Por Catiane de Oliveira
Perdas na Infância: Nossas experiências da infância não ficam presas na infância, elas nos acompanham por toda a vida. A pessoa que nos tornamos hoje, é o resultado de nossas experiências ao longo da vida, especialmente as experiências da infância.
As experiências de perda no decorrer da vida são inevitáveis. Estamos sempre, de alguma forma, vivenciando perdas. É impossível passar pela vida ileso a elas. Mesmo ao fazer escolhas, se ganha algo, mas também se perde algo. E a todo momento temos que fazer escolhas, sendo que, a cada escolha que fazemos, perdemos a outra possibilidade não escolhida.
No dicionário, podemos encontrar a definição de perda como: carência, privação, extravio, sumiço do que se possuía, dano, prejuízo, ruína.
Existem diversas possibilidades de perdas que um ser humano pode experienciar ao longo da vida, como por exemplo: a perda de um animal de estimação, de uma amizade, a perda da infância na transição para a adolescência, a perda de um membro ou função do corpo, o desmame, a perda do ano letivo escolar, a perda de um ente querido, dentre uma infinidade de outras possibilidades, sendo por este motivo, impossível tentar descrever todas elas.
Diante da inevitabilidade das perdas, o que fará toda a diferença é a forma como lidamos com elas. Não podemos mudar o que fazem conosco, mas temos liberdade para escolher o que fazer daquilo que fazem conosco.
Existe uma infinidade de perdas que uma criança pode vir a experienciar, podendo ser tanto concreta, como a perda por morte de um dos pais, ou simbólica, como a perda de uma infância feliz devido a maus tratos, negligência, entre outros.
As crianças sofrem perdas significativas para elas desde muito cedo, quando ainda são bebês, como por exemplo o desmame. Essas perdas quando não percebidas e orientadas por um adulto de forma positiva e adequada, ou seja, que possibilite superação do luto, estão associadas a transtornos psiquiátricos na idade adulta.
Toda perda, deve necessariamente passar por um processo de luto, para que haja a elaboração dessa perda. O luto refere-se ao período subsequente à perda, cujo objetivo é a adaptação, é adaptar-se emocionalmente a essa perda, é o processo de reconstrução, de reorganização.
Estudos indicam que a depressão e o transtorno bipolar estão associados a traumas na infância. Mas o que poderia caracterizar um trauma na infância?
Bem, existem uma infinidade de situações que podem ser traumáticas para a criança, como por exemplo: o abuso sexual, violência física, violência psicológica, o bullyng, a perda de um ente querido, acidentes, negligência por parte dos pais, abandono, fracasso escolar, rejeição, entre outras. Em geral, situações difíceis e que ficaram mal resolvidas.
Abuso sexual está associado a transtornos dissociativos – de uma forma simplificada, são transtornos do qual a pessoa deixa de perceber a realidade, confundindo-a com pensamentos, memórias e identidades de outras pessoas, podendo apresentar várias mudanças de personalidade.
O transtorno de estresse pós-traumático está associado a acidentes na infância. E o comportamento antissocial nas crianças, pode surgir a partir da perda de algo bom e positivo na experiência da criança, que lhe foi retirado.
A perda por morte, especialmente de um dos pais, está associada a depressão crônica e ansiedade (Leia Também: O Que é Ansiedade? causas, sintomas e tratamentos). No entanto, entre os fatores que podem modificar a probabilidade do desenvolvimento de depressão após a morte de um dos pais são as condições anterior, durante e após a morte. Ou seja, a qualidade da relação do pai que faleceu (se era boa ou ruim), às circunstâncias da perda (de que forma a pessoa morreu – de forma natural, por acidente, por suicídio, ou por assassinato) e os cuidados do pai sobrevivente (a qualidade do suporte, apoio e segurança que o pai sobrevivente está dando a criança).
A perda de um dos pais durante a infância também aumenta significativamente a probabilidade de desenvolver transtorno bipolar na idade adulta, sendo que, a perda por morte não natural (acidente, suicídio, assassinato) teria uma associação ainda mais forte com o surgimento de transtornos psiquiátricos na fase adulta.
A separação dos pais na infância, também é um fator de risco para o desenvolvimento de depressão na fase adulta, até mesmo maior do que a morte de um dos pais. O problema não é tanto a separação em si, mas sim, como ela acontece.
Um dos pais que fala mal do ex-parceiro na frente da criança por exemplo, pode gerar sentimentos de conflitos e confusão na criança, devido ao amor que ela nutri por ambos os pais.
Brigas e discussões podem gerar sentimento de culpa e angustia na criança. Ela pode pensar ser a responsável pelos desentendimentos.
A separação também pode gerar um sentimento de abandono do pai que saiu de casa, por este motivo, é necessário deixar claro para a criança que ela não está sendo abandonada e fazer-se presente o máximo possível na vida dela. Manter a rotina da criança também é importante.
Há relação também, entre abuso emocional na infância e aumento nos níveis de depressão na fase adulta – o abuso emocional pode ser caracterizado por um comportamento por parte dos pais como, dizer coisas do tipo: “você nunca vai ser nada na vida”, “você faz tudo errado”, “sua peste”, “nascesse para atrapalhar a minha vida”, e diversos tipos de outros xingamentos, chantagem emocional, entre outros.
Negligência está associada a dificuldades na expressão emocional e diversos déficits sociais e de atenção; e o abuso físico e sexual com a depressão.
Algumas perdas pelas quais as crianças passam, são consideradas irrelevantes para o adulto, tanto que, em muitos casos, nem é percebido que a criança pode estar passando por um período difícil e estar de luto por algo, precisando de auxílio para superar. Outras perdas, são mais facilmente percebidas pelos adultos, como a perda da morte de um ente querido, mas, são muitas vezes tratados erroneamente pelos adultos, na tentativa dos mesmos, de proteger a criança – indico o artigo Luto infantil: Como agir com a criança enlutada.
A maioria dos adultos sabem pouco, e tem pouca habilidade para lidar com as perdas das crianças, devido possivelmente, a dificuldade de lidar com as próprias perdas. Essa dificuldade pode acontecer, devido à pouca ou nenhuma oportunidade de aprender a lidar de forma positiva e construtiva com elas desde a infância.
É preciso que os adultos prestem atenção nas crianças e nas perdas que elas sofrem, por mais irrelevantes que possam parecer, e ao perceberem alguma dificuldade da criança em lidar com essa perda, orientá-las para a superação das mesmas. É indispensável que os pais entendam que as suas atitudes tem muito mais influência sobre as crianças, do que muitas vezes eles imaginam.
TEXTO ORIGINAL DE O PSICÓLOGO ONLINE
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