A psicologia por trás do nosso vício no Tetris

Por Jaime Rubio Hancock

Fomos muitos os que sofremos com o chamado efeito Tetris. Jogávamos tanto que imaginávamos as pecinhas ao fechar os olhos tentando dormir. Adam Alter menciona essa ilusão, que não é exclusiva desse game, em seu livro Irresistible (Irresistível), explicando como a tecnologia aproveita nossas fraquezas para captar nossa atenção durante o maior tempo possível. Professor de psicologia e marketing da Universidade de Nova York, Alter fala na obra sobre Instagram, Facebook, lojas on-line e World of Warcraft, mas também dedica algumas páginas ao Tetris.
Por que esse jogo aparentemente tão simples é tão viciante? Por que talvez você esteja pensando em procurar uma versão on-line para jogar uma partida, embora tenha mais de 30 anos? Por que tenho quase certeza de que você está pensando na musiquinha do game?

1. É fácil de aprender. A mecânica do jogo é simples, e logo entendemos que devemos girar as peças para completar as linhas. Não há personagens complexos, combinações estranhas de botões nem adivinhações impossíveis de resolver. Só há tijolinhos de diferentes formas. Você aprende jogando, sem precisar ler as instruções. Isso também acontece com outros games, como os do Mario, também mencionado por Alter.

2. O jogo evolui com você. O Tetris é muito fácil no início, mas fica mais difícil à medida que avançamos. As peças caem cada vez mais rápido e temos menos tempo de reagir. Ou seja, o jogo continua sendo divertido inclusive quando o dominamos. Que o diga o seu criador, Alexey Pajitnov. Em 1984, ele trabalhava na Academia de Ciência da Rússia, em Moscou, onde tinha tempo para desenvolver projetos paralelos. Segundo Alter, Pajitinov “trabalhou no Tetris durante mais tempo do que previra porque não podia deixar de jogá-lo”. Seu melhor amigo, Vladimir Pokhilko, instalou o game no laboratório do Instituto Médico de Moscou. “Todo mundo deixou de trabalhar, de modo que o eliminei de todos os computadores.” Não demorou para que conseguissem uma cópia.

3. Nem muito fácil, nem muito difícil. Essa evolução gradual faz com que o nível do jogo fique justo acima do alcance de nossas habilidades em um determinado momento. Ou seja: naquilo que o psicólogo Lev Vygotsky, especialista em aprendizagem infantil, chamava de “zona de desenvolvimento próximo”.

Desse modo, não apenas aprendemos, mas também curtimos o processo. De fato, com frequência nos vemos imersos na experiência até perder a noção do tempo, algo que o psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi chama de flow (fluir) e que muitas vezes vemos nas pessoas que praticam esporte, artistas e também nas que estão jogando.

Para curtir essa sensação, diz Alter, o desafio não pode ser muito difícil (pois provocaria ansiedade) nem muito fácil (porque ficaríamos entediados).

4. Sequência lúdica. O Tetris também proporciona sequencias lúdicas, que ocorrem “sempre que curtimos o breve prazer de resolver um elemento de um jogo e quando aparece outra peça incompleta”.

No caso do Tetris, isso acontece quando eliminamos uma (ou quatro!) linhas, que piscam antes da queda da peça seguinte. Essa sequência lúdica explica nossa atração não apenas pelos games, mas também pelas máquinas caça-níqueis e as redes sociais, para citar outros exemplos. Vamos de aplicativo em aplicativo no celular, buscamos pequenas recompensas na forma de tuítes, likes e novas fotos no Instagram.

5. O jogo é infinito. Não acaba. Nunca. Não há um último chefe para derrotar. Isso faz com que o importante seja o processo. Alter cita o desenvolvedor de games Bennett Foddy, que explica que alguns criadores são contra esse formato de jogo sem fim “porque aproveita uma fraqueza da estrutura motivacional das pessoas: não serão capazes de parar.”

Às vezes é até pior, diz Alter. É o caso dos jogos que obrigam você a parar… a não ser que pague para continuar, como Candy Crush.

6. Você também evolui com o jogo. Richard Haier, da Universidade da Califórnia, usou o Tetris num estudo em 1991. E concluiu que nosso cérebro melhora a resolução de tarefa difíceis com a prática.

Os participantes do experimento compareceram ao laboratório para jogar 45 minutos por dia, cinco dias por semana, durante oito semanas. Ao final, o pesquisador registrou um aumento na espessura e na atividade do córtex cerebral. “Basicamente – diz a Scientific American –, o cérebro usou mais energia nesse tempo de treinamento e incrementou sua espessura, o que significa mais conexões neuronais após a atividade.”

O estudo de Haier não é o único existente sobre o Tetris. Outro, de 2009, encontrou melhoras nas áreas do cérebro voltadas à atenção e ao raciocínio. Evidentemente, também é preciso lembrar que esse não é o único game que ajuda a melhorar nossas capacidades cognitivas.

7. Temos a impressão de construir algo. Muitos jogos consistem em matar zumbis, o que não tem nada de ruim. Qual seria a alternativa? Deixar os zumbis ganharem? No Tetris, “o seu esforço produz uma torre prazerosa de tijolos coloridos”, escreve Alter, embora a versão do primeiro Game Boy tenha sido em branco e preto. Essa sensação de criar algo com trabalho e esforço “é um motivo importante” por trás de hábitos que, “de outro modo, perderiam o atrativo com o tempo”.

Há outro detalhe importante, explica Pajitnov, o criador do jogo, no livro de Alter: “O caos chega até você na forma de peças ao léu, e o seu trabalho é colocá-las em ordem. Mas, quando você constrói a linha perfeita, ela desaparece. Só resta o que você não conseguiu completar.”

Não vemos os rastros do que conseguimos, mas todos os nossos erros ficam bem evidentes. Qualquer um que tenha jogado um pouco sabe como isso é irritante – e como, às vezes, o que mais nos motiva é a necessidade de corrigir esses erros. Será um pouco como a vida? Não, meu amigo, não. Também não vamos exagerar.

Imagem de capa: Shutterstock/Radachynskyi Serhii

TEXTO ORIGINAL DE EL PAIS






Informações e dicas sobre Psicologia nos seus vários campos de atuação.