Por Raquel Baldo
Trago aqui um olhar reflexivo sobre esta questão: a importância do cuidado na saúde e estrutura mental e emocional das crianças. Vale pensar que esse assunto, tão estudado no Brasil é, na realidade, muito pouco efetivado e utilizado como condição de um desenvolvimento.
Facilmente encontramos pesquisas, estudos, profissionais de diferentes áreas e até políticos ressaltando e reafirmando tamanha necessidade de cuidado com as crianças e a estrutura do meio em que se desenvolvem e crescem, mas quase não encontramos nada além de teorias e expectativas.
Parece que, em nosso País, muito se sonha e espera para nossas crianças, mas muito pouco se faz para tal futuro.
E, se pensarmos bem, a partir dessa análise, podemos entender com até certa facilidade a condição emocional atual que vivemos no Brasil, onde somos todos resultados de sonhos, teorias e crenças (a fé brasileira) e hoje arcamos brutalmente com a falta de estrutura do meio e também a nossa, muitas vezes, para poder continuar construindo e vivendo adequadamente.
Hoje temos pouquíssimas condições e atitudes para formar uma estrutura saudável de crianças. Isso é para poucos, e mesmo estes poucos não estão sabendo o que fazer: pecam pelo excesso, pela pressão, pela ausência afetiva. Somos todos resultados de uma sociedade sem estrutura saudável. Então, como não esperar sintomas, transtornos e uma diversidade de diagnósticos fisiológicos e psíquicos, principalmente nas crianças?
O termo “saúde mental” ainda é polêmico quanto a sua definição, e falta acordo entre as diferentes áreas (psicologia e psicanálise) sobre seu real conceito. Há quem o entenda somente por ordem biológica, limitando-o a diagnósticos clínicos.
Não tenho aqui o objetivo de questionar, mas de provocar um pensamento a respeito do termo, para que possamos considerar a saúde mental por uma via mais ampla e acrescentar a ela a ordem estrutural e emocional da criança como ponto relevante e necessário.
Há um caminho pela psicanálise que aborda e entende a saúde e estrutura da criança como resultado direto de sua relação com o meio, desde seu nascimento. Partindo do ponto que a relação com sua mãe é o primeiro contato estrutural para se formar, é desta relação que sentimos nossas primeiras experiências sobre o existir.
Através do olhar, do toque, do acalento, do colo, do mamar ou mesmo da falta de cuidados (no excesso ou ausência deles), formamos estruturas primitivas sobre nosso EU que carregaremos por toda a vida e irão ditar nossos sintomas e atitudes pela frente.
O pai, a família, a escola e os amigos também fazem parte deste meio estrutural, apesar de surgirem mais adiante, e são de muita importância. Deles surge a possibilidade de a criança continuar crescendo e construindo além de sua mãe.
Logo, podemos pensar e entender que a falta de um ambiente saudável e estruturado pode adoecer uma criança psíquica e fisiologicamente, como reflexo do meio em que se vive.
Uma criança ansiosa, deprimida, agressiva, compulsiva, reprimida, lenta, cheia de manias nada mais é do que o reflexo direto do ambiente em que ela vive e que aparece em forma de sintoma. Mas o que seria um ambiente ou meio saudável para uma criança?
Podemos entender e partir do ponto de que o saudável não é uma regra ou atitude técnica. Não há receita, é preciso somente o suficiente. E como saber o que é o “suficiente”?
É preciso olhar para a criança e entender suas necessidades particulares, é preciso conseguir ultrapassar os desejos e expectativas egoístas que o meio cria em torno da criança e enxergá-la e ouvi-la para saber se está tendo a chance de ser ela mesma enquanto é acolhida, compreendida, auxiliada e estimulada.
Um ambiente saudável requer pais saudáveis, escola saudável e política saudável, isto é, um meio que ensine a criança a existir, mas sem impor verdades únicas, regras técnicas e institucionalizadas. É preciso um meio que olhe pra ela, sem teorias, e a entenda, a convide a existir e a construir junto a todos, mostrando através de possibilidades que ela é capaz.
Até meados do século 19, as crianças não existiam, eram entendidas apenas como mini-adultos e exigidas como tal, ou seja, a fase infância não era considerada, logo não era cuidada especificamente e sua saúde biológica e psíquica era entregue a sorte.
Nos tempos atuais muita coisa mudou com o ressurgimento da infância, e há uma preocupação com a existência, o tempo e manejo desta fase infantil. Porém deixo aqui aberto um pensamento a todos vocês, antes de finalizar:
Vamos partir do ponto que, para criar crianças saudáveis é preciso olhar para elas, estar com elas e ajudá-las a existir e que ao mesmo tempo em nosso País, nossas crianças são resultados de teorias e sonhos, muita fala, muito estudo e boa intenção, mas pouca atitude efetiva. Será mesmo que a saúde e estrutura emocional de nossas crianças não continua sendo entregue à sorte? Não continua perdida?
Vale pensar na criança que fomos, na criança que somos e na criança que desejamos.
TEXTO ORIGINAL DE BRASIL POST
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