O amor se despede, lentamente, sem pressa, nas esquinas da nossa casa. Devagar, arrumamos as malas. Vamos ficando esquecidos nos cantos do quarto, ou como aquelas gavetas, cheias de roupas sem uso, guardadas por anos a fio, blusas amareladas pelo tempo. O amor dissolve, como gelo, sem frescor, solitário, esquecido. Ocupados demais com a vida, não percebemos os adeuses. Faltam cuidados necessários e o amor padece na UTI, esperando nossa visita, esperando por dias, meses e anos, longas esperas.
O amor se despede, emudece, silencia. Primeiro dá sinais de cansaço, depois manifesta exaustão. A boca fica seca, a garganta arranha, desiste de falar tantas coisas que aguardavam para serem ditas. Desiste porque não encontra ouvidos, cadeiras para o descanso, colo para o aconchego. Desiste quando vasculha o dicionário e não encontra maneiras de traduzir a dor, a solidão a dois, desiste quando a voz vira guerra, o coração, inimigo.
O amor se despede. Nas lágrimas que caem, abundantemente, depois, nas lágrimas escondidas, engolidas, camufladas. Lágrimas desejosas de vida, mas sem espaço, como aquelas bagagens preparadas para viagens longas.
O amor se despede quando vira refém. Mãos e pés amarrados, dias de medo, noites de insônia, fome de liberdade, fome de ser quem se é. Territórios demarcados, espaços limitados, cercas elétricas nos olhos, grades na alma, prisões emocionais.
O amor abre a porta e vai embora. Triste, encabulado, muitas vezes desesperado porque estava acostumado. Na despedida, sangra. Sente falta do barulho do chuveiro aberto por outras mãos, dos passos pela casa, dos sinais do outro nos armários. Sente falta das histórias comuns, de quem foram. Sente falta de todos os sonhos que ficaram submersos, afogados, enterrados, perdidos nos oceanos da vida. Sangra porque sente falta de si mesmo, não sabe mais seu nome. O amor de despede porque precisa existir.
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