Por Cristina Bisbal Delgado
Nestes tempos conturbados no mundo do trabalho, parece lógico pensar que, para manter o emprego, além de ser competente e eficaz é preciso administrar de maneira adequada nossas emoções, ou seja, ter um grande autocontrole. Pois bem, pessoas com altos níveis de autocontrole e responsabilidade pagam por isso no trabalho. É o que diz um estudo da Escola de Negócios Fuqua, da Universidade Duke (EUA).
Os autores exemplificam esta situação com um personagem típico, que chamaram de Jeanette: “Ela tem uma disciplina férrea, segue uma dieta balanceada, madruga para fazer esporte e não se esquece das pessoas queridas em datas especiais. Além disso, cumpre com suas responsabilidades familiares”.
Entretanto, “é provável que se queixe de que seus colegas têm expectativas exageradas sobre seu rendimento e procuram frequentemente sua ajuda, que seus superiores lhe atribuem mais carga de trabalho do que aos seus colegas na mesma posição, e que seu cônjuge espera que colabore mais em casa”. Não é difícil que alguém se sinta identificado com Jeanette.
“Pessoas com esta personalidade [perfeccionistas e autocontroladoras] dedicam mais tempo e esforço às tarefas encomendadas e a seguir bons padrões de conduta saudável. Seus colegas costumam achar que lhes custa menos fazer o trabalho, por isso acabam tendo a sensação de que seu sacrifício passa despercebido.
No final do dia, sentem-se cansados e insatisfeitos pelas demandas dos outros”, diz Margarita Mayo, professora da IE Business School, de Madri: “O tempo e o esforço dedicados a ajudar os outros faz falta para alcançar os próprios objetivos”.
Acontece no escritório, mas se reflete em casa
Mercedes Bermejo Boixareu, diretora da clínica Psicólogos Pozuelo, também de Madri, considera que a chave está na palavra excesso: “Uma boa gestão emocional, ou um autocontrole correto, não deveria ser prejudicial. Se nos excedemos, colocamos em risco nossa saúde psicológica e inclusive física.
Pessoas enormemente rígidas têm necessidade de controlar tudo, são muito perfeccionistas, têm um nível de autoexigência autodestrutiva ou se obcecam facilmente, podem se arriscar a possíveis patologias associadas à ansiedade, estresse e inclusive transtorno anancástico da personalidade, caracterizado por perfeccionismo, rigidez e preocupação excessivos, que interferem na vida cotidiana (segundo a Classificação Internacional de Doenças, CID)”.
“É importante que a pessoa que se sente assim evidencie os esforços adicionais que está fazendo, para que sejam reconhecidos. Se não, a situação o levará a se frustrar e se desmotivar progressivamente, podendo chegar a sofrer de ansiedade ou depressão”, aconselha Bermejo Boixareu. “Ser uma pessoa de confiança é exaustivo. É preciso conhecer seus limites, até onde é possível se esforçar sem esquecer outras áreas da sua vida (afetiva, familiar, social…)”, acrescenta. Para a especialista, o excesso de autoexigência, se não for freado a tempo, “pode derivar em problemas como o burnout (esgotamento por estresse), mobbing, ou assédio trabalhista, e inclusive a outras patologias associadas a transtornos de personalidade”.
Porque levamos para casa o que acontece no trabalho. “O excesso de responsabilidade pode afetar negativamente as relações emocionais. O papel que essas pessoas desempenham, de apoio para todos por causa da sua falta de queixas e absoluta eficácia, pode se institucionalizar, perdendo o valor. Isso prejudica as relações em longo prazo”. A psicóloga Bermejo Boixareu concorda: “Se estas pessoas com elevado autocontrole ajudam seus cônjuges ou amigos, convém que se sintam reconhecidos e agradecidos, como em qualquer outro âmbito.”
Segundo a Fundação Europeia para a Melhora das Condições de Vida e Trabalho, 28% dos trabalhadores europeus sofrem de algum tipo de estresse profissional. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) afirma que essa é uma doença perigosa para as economias industrializadas: prejudica a produção e afeta a saúde física e mental dos trabalhadores.
Relaxar sem exageros
Afinal, é aconselhável ser menos responsável no trabalho? Os especialistas dizem que não. Jesús Labrador, psicólogo e diretor do mestrado em Recursos Humanos da Universidade Pontifícia Comillas ICAI-ICADE, afirma que a chave está em conjugar o trabalho com outras atividades relaxantes ou que permitam o descontrole, inclusive no horário de trabalho. “Cada vez mais empresas promovem espaços lúdicos ou de relaxamento, embora o trabalho seja sempre uma atividade que acarreta responsabilidade”. Bermejo Boixareu recomenda “autorregular as habilidades profissionais e desenvolver outras competências emocionais, como motivação, autoconsciência, empatia e relações sociais”.
Entretanto, há quem defenda os altos níveis de autocontrole: “Um estudo do pai da psicologia positiva, Martin Seligman, mostra que pessoas com autodisciplina elevada alcançam um maior nível educacional e cultural e incrementam seu quociente intelectual”, conta Mayo. Para Labrador, “ter uma grande autoexigência é a base imprescindível para conseguir os feitos almejados, mas é preciso ter capacidade e talento para chegar à excelência. O equilíbrio entre esforço e resultado é crucial”.
TEXTO ORIGINAL DE EL PAÍS
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