Recentemente, uma mãe sul-coreana, identificada como “Jin Young-hae” para preservar seu anonimato, compartilhou com a BBC uma decisão intrigante: vestir um macacão azul e passar horas confinada em uma cela minúscula, semelhante a um armário, sem companhia, celular ou computador. Este ato, por mais estranho que pareça, é parte de um esforço mais amplo de pais como Jin para entender e ajudar seus filhos que se isolaram do mundo, um fenômeno conhecido como hikikomori.
Jin não está sozinha em sua escolha. Outros pais sul-coreanos também se voluntariaram para experiências de confinamento, buscando entender melhor seus filhos adolescentes e jovens adultos que se afastaram da sociedade. Estes pais, cujos filhos variam entre a adolescência e os trinta anos, participam de um programa especial que os mantém confinados por curtos períodos em celas de isolamento.
O caso de Jin é emblemático: mãe de um jovem de 24 anos que vive recluso em seu quarto, negligenciando sua higiene e alimentação. Outro caso é o de Park Han1-sil, uma mãe de um jovem de 26 anos que, há sete anos, cortou toda comunicação com a sociedade, raramente saindo do quarto e recusando-se a tomar seus medicamentos.
As experiências de confinamento voluntário de Jin e Park foram realizadas na Fábrica da Felicidade, onde os participantes se isolam em salas que reproduzem celas de prisão. Vestindo uniformes e deixando para trás celulares e computadores, eles passam dias sozinhos, com o objetivo de entender melhor os sentimentos de seus filhos e melhorar a comunicação com eles.
Desde abril, outros pais também têm participado de um programa de educação especial de 13 semanas, financiado por organizações como a Korea Youth Foundation e o Blue Whale Recovery Center. Este programa inclui um período de três dias em celas de isolamento na província de Gangwon. Os pais se inscrevem voluntariamente, muitas vezes motivados pelo desespero de encontrar maneiras de ajudar seus filhos a saírem do isolamento. Durante esses dias, os participantes têm a oportunidade de refletir sobre suas próprias vidas e a maneira como interagem com seus filhos, muitas vezes levando a insights profundos e mudanças na abordagem familiar.
Hikikomori, um termo japonês que descreve jovens que se isolam quase completamente, é um fenômeno preocupante na Coreia do Sul. De acordo com uma pesquisa do Ministério da Saúde e Bem-Estar do país, mais de 5% dos jovens entre 19 e 34 anos vivem em isolamento. Isso representa cerca de 540 mil pessoas em todo o país.
Os motivos para esse isolamento variam: 24,1% dos jovens se isolam devido a dificuldades em encontrar trabalho, 23,5% por problemas de relacionamento e 24,8% por questões familiares ou de saúde. A sociedade altamente competitiva da Coreia do Sul, com uma forte pressão para sucesso acadêmico e profissional, também contribui para o fenômeno. Desde cedo, as crianças são incentivadas a obter excelentes resultados acadêmicos e ingressar em universidades prestigiosas, o que pode levar a um esgotamento psicológico e, em alguns casos, ao isolamento total.
O hikikomori tem gerado preocupação além das famílias. Em 2023, o governo sul-coreano lançou uma campanha para incentivar os jovens isolados a saírem de casa e se reintegrarem à sociedade, oferecendo pagamentos de 450 reais para jovens até 24 anos. Esta medida visa aliviar a carga financeira e proporcionar um incentivo para que esses jovens busquem ajuda e recomeço.
Além dos pais hikikomori, outros sul-coreanos também buscam o confinamento voluntário como uma pausa da rotina intensa. Em 2018, Suk-won Kang, um engenheiro de Seul, pagou US$ 578 para passar sete dias na Prison Inside Me, um centro de confinamento em Hongcheon, onde viveu uma experiência de isolamento junto com outros 13 participantes. Durante sua estada, ele vestiu um uniforme e ficou em uma cela de cinco metros quadrados, aproveitando a oportunidade para refletir sobre sua vida longe das pressões diárias do trabalho e da vida urbana.
Estas iniciativas mostram um esforço crescente para entender e abordar o fenômeno do hikikomori, buscando soluções que possam ajudar jovens e suas famílias a encontrar caminhos de reintegração social e bem-estar psicológico. A experiência de confinamento voluntário oferece aos pais uma perspectiva única e, muitas vezes, necessária para compreender os desafios enfrentados por seus filhos, promovendo uma mudança de atitudes e abrindo caminhos para uma comunicação mais eficaz e empática dentro das famílias.
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