Por Manoel Brandão Neto

Em 2015, a psicologia brasileira completou 53 anos de atividades. Desde então, tem buscado acúmulo e buscas sistemáticas de pesquisas, análise de estudos, embasamento teórico e científico nas diversas esferas da psicologia quanto tupiniquim. Entretanto, as cinco décadas de estudos e de transformações propostas pela ciência da saúde mental e bem-estar está longe de ciência acabada e finalizada, uma vez que a sociedade se transforma e assim, as demandas e novos (ou já existentes) grupos, necessitam de um olhar profundo quanto às suas demandas psicossociais.

A psicologia brasileira, assim como em todo o mundo, tem se apropriado das clássicas teorias que fundamentaram a ciência – das teorias psicanalíticas de origem europeia aos entendimentos da psique humana numa visão estadunidense – Isto traz algumas dificuldades, pois muitas vezes busca-se encaixilhar a realidade brasileira em tais padrões na falta de outros referenciais mais adequados. Na direção oposta tem sido, por exemplo, a diligência da ULAPSI (União Latino-Americana das Entidades de Psicologia) em promover o desenvolvimento de uma Psicologia produzida na América Latina, com base nas características das populações de nossa região, pincipalmente seus povos, costumes, culturas, língua original e expressões, sejam elas dogmáticas como comportamentais.

Segundo Vitale & Grubits (2009) apud Ribeiro (1982), o termo “índio” institui um termo imprescindível para o abalançamento da população indígena atual, distante de suas características originais e dos termos estereotipados pelos quais são geralmente descritas.

Ribeiro (1982, p.254) define como “todo indivíduo reconhecido como membro por uma comunidade de origem pré-colombiana que se identifica como etnicamente diversa da nacional e é considerada indígena pela população brasileira com que está em contato“.

Uma das principais características destas regiões são os costumes, dialetos, gastronomia, cultura, dogmas, comportamentos que tem origem muito antes da chegada dos europeus, que durante o período de colonização, “varreram” a América Latina impondo seus costumes, ritos, idioma, descaracterizando e até dizimando povos locais, não diferente no Brasil. A herança de costumes nessas regiões são muito fortes. No Amazonas, a cidade de São Gabriel da Cachoeira (847 quilômetros de Manaus), teve a lei 145/2002 oficializada, decretando os dialetos tukano, baniwa e nheengatu como línguas oficiais ao lado do português.

Para entendermos a história secular e árdua das tribos indígenas brasileiras, citamos dois fatos vinculados na mídia no que diz respeito à perseguições, massacres, povos extintos e a descaracterização indígena, mesmo eles sendo os primeiros habitantes do Brasil – e é uma história de carnificina tão antiga que ultrapassa as barreiras da história brasileira como nação.

O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) publicou em 2015 uma pesquisa liderada por Charles Clement no que diz respeito à povoação da Amazônia. Segundo a pesquisa, a região amazônica em 1492 chegou a ter imensas cidades povoadas por oito milhões de pessoas, ultrapassando os 50 milhões em toda a área, as quais sofreram processo de despovoamento com doenças, pestilências e a chegada dos europeus.

Outro fato vindo após a Comissão Nacional da Verdade, o livro “A Ditadura Militar e o Genocídio do Povo Waimiri-Atroari”, do autor Egydio Schwade (membro do Conselho Indigenista Missionário – CIMI), relata a perseguição e a matança promovido pela Ditadura Militar com o extermínio de dois mil índios Waimiri-Atroari entre os anos de 1972 a 1977, durante a abertura da BR-174, que liga Manaus a Boa Vista.

Vitale & Grabits (2009, p.30) salientam também a construção da psicologia nestes novos olhares e entendimentos, onde, em pesquisa sobre o tema, reflete a aparição de termos como “Psicologia Étnica, Etnopsicologia, Psicologia Nativa e, o mais interessante, Psicologia Indígena. Será que estamos a caminho da construção de uma Psicologia Indígena? Ou em uma psicologia para os indígenas? Será que podemos pensar na consolidação de tal termo? E no que ele implicaria?”

É muito importante o olhar psicológico para este grupo da sociedade. Nos livros de história, seja na região norte ou no sul do Brasil, sempre vemos resistência, derramamento de sangue e lutas destes grupos. Povos as quais se apropriaram de suas terras há séculos, e assim viveram cuidando da mata, animais, em geral, de nossa flora e fauna. A cultura indígena emprestada para a cultura nacional ajudou a construir a identidade brasileira – vemos forte influência na nossa culinária, costumes, crenças, comportamentos, sem esquecer-se das palavras originárias do tupi-guarani, compondo a nova língua portuguesa.

Segundo o Portal Brasil, o IBGE no censo de 2010 informou que o Brasil tinha uma população indígena de 896,9 mil. De acordo com a pesquisa, foram identificadas 305 etnias, das quais a maior é a Tikúna, com 6,8% da população indígena. Também foram reconhecidas 274 línguas. Dos indígenas com 5 anos ou mais de idade, 37,4% falavam uma língua indígena e 76,9% falavam português. Os Povos Indígenas estão presentes nas cinco regiões do Brasil, sendo que a região Norte é aquela que concentra o maior número de indivíduos, 342,8 mil, e o menor no Sul, 78,8 mil. Do total de indígenas no País, 502.783 vivem na zona rural e 315.180 habitam as zonas urbanas brasileiras.

Novas demandas aparecem, assim como, o entendimento dos grupos indígenas – muito se questiona os dogmas de seus povos – da passagem pelo ritual da tucandeira (menino quando se torna adulto) ao infanticídio (quando uma criança nasce com alguma doença genética e o índio entende que a mesma deve ser morta por se tratar de um “defeito”). Pelo menos 13 etnias indígenas no Brasil cometem o infanticídio e é mais comum que imaginamos – tradição bem antiga, antes mesmo da chegada dos brancos. E qual é o olhar da psicologia para esta questão? Direito à cultura, saúde ou à vida?

Assim, entendemos a suma importância da psicologia entre os índios – a tratativa de promoção por saúde mental, ações psicossociais sem descaracterizar raízes, interlinks entre sociedade, justiça, cultura, ciência e balanceamento nas equipes multidisciplinares, da sociologia, antropologia, medicina, serviço social, dentre outros saberes.

BIBLIOGRAFIA

G1 e informações da Agência Brasil: http://g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,AA1346303-5598,00-MUNICIPIO+DO+AMAZONAS+OFICIALIZA+LINGUAS+INDIGENAS.html. Última visita: 30/01/2016.

IAN Johnston, Independent, site O Globo, matéria do dia 24/07/2015. Endereço eletrônico: http://oglobo.globo.com/sociedade/ciencia/amazonia-teve-cidades-com-ate-8-milhoes-de-habitantes-16932562. Última visita: 31/01/2016.

Portal Brasil – site do Governo Federal. http://www.brasil.gov.br/governo/2015/04/populacao-indigena-no-brasil-e-de-896-9-mil. Última visita: 02/02/2016

RIBEIRO, D. (1982). Os Índios e a Civilização: a integração das populações indígenas no Brasil moderno. Petrópolis: Vozes.

SCHWADE, Egydio. (2014). A ditadura militar e o genocídio do povo Waimiri-Atroari. Comitê Estadual de Direito à Verdade, à Memória e à Justiça do Amazonas; Boa Vista/RR, Editora Curt Nimuendajú.

VITALE, M.P; GRUBITS, S. (2009). Psicologia e povos indígenas: um estudo preliminar do “Estado da Arte”. Campo Grande/MS. Revista Psicologia e Saúde. Programa de Mestrado em Psicologia, UCDB.

Manoel Brandão Neto

Especialista em Psicologia Hospitalar e da Saúde Mestrando em psicologia da saúde (Universidade Federal do Amazonas)

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