Desde que o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) foi incluído no Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) no final dos anos 1980, o número de diagnósticos tem crescido de forma expressiva. Pesquisas apontam que, entre 1997 e 2016, a prevalência global aumentou de 6,1% para 10,2%. Esse salto, segundo especialistas, não é apenas fruto de um crescimento real, mas também do aprimoramento no entendimento e diagnóstico do transtorno.
Novos critérios e conscientização ampliam diagnóstico
As mudanças na forma de identificar o TDAH tiveram um papel importante no aumento dos casos. A introdução do DSM-V em 2013 revisou critérios como a idade-limite para o início dos sintomas, que passou de seis para 12 anos. Segundo a neurologista Ana Chrystina de Souza Crippa, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), essa alteração permitiu que mais adultos pudessem buscar diagnóstico e tratamento, já que muitos não se recordavam claramente de eventos na infância precoce.
Além disso, especialistas começaram a observar como o TDAH se manifesta de formas distintas em diferentes grupos. Enquanto meninos tendem a demonstrar mais sintomas de hiperatividade e impulsividade, meninas frequentemente apresentam sinais de desatenção, o que fazia com que muitos casos passassem despercebidos. Estudos mostram que, na infância, meninos têm até cinco vezes mais chance de serem diagnosticados, mas essa desigualdade se reduz na fase adulta, quando mulheres começam a buscar mais atendimento especializado.
Visibilidade pública e impactos sociais
A conscientização em torno do TDAH também foi ampliada por figuras públicas. Em abril do ano passado, por exemplo, a cantora Lily Allen revelou seu diagnóstico, o que levou a um aumento nas buscas por “TDAH” no Google e trouxe ainda mais atenção ao tema nas redes sociais. No TikTok, vídeos com a hashtag #ADHD já foram vistos quase 36 bilhões de vezes.
Contudo, essa popularização trouxe preocupações. Medicamentos como a ritalina, e o Adderall (proibido no Brasil), têm sido usados indevidamente por estudantes e concurseiros para aumentar a concentração e a produtividade. Nos Estados Unidos, a alta demanda levou a uma crise de abastecimento de Adderall, com escassez por mais de seis meses.
Apesar dos casos de abuso, o psiquiatra Luis Augusto Rohde, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), destaca que o maior desafio é a subnotificação e a falta de acesso ao tratamento adequado. “Para cada pessoa que usa a medicação sem diagnóstico, há três que poderiam se beneficiar do tratamento, mas não o recebem”, afirma.
Diagnóstico e tratamento integrados
O TDAH, hoje entendido como um transtorno neurobiológico com base genética, requer uma abordagem multidimensional para diagnóstico. Além dos sintomas comportamentais, fatores sociais, familiares e escolares são levados em consideração. A alta taxa de comorbidade com outros transtornos, como ansiedade e depressão, também precisa ser observada. “É como se o TDAH fosse a febre, e a comorbidade, a causa subjacente”, explica Ana Chrystina.
O tratamento combina psicoterapia, apoio pedagógico e medicação. Entre adultos, treinos cognitivos – como o uso de aplicativos de celular para lembrar tarefas e horários – são recursos úteis. “Hoje temos uma rotina mais dinâmica e demandante, o que exige novas ferramentas para que essas pessoas lidem melhor com o transtorno”, destaca a neurologista.
Desafios para o futuro
O aumento dos diagnósticos de TDAH revela avanços no entendimento do transtorno, mas também traz novos desafios para a saúde pública e para a sociedade. No ambiente escolar, crianças com TDAH podem enfrentar dificuldades acadêmicas e de relacionamento. Em adultos, é comum a associação com o uso de substâncias, como álcool e drogas.
Especialistas reforçam que pais e indivíduos que identifiquem sintomas devem buscar ajuda profissional. A intervenção precoce e o suporte adequado são fundamentais para que o TDAH não se torne um obstáculo ao desenvolvimento pessoal e profissional.
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Fonte: Portal Drauzio Varella
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