Por Estêvão Reis
De uma hora para a outra ela volta.
Como uma visita indesejada, desarruma tudo de lugar, desorganiza os móveis e levanta a poeira. Você então perde o interesse em fazer coisas que antes eram divertidas, mas não faz ideia do porque isso está acontecendo. A depressão desestabiliza a mente, cega a visão e remove a perspectiva de novamente enxergar luz.
Tudo é tão escuro!
A esperança vai embora e desta vez (posso jurar) jamais voltará. A mente, novamente em reclusão, passa a criar histórias em uma tentativa de sobrevivência, cria roteiros e ensaia cenas de um futuro que na verdade jamais acontecerá. É a demissão, é a solteirisse como ponto final, a inexistência de amigos e a baixa auto-estima. Uma voz – que na verdade é o seu próprio pensamento – repete vez após vez: você não vale nada, ninguém te ama.
As emoções se tornam maiores que os fatos. Para o depressivo, aquela é a verdade. Ele acredita estar vivendo na maior completa realidade, mas são apenas percepções ilusórias.
Nada de bom cresce na escuridão. Nada! Mas tem algo que precisa desse tipo de ambiente: o pensamento de morte.
A imaginação – leia novamente, a imaginação – de que apenas um final definitivo pode te remover daquela areia movediça que te suga para baixo. Nada é pior do que se ver preso apenas com essa opção e que o seu único desejo é acabar com essa dor dilacerante. Mas ainda que a vontade de viver escorra pelas mãos, nossos amores e amados são motivos suficientes para caminhar mais um passo.
Ela tomou o seu tempo, exigiu de seu pensamento muito mais do que um músculo é exercitado em uma ginástica, sugou a sua energia e tempo e então, subitamente, vai embora. Tudo isso, luz-escuridão-luz, durou cerca de cinco minutos.
A pior parte de ter depressão é que você sabe o quão ridícula é a sua situação.
Você sabe que aquilo já aconteceu uma vez. Você pode tentar utilizar de artifícios para distrair a mente e espairecer um pouco mas, de alguma forma, você não enxerga uma saída. Feito um pequeno monstro de estimação ela vem frequentemente para se alimentar e quando está saciada volta a brincar.
Em momentos depressivos o mostro quer atenção integral e, como consequência, você se isola. Uma ideia se instala em sua mente de que não há ninguém com quem buscar ajuda; que você é o responsável por lidar com aquele monstrinho. A vergonha de – mais uma vez – estar naquele lugar te impede de gritar socorro. O telefone está ali, parado, e ainda assim não há forças para selecionar um contato e pedir ajuda.
Porém, feito uma bola de neve, cada vez que ela volta parece pior, o animal precisa de mais alimento e sua alma vai se deteriorando. E então uma contestação: o silêncio piorou a situação.
Entenda, o humor do ser humano muda de acordo com a fase em que está vivendo. Em um mesmo dia é possível sentir um espectro de emoções que varia de alegria à dor, do medo ao fracasso. Mas, na depressão, não importa o que está acontecendo do lado de fora, por dentro é que está desregulado. Depressão não é a dor que sentimos quando um parente morre, quando um amor se desfaz ou quando seus planos falham. A depressão é a tristeza sem razão para tal. É muita tristeza por tudo que acontece (e as vezes sem motivo).
Todos temos as nossas lutas e precisamos aprender a lidar com elas. O que um depressivo precisa aprender é a tratar aquilo como uma visitante, não como uma hospede. Ela não faz e não deve fazer parte de seu cotidiano. Não é algo para se domesticar, portanto, “não alimente os animais”. Deixe-o morrer de fome.
Será preciso intervenção química, psicológica e espiritual.
Para matar o monstrinho de fome, você é que precisa se alimentar. Você precisa consumir cultura, entretenimento, alegria e muito, muito auto-conhecimento. A depressão fez com que eu conhecesse o ser que habitava dentro de mim.
Você vai precisar cultivar amizades, aprender que outras pessoas podem caminhar ao seu lado e que o monstrinho não deve possuir toda a sua atenção. Cultive fé. Deixe crescer perseverança e bom-ânimo.
Pode parecer piegas, mas é exatamente uma atitude positiva com a vida que pode te tirar desse poço aparentemente sem fim. E é claro, para começar esse processo uma coisa é essencial: assumir a depressão.
Afastá-la e fingir que nada está acontecendo só a fortalecerá.
Não sinta vergonha de encarar isso. Não há problema algum em assumir a depressão. Não foi culpa sua, ela é uma invasora e entenda que sim, é uma doença – que já foi diagnosticada, que atinge muitas outra pessoas e que já possui tratamento. Você provavelmente precisará de ajuda e alguém com quem conversar – que te entenda, que seja solidário, que abra o coração sem preconceito para te ouvir e que abrace sua mão para buscar um tratamento adequado. E está tudo bem. De verdade.
E quanto aos remédios, o que é que tem? Não é um tratamento que visa trazer a felicidade mas sim tornar a tristeza suportável para que você possa então perceber os pontos positivos de sua vida. E acredite em mim quando eu digo que eles existem. Faça uma forcinha para percebe-los.
Mas lembre-se: ela é uma visitante, não uma moradora. Por mais bagunça que possa fazer, por mais que atrapalhe a sua intimidade e te prive de fazer algumas coisas, ela um dia irá embora e você novamente irá sorrir e, quando voltar, pare e reflita com bravura: o que eu posso aprender com essa crise? É uma honra aprender, crescer e amadurecer dessa forma.
TEXTO ORIGINAL DE OBVIOUS
Imagem da capa: Shutterstock/Lopolo
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