“A  primeira coisa que você vai notar ao me observar é que estou inquieta. Melhor, sou inquieta. Estarei mexendo no meu cabelo, balançando os pés ou batucando a caneta. Quando percebo o que estou fazendo consigo parar. Mas irei começar novamente assim que eu me distrair e esquecer o que estava fazendo.

Me distraio com facilidade também . Um mosquito acabou de passar ao meu lado e já… O que eu estava falando mesmo? Vou pegar um copo com água . Chegou uma mensagem no WhatsApp. Espera aí que já volto. Começo a escrever novamente e me lembro que preciso mandar um e-mail. Tudo bem faço isto depois. Mas deixa eu dar só uma olhadinha no Facebook.

Nossa, aquela amiga saiu e nem me chamou. Ou será que me chamou e eu esqueci? Não consigo me lembrar. Não vou fazer drama afinal eu nem queria sair mesmo. Aliás, hoje eu nem queria sair da cama. Tá tudo tão ruim. Pronto! Já fiquei triste. Nem sei como vim parar na página do primo da amiga do meu colega de faculdade. Ele é bonito. Será que mando algo em inbox para meu colega de faculdade? Vou mandar. Mandei. Droga. Não devia ter mandado. Ele nem é tudo isto.

Vou voltar a escrever. Mas agora estou cansada. Vou assistir um filme. Este filme não  está bom. Vou ler um livro. Vou onde está aquele livro que eu queria ler ? Qual era mesmo? Droga, preciso arrumar minha estante. Vou arrumar agora. Vai por ordem alfabética. Não, melhor por tamanho do livro. Ou melhor por assunto. Olha, este livro que eu estava procurando para ler semana passada. Celular está tocando. Onde que eu coloquei ele mesmo? Estava na minha mão agora pouco. Perdi. Também parou de chamar. Se for importante ligam de novo. Mas quem será que me ligou? Preciso descobrir. Cadê meu celular gente? Vou morrer se eu não achar. Achei. Número desconhecido. Deixa para lá.

Voltemos ao texto. Me perdi em meus pensamento né? Me desculpe.

Além de inquieta e ter dificuldade de manter a atenção sou impulsiva. Claro, a tríade do TDHA. Faço coisas sem pensar e depois paro para pensar nas consequências. Não faço por mal, mas quando vejo já fiz. Me arrependo, fico dias pensando, perco o sono. Me sinto uma porcaria. Pior do que a mosca do cocô do cavalo. Não quero ver ninguém.

Sou instável com as minhas emoções e sentimentos. Tenho dificuldade em me relacionar por que perco o interesse rápido. Uma hora morro de amores e no dia seguinte já não me sinto tão empolgada. Não queria ser assim. Sofro e sei que faço as pessoas sofrerem. Me sinto triste. Não queria ser assim. Isto me deixa ansiosa e inquieta. De novo. Preciso levantar um pouco. Sei que não terminei o texto mas até você já percebeu que minha mente está a mil e preciso de um ar.

Daqui a pouco eu volto. Quer saber ? Me cansei. Vou desligar este computador e tentar dormir. Mas claro, pensarei muito : antes passarei a minha vida inteira a limpo , irei me lembrar de tudo o que eu me esqueci de fazer durante o dia e quando eu finalmente estiver exausta irei dormir. Mas meu sono será irregular. Afinal eu mexo muito na cama. Amanhã terei dificuldade para acordar porque dormi pouco. Tudo bem, amanhã eu começo tudo de novo. Mas o que eu estava falando mesmo? “

De quem é este relato? Meu. Fui diagnosticada com TDHA há três meses. Hoje tomo medicamento e continuo a fazer minha terapia.  O que mudou? Muita coisa. Hoje sei o que eu tenho e com isto me entendo. Sei os meus limites, aquilo que é biológico ,  aquilo que é psicológico e aquilo que simplesmente se tornou um hábito e preciso me esforçar para mudar.  Estou em processo e vejam bem : consegui terminar o meu texto!

Ah, Sim! Sou psicóloga. Como consigo atender as pessoas? Fácil ! É que ajudar as pessoas é a minha área de hiperfoco. Sou capaz de fazer isto por horas.

Imagem de capa: Shutterstock/AH86

 

Debora Mendes de Oliveira

CRP: 06/123470. Psicóloga clínica (UNIP 2014), com ênfase psicanalítica, com experiência em atendimento voltado para abuso sexual, transtornos psiquiátricos tais como depressão e ansiedade, compulsão por internet e compulsão alimentar. Nas horas vagas é escritora por diversão.

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