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Sobre o anseio humano de eternidade

Eternidade, eis uma palavra que provoca inquietação em todo mortal. E a finitude humana é a razão de tal inquietude. Sendo mortais, aspiramos eternizar a existência ou o seu registro. Daí que há milênios, acalentamos o desejo da vida duradoura. Nem percebemos, mas todos os dias, algo acontece que nos leva a pensar na mortalidade com alguma vontade de driblá-la. No dia a dia, atos cotidianos ou experiências extraordinárias estão sempre envoltos no latente desejo de eternidade. Um exemplo? Experimente passar creme hidratante; tomar hormônios; olhar estrelas, amanheceres e jequitibás sem pensar na finitude e na permanência. Você verá que é quase impossível.

A questão da finitude embala esperanças desde sempre e tem sido pensada por homens inquietos. De Heráclito, passando por Parmênides, Platão e Aristóteles, entre outros, muitos tentaram desvendar a vontade de domar a impermanência. Os filósofos pensaram a eternidade de pontos distintos. A visão de que é eterno algo com duração infinita no tempo é a mais repetida. Aristóteles, entretanto, tem visão singular, pois afasta a noção de eterno do conceito de tempo. Ele diz que eterno é o que não está no tempo e, portanto, não é por ele abarcado.

Os místicos, por sua vez, tratam a eternidade como um lugar no qual o tempo não é contado ou sentido. É o lugar místico da permanência como graça ou danação.
Nós, simples mortais, entretanto, podemos imaginar a eternidade não como um lugar ou uma função do tempo. Podemos concebê-la como qualidade do que se lança adiante com força humana deixando sementes sublimes por onde vai. Um conselho repetido no senso comum é que para firmar marcas, devemos fazer três coisas: plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho. Se atentarmos bem, estas tarefas encerram a noção de semeadura.

A planta, germe de nutrição; o livro como larva do saber e filhos como sementes da espécie.
Como resumo das sementes fundamentais, essas três tarefas fazem sentido. Freud, contudo, também atribuía caráter construtor de sentido de vida ao amor e ao trabalho.
Para o psicanalista vienense, essas duas áreas da vida nos unem à civilização. De fato, quando pensamos em amores como os de Romeu e Julieta que atravessam a morte; nos amores felizes que perenizam o romantismo; ou nos amores perdidos, escondidos ou incompreendidos que deixam marcas de sua dor, vemos que a força do amor é mesmo duradoura.

Também, quando vemos o painel das realizações humanas, podemos sentir que o trabalho nos arremessa para além, eternizando seu legado às gerações futuras.
Concordando com Freud, nas tarefas feitas com empenho e no amor vivido com inteireza, deixamos sinais imorredouros. No entanto, além do amor e do trabalho, são pilares da existência com sentido de permanência, toda experiência que provoque enlevo sublime ou sentido extraordinário tem valor perpétuo.

Uma ilustração desse tipo de experiência está no filme The Bucket List (Antes de Partir). Carter, personagem de Morgan Freeman, descobre que morrerá em breve e faz uma lista de tarefas a fazer ‘antes partir’. Examinando o rol de ‘loucuras’, percebe-se que Carter definiu tarefas que exigem empenho apaixonado; provocam enlevo ou o confrontam com sensações extremas.

E qual o sentido de tais façanhas? O que Carter, de fato, buscava era arremessar-se ao eterno por meio de ações que fariam seu espírito pulsar; era realizar coisas que o conectassem com a força de existir. Suas tarefas o colocavam em contato com a beleza inefável de estar vivo, com a emoção autêntica de sentir-se capaz e com o espanto de ainda poder descobrir coisas que levariam sua alma mortal a tremer.

Carter não deve ter tido trabalho para relacionar tais tarefas, pois são inumeráveis os atos que tocam o eterno.
Exemplos?
Quem não se conecta à beleza impenetrável da vida ao ouvir o canto de um pássaro, ao emocionar-se com a lágrima triste de um homem velho ou sentir o carinho aveludado da mão enrugada de uma avó? Quem não sente a alma trêmula unir-se ao infinito, num ato de extrema solidariedade e compaixão?

Quem não viaja nas asas da eternidade diante de um mestre que ensina se esvaindo de amor pelo saber; ou quando escuta uma sonata de Bach, o Noturno de Chopin ou os concertos para piano de Tchaikovsky? Quem não toca o eterno ao ler as tragédias e comédias de William Shakespeare e os poemas de Pablo Neruda? Quem não se transporta à dimensão intemporal quando vê filmes grandiosos como ‘E o vento levou’ ou Casablanca? Quem não prende uma lágrima ao ouvir as composições de Max Steiner, vê um rascunho de Leonardo Da Vinci ou o autorretrato de Rembrandt?

É isso. Tocamos a eternidade em atos e ações. Portanto, buscar eternizar-se não se restringe a questões de tempo ou permanência física. Exige imaginar que há em tudo que é feito e sentido de forma sublime, um germe do infinito. Só o sublime é infinito como o brilho das estrelas; a compaixão sentida em carne viva ou a palavra de amor presa no céu da boca. Todos nós, em algum momento, tocamos o sublime, então, somos eternos nem que seja por um segundo de eternidade.

Liduína Benigno Xavier

Psicóloga, Mestre em Educação, formação em Facilitação de Processos humanos nas organizações, a escritora é consultora organizacional há mais de vinte e cinco anos; É autora do livro: Itinerários da Educação no Banco do Brasil e Co-autora do livro: Didática do Ensino Corporativo - O ensino nas organizações. Mantém o site: BlogdoTriunfo que publica textos autorais voltados ao aperfeiçoamento pessoal dos leitores e propõe reflexões que ajudam o leitor a formar visão mais rica de inquietações impactantes da existência.

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