Por Kristin Neff.
Já se tornou quase banal em nossa cultura o fato de que precisamos ter autoestima para sermos felizes e saudáveis. Psicólogos têm conduzido centenas de estudos divulgando os benefícios da autoestima. Os professores são incentivados a dar estrelas de ouro a todos os alunos para que cada um possa se sentir orgulhoso e especial. Somos instruídos a pensar positivamente sobre nós mesmos a todo o custo, como no livro de afirmações positivas de Stuart Smalleys: “Eu sou bom o suficiente, esperto o suficiente e, caramba, as pessoas gostam de mim!” Mas como a pesquisa está começando a demonstrar agora, a necessidade de continuamente nos avaliarmos de forma positiva tem um preço alto.
O principal problema é que para se ter uma autoestima elevada é preciso sentir-se especial e acima da média. Ser chamado de “mediano” é considerado um insulto em nossa cultura. (O que achou do meu desempenho ontem à noite? Foi mediano. Opa!) Claro, obviamente é impossível que cada ser humano no planeta seja acima da média, ao mesmo tempo. Então, desenvolvemos o que é conhecido como um “viés de auto-aprimoramento”, que se refere à tendência de nos acharmos superiores aos outros em uma variedade de dimensões. Estudos têm mostrado que a maioria das pessoas se acha mais simpática, mais popular, mais engraçada, mais agradável, mais confiável, mais sábia e mais inteligente do que os outros. Ironicamente, a maioria das pessoas também acha que está acima da média na capacidade de se ver objetivamente! O resultado de se usar esses óculos cor-de-rosa não é tão bonito.
Essa necessidade de se sentir superior resulta em um processo de comparação social, no qual continuamente tentamos nos sobressair e desvalorizar os outros (pense no filme Meninas Malvadas e você vai entender o que eu estou falando). As pessoas que praticam bullying geralmente têm uma autoestima elevada, por exemplo, já que implicar com pessoas mais fracas é uma maneira fácil de aumentar a autoestima.
Uma das consequências mais insidiosas do movimento da autoestima nas últimas décadas é a epidemia de narcisismo. Jean Twenge, autora de “Generation Me” (Geração Eu), analisou os níveis de narcisismo de mais de 15.000 universitários dos Estados Unidos, entre 1987 e 2006. Durante esse período de 20 anos, o nível de narcisismo foi às alturas, com 65 por cento dos estudantes de hoje superando as gerações anteriores em narcisismo. Não coincidentemente, a média dos níveis de autoestima dos estudantes aumentou em uma proporção ainda maior no mesmo período.
Ao mesmo tempo em que tentamos nos ver como melhores do que os outros, tendemos também a nos “estripar”com autocrítica, quando não alcançamos altos padrões. Logo que nossos sentimentos de superioridade escorregam– como inevitavelmente acontece– nosso senso de dignidade cai vertiginosamente. Nós balançamos descontroladamente entre autoestima excessivamente inflada e excessivamente esmorecida, uma montanha russa emocional, cujo resultado final é, muitas vezes, insegurança, ansiedade e depressão.
Então, qual é a alternativa? Que tal nos sentirmos bem com nós mesmos, sem a necessidade de sermos melhores do que outros, caindo assim na armadilha do narcisismo/ auto-reprovação? Uma resposta seria desenvolver a autocompaixão.
Autocompaixão envolve sermos gentis com nós mesmos, quando a vida dá errado ou notamos algo sobre nós que não gostamos, em vez de sermos frios ou severamente autocríticos. Ela reconhece que a condição humana é imperfeita, assim, nos sentimos conectados aos outros quando falhamos ou sofremos, em vez de nos sentirmos separados ou isolados. Envolve também a conscientização– o reconhecimento e a aceitação imparcial das emoções dolorosas ao passo que surgem no momento atual. Ao invés de suprimir nossa dor, ou então torná-la um drama pessoal exagerado, vemos a nós mesmos e a nossa situação claramente.
Autocompaixão não exige que nos avaliemos positivamente ou que nos vejamos como melhores do que outros. Pelo contrário, as emoções positivas da autocompaixão surgem exatamente quando a autoestima cai; Quando não atendemos a nossas expectativas ou falhamos de alguma forma. Isto significa que o senso de autovalorização intrínseco inerente à autocompaixão é altamente estável. Está constantemente disponível para nos fornecer cuidados e apoio em momentos de necessidade. Minha pesquisa e a dos meus colegas tem mostrado que a autocompaixão oferece os mesmos benefícios que a autoestima elevada, tais como menos ansiedade e depressão e maior felicidade. No entanto, não está associada com as desvantagens da autoestima como narcisismo, comparação social ou defesa do ego.
Ao invés de perseguir eternamente a autoestima como se fosse o pote de ouro no fim do arco-íris, portanto, eu diria que se deve encorajar o desenvolvimento de autocompaixão. Dessa forma, se estivermos no topo do mundo ou no fundo do poço, podemos nos envolver com um sentido uma bondade, conectividade e equilíbrio emocional. Nós podemos fornecer a segurança emocional necessária para vermos a nós mesmos com clareza e nos certificarmos de fazer as mudanças necessárias para resolver nosso sofrimento. Podemos aprender a nos sentir bem, não porque somos especiais e acima da média, mas porque somos seres humanos intrinsecamente dignos de respeito.
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