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O psicólogo e a morte, na clínica.

Será que os psicólogos conversam abertamente sobre a morte com seus pacientes? Seja quando a queixa principal é o sofrimento pela perda de um ente querido ou, simplesmente quando o assunto “aponta discretamente” na fala do paciente, o psicólogo abre espaço para que esse tema possa emergir e ser elaborado? Ou quando alguma questão sobre a morte aparece, bate-se na madeira três vezes para afugentar o azar? Afinal, a morte ainda é um tema tabu e, em muitos lugares ou situações, mal se pode pronunciar seu nome. Talvez, até na clínica de psicologia.

É compreensível que o psicólogo, enquanto sujeito que sente, sofre, se afeta e tem suas limitações, não precisa se forçar a trabalhar naquilo que não lhe agrada ou com o que percebe que não pode suportar emocionalmente. Por isso, pode escolher em qual área vai atuar, onde se sentirá mais à vontade para trabalhar, qual o trabalho em que mais tem afinidade, qual o tipo de sofrimento humano com o qual dá conta de lidar enquanto ofício. Mas quem escolhe a clínica, como sendo sua área de atuação, precisa saber que este é um espaço demasiadamente abrangente e, por mais que se limite o público a ser atendido, os conteúdos não assim tão delimitados.

O que não quer dizer que em outros campos de atuação, o psicólogo não lide com questões abrangentes, pois mais do que campo, ambiente, área, trata-se do cuidado humano e, mais comumente, do sofrimento humano. Não é só no hospital que o psicólogo se encontra com a morte; na clínica também! Não é à toa que se recomenda que o psicólogo clínico cerque-se de recursos para amparar sua atuação, como a psicoterapia pessoal, supervisão e estudos contínuos. Pois deve-se estar “munido” de amparo para lidar com o sofrimento que lhe diz respeito; o cuidado com a própria dor. E se tem algo que abala as estruturas e encontra o sofrimento humano mais profundo, é a morte; a perda de alguém muito amado ou a ameaça à própria existência. Pode ser devastador.

Visto que o psicólogo lida com o sofrimento humano, uma hora ou outra, a morte vai aparecer na clínica. E quando chegar essa hora, o psicólogo que não está “disposto” a trabalhar essa questão com seu paciente, que não tem recursos internos para trabalhar essa questão, entre outras coisas, pode deixar seu paciente desamparado. Pois a psicoterapia é, na maioria das vezes, o único espaço onde o sujeito pode expor suas fraquezas, seus medos, suas dores, suas preocupações, suas fantasias, seus pensamentos mais sombrios e suas feridas mais profundas. Sendo assim, se sua angústia de morte não for acolhida neste espaço, onde mais será? A sensação de abandono pode ser intensificada e o paciente pode passar a sentir que a psicoterapia não atende as suas necessidades. E se a necessidade no momento for trabalhar com uma dor relacionada à morte, ele pode ter razão.

Tocar a morte, junto com o paciente, carece de um esforço em aceitar que o mais sombrio e profundo que existe no paciente pode encontrar aquilo de mais temível e doloroso que existe no terapeuta. Mas este encontro pode ser o mais gratificante, belo e transformador, da relação deste par.

 

 

Bárbara Farias

Psicoterapeuta de orientação psicanalítica, possui especialização em Psicologia Hospitalar, com ênfase em Oncologia (FCM-UNICAMP) e é mestranda no programa ICHSA (FCA-UNICAMP), tendo a morte como tema de pesquisa. Administradora da página Por que você se foi? -Falando sobre a morte.

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