Há tantas respostas para essa questão, quanto há tipos de pessoas na terra.
Mas é possível resumir essa variedade em um núcleo de aspectos que tem levado seus detentores a causar admiração: amor, saber, beleza, fortuna.
Em cada época, esses atributos se expressam de jeito diferente. Mas parece não haver dúvida: eles atraem admiração.
Na base da aceitação social há algum nível de admiração. Razão porque, de um modo ou de outro, cobiçamos o que pode nos tornar seres admiráveis.
Mas, não existe fórmula. Tornar-se alguém admirável exige trilhar um caminho. Porém, a vida é provisória, queremos muitas coisas e há obstáculos a transpor, então, queremos diminuir caminhos.
Talvez sejamos semelhantes à Lóri, personagem que no livro Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres’, de Clarice Lispector, deseja ardentemente ser amada e quer atalhos que a levem direto ao ponto certeiro.
No livro, a narradora diz sobre Lóri: ‘Não era à toa que ela entendia os que buscavam caminho. Como buscava arduamente o seu! E como buscava com sofreguidão o seu melhor modo de ser, o seu atalho.’
E é nessa busca que vamos vida afora. Uns mais perdidos. Outros mais orientados.
Mas, de um jeito ou de outro, o que nos marca como seres com histórias em comum é o desejo de ser aceito no clube de pessoas admiráveis ou, pelo menos, das não rejeitadas.
E eu diria que um bom atalho para ‘entrar no clube’ é observar pessoas admiráveis. Aproximar-se delas. Reconhecê-las com humildade e sem medo de parecer inferior.
E a receita é antiga. Na Idade Média os aprendizes “colavam” nos mestres de ofícios para aprenderem sua arte e até superá-los. Os alunos de Hipócrates, o pai das artes médicas, não desgrudavam do hábil professor. Os discípulos de Sócrates o rodeavam como andorinhas em volta do entardecer. E as jovens mulheres do Oriente observavam suas mães e avós na arte de seduzir e manter um esposo conforme os costumes. Já os jovens chineses acompanhavam os pais para se tornarem exímios plantadores de arroz.
A história é pródiga em exemplos de como a proximidade com pessoas admiráveis pode ser benéfica.
Mas se é assim, então, porque nos afastamos cada vez mais dessa receita milenar?
O individualismo, a ambição exagerada, a pressa e o afrouxamento dos valores têm nos castrado como seres que aprendem pela imitação. Estamos sempre em disputa, por algo concreto ou pelo simples prazer de competir. E isso parece ter virado hábito inevitável. Não que a competição seja ruim em si mesma. É que aprendemos um jeito de disputar que exclui o reconhecimento do outro. Esquecemos que a competição é apenas uma forma de sociabilidade, mas não a esgota.
Admirar, na sua origem etimológica, vem das partículas ad e mirar. Ad significa aproximação no tempo e no espaço. Mirar é originado de mires e quer dizer: digno de contemplação. Então, admirar é se aproximar do que é merecedor de ser visto e contemplá-lo para apreender seu valor.
Já a palavra inveja deriva do latim invidus significando inviso ou que não pode ser visto. Assim, a inveja é o sentimento de desgosto ou pesar pelo bem do outro que nos impede de enxergá-lo de forma plena.
A admiração é considerada um princípio da Filosofia. Os filósofos dizem que é impossível conhecer sem admirar. Os homens se interrogam somente sobre o que admiram.
Nesse sentido o invejoso é o contrário do filósofo. Ele é incapaz de contemplar a quem inveja. A presença do invejado dói. É duro demais para ele admitir que o outro: é mais; sabe mais; tem mais; ama mais ou é mais feliz. A saída que lhe resta é ‘cegar’, ou seja, afastar-se ou hostilizar o objeto de sua inveja.
A questão é que ao fugir do outro, ele se condena a não aprender com a sua presença. No medo de confrontar seu poder ao do invejado, ele esquece que pessoas invejáveis são também, em geral, pessoas admiráveis.
Perde de vista que pessoas admiráveis levam a atalhos que podem levar ao que se almeja. E assim, ele vai tateando no escuro por atalhos íngremes. Para o invejoso parece haver um elo direto entre o sucesso do outro e o fracasso dele próprio.
Um velho provérbio diz: ‘é mais fácil sentir piedade do coitadinho do que reconhecer o êxito do capaz’. É duro admitir, mas praticamos muito tal máxima. Esquecemos de que uma noite estrelada é mais bonita do que um céu de única e ofuscante estrela.
A inveja é um afeto inerente ao homem. Todos em um momento ou outro a sentem. Contudo, precisamos ficar vigilantes sobre como é vivenciada.
Você deve estar se questionando se esse texto é sobre admiração ou sobre inveja.
É que é quase impossível falar de seres admiráveis sem fazer referência ao sentimento de inveja que eles provocam.
Então, como lidar com esse afeto tão humano e com repercussões tão negativas?
Podemos aprender com o seu oposto: a admiração.
É possível adotar atitude de aproximação humana e fazer exercícios de admiração. Como?
Para ultrapassar a inveja e viver a admiração, há que se: não afastar de pessoas por preconceito; reconhecer; elogiar os méritos alheios; ter prazer em conviver com a diversidade; ter abertura de espírito para ultrapassar sentimentos hostis, que às vezes nos acometem por motivos banais; desenvolver o próprio potencial sem considerar o sucesso alheio uma ameaça; valorizar as diferenças.
Além dessas lições, podemos, outra vez, pedir emprestada a sabedoria instintiva de Clarice Lispector. Naquele livro, Lóri tem um insight que encerra a compreensão da interdependência humana.
E essa compreensão é a primeira e fundamental lição para quem quer viver sabiamente o sentimento da admiração. A conclusão de Lóri nos diz: ‘Sabia de uma coisa: quando estivesse mais pronta, passaria de si para os outros, o seu caminho era os outros. Quando pudesse sentir plenamente o outro estaria salva. E pensaria: eis o meu ponto de chegada.’
A lição de Lóri é uma perfeita tradução da aprendizagem que vem da admiração. Perceber o outro como fonte de amorosidade e saber. Este é um ‘passo certeiro’ para ser emocionalmente estimulante, renovador dos próprios afetos e dos que estão próximos.
Um grande passo para ser, enfim, alguém admirável.