Por Maria Gabriela Veridiano
De repente, o universo de fluoxetina começa desmoronar.
É, amigo, não dá mais para disfarçar.
Quem acredita em deuses, reza.
Quem acredita na palavra, canta mantra: venha paciência, venha serenidade, venha sabedoria, venha altivez, venha coragem, venha, venha, venha.
E nada aparece, nem deus, nem sentimento nenhum.
Nada além da sua vontade de sentar no chão e chorar copiosamente em posição fetal.
Um belo dia de chuva, em um feriado, você se levanta e reza que o dia vai ser bom se você determinar que ele será. É feriado, seu patrão diz que é ponto facultativo e você vai trabalhar. Jura, juradinho, que seu bom humor depende única e exclusivamente da sua mente linda e insana que te acompanha desde quando você nasceu. Você se esforça, pensa num pote lindo no fim do arco-íris. Repete: é o poder da mente! é o poder da mente!
Não-dá-certo. Você tem vontade de chorar ouvindo Caetano Veloso, assistindo vídeos sobre trabalho escravo ou simplesmente quando bebe água. Água te remete ao mar, às gotas, à ressaca nas pedras do litoral e, enfim, choro. E é numa hora dessas, meu amigo, que você sente uma nostalgia abissal da infância. Lugar no qual você podia simplesmente se esconder debaixo de uma árvore, fechar a porta do quarto ou fingir que vai embora de casa. Bem, ninguém realmente vai, e se vai, chega na padaria da esquina e lembra que está na hora do café da vó. E volta. Seria o sonho de muita gente se tudo se resumisse a ir embora, inclusive o meu. Mas chegou a hora de parar de encarar a vida como uma novela mexicana. A vida é feita de impossibilidades também.
Ficar significa aguentar. Conquistar significa resistir. Desistir não é uma opção para os resilientes. No fim, tudo se resume ao quanto você pode aguentar sem arriar os joelhos. E esse discurso é muito mais dolorido que bonito. Viver é muito mais sobre Tim Burton do que sobre Woody Allen. Não me lembro de alguém além da minha mãe ter me contando sobre isso. E a gente nunca quer acreditar, até o primeiro tombo, até o primeiro capote, até o primeiro erro. Já que a vida não é lá esse cenário colorido da disneylândia, a gente se acostuma com a rotina autoritária furta-sonhos, a gente se acostuma com a falta de paciência, com a falta de afeto, com excesso de brutalidade. Mas nos esquecemos que os ombros são humanos e que a gente ainda sente dor, por mais que o desejo de negar seja maior.
Uma coisa dá errado, e você pensa: “hum, ok”. Duas coisas dão errado, e você pensa: “é, né, faz parte da vida”. Quando três dão errado, você acha até graça. Seus ombros estão lá, deslumbrantes, se mexendo e dançando para qualquer problemática. Você aguenta uma coisa ali ou aqui. Muda algumas coisas de lugar e segue. Afinal, bonito na vida é ter brio e viver dentro de uma literatura Augusto Cury de ser. O problema é quando sua cartilagem começa dar sinais de desgaste e alguns hematomas aparecem. De repente, o universo de fluoxetina começa desmoronar. É, amigo, não dá mais para disfarçar. Quem acredita em deuses, reza. Quem acredita na palavra, canta mantra: venha paciência, venha serenidade, venha sabedoria, venha altivez, venha coragem, venha, venha, venha. E nada aparece, nem deus, nem sentimento nenhum. Nada além da sua vontade de sentar no chão e chorar copiosamente em posição fetal.
Colega, você não está sozinho. Eu quero sentar e chorar também, mesmo sabendo que às 6 horas amanhã o compromisso da vida me chama de segunda a sexta. Eu quero sentar e chorar, porque sou humana, porque me frustro a cada descoberta. A cada vez que vejo que nada é como me contaram. Eu sei que tudo que eu e você precisamos é de paciência. O mundo não se dobra as nossas decisões em um passe de mágica. Eu sei, nós sabemos, é questão de tempo. Mas enquanto o grande lance não acontece, eu vou sentar aqui e chorar minhas pitangas. É o que eu quero fazer agora, mesmo que depois eu levante e comece dançar macarena.
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