconscientemente ameaçadores diante de um futuro incerto e provavelmente penoso para o indivíduo que será conhecido – e reconhecido – como vitorioso. Na maioria dos casos, o porto seguro das derrotas é mais convidativo e menos ameaçador que o mundo da fama e superação.
As armadilhas emocionais do homem moderno estão aí – dentro e fora do esporte. Os mecanismos de auto sabotagem se multiplicam para evitar essa metamorfose de status que a vitória pode promover. E nós, psicólogos do esporte, temos muito trabalho pela frente. Afinal, ajudar na compreensão de que “vencer é possível”, num mundo em que os heróis são condecorados na mesma medida em que são execrados não é tarefa das mais simples.
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