Por Josie Conti
Victor Frankl (1905-1997) foi um psiquiatra austríaco que, durante a 2ª Guerra Mundial, esteve prisioneiro em Auschwitz. No período em que lá permaneceu, sob condições desumanas, também perdeu alguns dos membros mais importantes de sua família, entre eles, pais e esposa.
Nós, que vivemos nos campos de concentração, podemos lembrar de homens que andavam pelos alojamentos confortando a outros, dando o seu último pedaço de pão. Eles devem ter sido poucos em número, mas, ofereceram prova suficiente que tudo pode ser tirado do homem, menos uma coisa: a última das liberdades humanas – escolher sua atitude em qualquer circunstância, escolher o próprio caminho. (Victor Frankl)
Frankl entendeu, e mais tarde consolidou suas teorias dando forma a “Logoterapia”, que as pessoas que conseguiam identificar ou mesmo criar um sentido que justificasse as suas vidas independente das condições em que vivessem, eram aquelas que tinham a maior probabilidade de sobreviver.
O próprio Frankl tinha três razões para viver: sua fé, sua vocação e a esperança de reencontrar a esposa. Sua história pode ser encontrada no livro “Em busca de sentido”.
Nelson Mandela, um dos maiores líderes mundiais da história, esteve preso durante 27 anos após ter sido condenado, em 1967, por sua luta contra o Apartheid. Em seus anos de cárcere, relatou ter tido como uma de suas grandes fontes inspiradoras, o poema “Invictus”, de Willian Ernest Henley.
INVICTO*
William Ernest Henley
Da noite escura que me cobre,
Como uma cova de lado a lado,
Agradeço a todos os deuses
A minha alma invencível.
Nas garras ardis das circunstâncias,
Não titubeei e sequer chorei.
Sob os golpes do infortúnio
Minha cabeça sangra, ainda erguida.
Além deste vale de ira e lágrimas,
Assoma-se o horror das sombras,
E apesar dos anos ameaçadores,
Encontram-me sempre destemido.
Não importa quão estreita a passagem,
Quantas punições ainda sofrerei,
Sou o senhor do meu destino,
E o condutor da minha alma.
* Tradução: Thereza Christina Rocque da Motta
A teoria lacaniana também tem suas bases no sentido da vida, mas, que Lacan chamou “desejo”. Segundo ele, o homem, como ser desejante que é, sempre encontrará forças para continuar impulsionado pelo o que ainda não tem, pelo o que almeja, pela próxima etapa a conquistar. Uma vez conquistado um objetivo, ele logo será substituído por outro e o anterior deixará de ser figura central em sua vida.
Nas artes, o homem também encontra voz para seus desejos, e lá constrói sentidos o tempo todo, inventa, transborda em significados.
Chimamanda Adichie, escritora nigeriana, destacou-se em todo o mundo ao escrever e realizar palestras, alertando-nos para que sempre estivéssemos atentos às versões das histórias que nos são passadas. Ela fala tanto da necessidade de uma leitura pessoal de mundo, como da criação de novas interpretações.
O moçambicano Mia Couto é grande referência na literatura e na sua abordagem de causas sociais que o caracterizam como figura de destaque no cenário mundial, tanto na descrição que faz da realidade do povo africano, quanto em sua capacidade de nos emprestar as lentes necessárias para novas leituras de mundo, novas leituras da África, novos sentidos de mundo.
Não há como falar de comportamento humano sem pensar na arte, sem abordar os aspectos criativos que nos permitem a sublimação, a criação de algo novo a partir de um lugar, onde muitas vezes só há pó. Entretanto, artista consagrado ou sonhador inveterado, parece claro que a energia do homem precisa ser canalizada para algo que lhe forneça um sonho, lhe empreste um significado, um caminho, uma releitura, um objetivo. Formar-se na faculdade, sair da casa dos pais, pagar o aluguel do mês ou criar um poema original, sobreviver até a próxima sexta-feita, tanto faz. Os objetivos podem ser simples ou grandiosos, ter curto ou longo prazo para a possível realização.
Na psicoterapia, por exemplo, uma pessoa encontra maneiras para superar traumas do passado quando entende que uma mesma história pode ser compreendida de novas formas. Descobre maneiras de melhor se adaptar ao mundo, quando opta por caminhos diferentes para situações que sempre repetiam.
Do mais fútil desejo à luta pela sobrevivência em tempos de guerra, há que se ter motivos para continuar. Seja nas telas de um quadro, na interpretação da história da humanidade ou nas páginas de um livro, seja no amor ou na revolta, na busca de uma cura, na raiva ou até na vingança, o homem há que encontrar maneiras pessoais de seguir, de desejar e de dar sentido a si mesmo. Essa é a maior dádiva do homem. Essa é a maior sina do homem.
Artigo publicado originalmente em Conti outra.
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