Pequenas coisas que dizem muito, vejamos:
“Beijos, até amanhã.”
“Estou com saudades, não vejo a hora de te ver.”
“Sabe aquele barzinho? Podíamos ir qualquer dia desses.”
“Nossa, cozinho muito bem, o dia que provar você vai ver.”
“Estava pensando que poderíamos fazer aquela viagem juntos, que acha?”
O que você leu aqui? Para muitas pessoas, essas frases não parecem nada demais. Tão normais e corriqueiras, fazem parte do dia a dia das promessas veladas que fazemos e nunca cumprimos. Acontece que quando as proferimos, não temos ideia de que para quem as ouvem a história não seja bem assim.
Quando acordamos pela manhã, o que normalmente fazemos é visualizar mentalmente as coisas que esperamos que aconteçam durante o dia. Algumas coisas são bem óbvias que irão acontecer, outras só ficam na nossa vontade mesmo. Principalmente aquelas que dependerem do outro maluco que não tem ideia, talvez, das promessas que fez, até porque não percebe que ao falar a fizeram compulsoriamente.
Fico pensando como é o nosso mundo das expectativas. Vivemos o tempo todo, muitas vezes, em função delas e não nos damos conta de que nossa apatia e tristeza provem justamente da nossa falta de capacidade de lidar com as frustrações sobre nossas próprias expectativas.
Desculpe minha pretensão, mas para mim a expectativa deveria entrar para lista dos processos psicológicos básicos. É certo que a expectativa está associada aos demais processos psicológicos – sensação, percepção, atenção, memória, pensamento, linguagem, motivação, aprendizagem – em especial a percepção – processo na qual nos torna consciente a forma como enxergamos o mundo e as coisas. Mas na prática ela se mostra totalmente distinta em sua função.
Mas qual a função da expectativa? Deixar-nos loucos, talvez (risos). O dicionário diz que expectativa é a situação de quem espera a ocorrência de algo, ou sua probabilidade de ocorrência, em determinado momento. Resumindo, expectativas são as historinhas (novelinhas) que criamos na nossa cabeça acerca de coisas que podem ou não acontecer, mas que quase nunca envolvem somente nós mesmos.
A culpa é somente nossa de criarmos expectativas? A culpa nunca fica de fora né?! Basta alguma coisa dar errado que logo precisamos encontrar alguém para por a culpa. Acontece que, neste caso, existem muitos culpados ou nenhum. Todos vítimas de um sistema de funcionamento quanto a relacionamentos incutido em nós, que mal nos damos conta que o fazemos.
Vamos voltar às frases lá em cima?! Quantas vezes você já disse frases como aquelas ou parecidas a alguém, muitas vezes sem o menor interesse de cumpri-las? Talvez, na hora tivesse até o desejo de cumprir, mas sei lá, outras coisas aconteceram e não deu. Mas parece tão pouco né, para que se preocupar?
Mas agora vamos inverter. Quantas vezes você já ouviu alguma daquelas frases ou parecidas de alguém, ficou ansioso, na expectativa de que alguma coisa iria acontecer e nada? É ruim né, eu sei. Mas não parecia tão ruim assim quando fizemos e não cumprimos.
Acontece que tudo depende da pessoa que faz as promessas veladas e do que esperamos dela. De certo, muitas vezes fazemos isso ou outras pessoas fazem isso conosco e nem percebemos, pois não criamos expectativa nenhuma em relação a elas. Por isso, culpo a forma como aprendemos a nos relacionar e que nunca paramos para pensar sobre. Quando fazemos promessas veladas, na maioria das vezes, não percebemos que estamos fazendo e isso então se torna comum fazer. Só vamos nos dar conta quando nossos sentimentos estiverem envolvidos.
Certa vez estava conhecendo uma pessoa, e ela sempre soltava frases como essas “no dia que conhecer minha mãe, vai ver como ela é gente boa, vocês vão se dar bem!” Pensava eu: Vou conhecer a mãe dele, logo, ele também está gostando de mim. Mas, de repente, paramos de nos falar e essas pequenas promessas nunca se concretizaram.
Na época fiquei sem entender o que tinha acontecido. Pensava: se ele não tinha interesse em continuar, por que dizia aquelas coisas? Mas depois de um tempo comecei a refletir se eu não tinha enxergado coisas onde nada havia. Pensava se eu não tinha me apegado demais a essas promessas veladas e criado expectativas devido ao sentimento que nutria por ele, por isso, precisava de alguma forma confirmar/acreditar que era recíproco o sentimento.
Enfim, tudo isso me serviu para refletir sobre a forma como eu me apegava, e comecei a perceber que isso é mais comum do que imaginava. Assim, minha forma de me relacionar com os outros mudou; hoje faço menos promessas, tomo bastante cuidado com o que digo para não me comprometer com algo que não posso cumprir. Entretanto, ainda me pego analisando as entrelinhas quando me fazem essas promessas.
E você, já parou para pensar em tudo isso? Anda colocando sentimentos demais nas promessas que recebe ou anda fazendo promessas demais sem perceber? Quanto de expectativas tem colocado em pequenas coisas ou em coisas que não depende de você? Viver sem criar expectativas é impossível, faz parte de nós e precisamos delas para nos impulsionar em muitas coisas. No entanto, é importante sairmos do automático e analisarmos se nossos sentimentos não estão comprometendo nossa capacidade de sermos coerentes com nossas expectativas e promessas.