Por Cristina Souza
‘O que estão fazendo? O que estão pensando? Todos nós vamos morrer, que circo! Só isso deveria fazer com que amássemos uns aos outros, mas não faz. Somos aterrorizados e esmagados pelas trivialidades, somos devorados por nada’. Esse trecho faz parte do livro ‘O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio’, do velho e desbocado Bukowski, com fragmentos de seu diário escritos entre 1991 e 1994. Mais de vinte anos se passaram e essas palavras continuam servindo para os dias atuais. Assim como muitas das músicas do Renato Russo. E do Cazuza. E do Raul. E de muitos outros nomes também.
A época é outra, mas as indagações permanecem – as dúvidas quanto ao amor, as dores da solidão, a banalização dos sentimentos, a supremacia da aparência, a perda de tempo com as trivialidades. Não, não é culpa da internet, do smartphone ou do tinder – embora eu acredite que essas ferramentas acabaram por amplificar e facilitar esse cenário – a culpa é nossa. O problema dessa agonia generalizada, dessa banalização dos sentimentos, desse circo todo é pura e exclusivamente nossa. As pessoas perderam o trato com as próximas, e não sei bem quando isso aconteceu, se foi na época de trocas de cartas ou quando eu mandava meu último whatsapp.
Já dizia Clarice: A vida não é de se brincar porque um belo dia se morre. E concordo com o velho Buk, se parássemos para pensar nisso, quem sabe podíamos amenizar um pouco dessa agonia toda? Todo momento de nosso dia é uma escolha, e como disse o Jô Soares em uma entrevista: Escolher é perder sempre. Mas cabe a nós decidirmos o que vale a pena perder, já que não temos todo o tempo do mundo. Que diabos, nem ao menos sabemos quanto tempo nos resta!
Se cada escolha significa uma renúncia, não está em tempo de pensarmos melhor sobre nossas perdas? Em pensar menos no volume, na quantidade, e mais na qualidade daquilo que estamos escolhendo? Vários colegas ou um bom amigo? Várias risadas forçadas em uma festa ou uma noite com risadas sinceras de doer a barriga? Muitas transas vazias ou poucas transas com possibilidades do aconchego do depois? Que tal menos ‘doer’ e mais ‘doar’?
Não estou dizendo que devemos deixar de fazer outras coisas triviais. Não devemos ser sérios sempre, nem filosóficos sempre, nem ser altruísta sempre – mas aprendi que a vida nos da dois caminhos de aprendizagem: o da dor e o do amor. E enquanto eu puder escolher, fico com o segundo, ainda que pareça que ele dói às vezes, o caminho do amor é sempre a melhor opção. E já que não temos escolha sobre a morte, que ao menos a gente possa escolher as possibilidades que deixam a vida mais leve. Daqui a gente não leva muita coisa mesmo.
TEXTO ORIGINALMENTE POSTADO EM OBVIOUS
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