COMPORTAMENTO

SPLIT (FRAGMENTADO) – O filme de terror psicológico que mostra o poder da mente humana

Por Elaine Castanheira

A maioria de nós já experimentou uma dissociação leve, como sonhar acordado ou se sentir perdido no tempo e no espaço por alguns segundos enquanto fazia alguma coisa. Quantas vezes você já chegou em casa sem se dar conta do trajeto utilizado? Seja caminhando ou dirigindo. O Transtorno Dissociativo de Identidade é uma forma grave de dissociação, uma doença séria que produz uma falta de conexão da pessoa com tudo que ela é.

O personagem principal do filme SPLIT convive com vinte e três personalidades em sua mente. Elas se diferenciam não apenas no gênero sexual, mas na idade, postura, gesto e maneira de falar, caracterizando assim o Transtorno Dissociativo de Identidade, popularmente conhecido como Múltipla Personalidade.

O que caracteriza a personalidade de uma pessoa é o conjunto de traços que definem o seu temperamento e o fazem agir a estímulos internos e externos. Com origem no latim, a palavra personalidade deriva de “persona”, que por sua vez refere-se à máscara teatral usada por artistas para desempenhar diferentes papéis ou disfarçar suas identidades. E, segundo especialistas, o Transtorno Dissociativo de Identidade é o desenvolvimento de duas ou mais personalidades para proteger o cérebro de grandes choques psicológicos. Como um disfarce.

“O transtorno não consiste em um defeito, mas em uma habilidade. O paciente usa a habilidade de se dissociar afim de ser capaz de lidar com um terrível trauma vivido na infância, o qual geralmente envolve tanto abuso sexual quanto físico. O transtorno é uma estratégia criativa e extremamente eficiente para a preservação da integridade do organismo em face de um trauma crônico que de outra forma seria catastrófico. ” Explica o doutor Colin A. Ross em seu livro Transtorno de Personalidade Múltipla, de 1989.

Hoje percebemos, cada vez mais, uma sociedade formada de pessoas acometidas por transtornos mentais graves, como o distúrbio em questão. No livro “Hoje eu sou Alice”, a autora Alice Jamieson relata seu inferno pessoal até ter o diagnóstico correto e assim conviver com o transtorno. A autora conta que tinha mais de dez personalidades, dentre elas uma criança de 9 anos, um professor universitário e uma alcoólatra. “Eu sempre soubera que algo estava errado comigo. Sempre. Não sabia que abrigava um bando de crianças tagarelas, todas aquelas personalidades substitutas, mas não me surpreendi completamente quando elas começaram a sair de formas mais abertas e óbvias— não como observadores, mas como protagonistas. Estava cercada por personalidades alternativas, como se cada uma representasse um aspecto meu em particular enquanto ocultava minha personalidade real, completa, de mim mesma e do mundo. ”

Há relatos de pessoas que “desenvolvem” habilidades conforme a mudança de personalidade. Tal como uma senhora que ficou cega após um acidente de carro, mas enxergava com outra personalidade. Embora a doença tenha sido reconhecida pela Associação Americana de Psiquiatria em 1980, ainda há um sem-número de interrogações a respeito dos problemas da mente e do que eles podem produzir. No filme, o personagem principal muda consideravelmente sua forma física ao mudar de personalidade, levando sua psiquiatra a sugerir que o transtorno, talvez, seja a chave para desbloquear as potencialidades não utilizadas do cérebro, já que aparentemente os seres humanos utilizam uma porcentagem pequena de toda capacidade cerebral (estudos sobre esta porcentagem não são conclusivos).

Mas quais seriam os gatilhos para alcançar o poder de criação do cérebro humano? Se nossa mente é capaz de criar personalidades para nos proteger, ela também seria capaz de alterar as situações do dia a dia? A psicóloga brasileira Maura de Albanesi, uma das maiores estudiosas sobre a mente, afirma que sim. Esta capacidade explicaria as situações repetidas pela qual passamos no âmbito financeiro, profissional, amoroso, físico, etc. De acordo com Maura, o que pensamentos e sentimentos se materializa. Um sentimento de culpa, inveja, ou medo, materializa nossas próprias ações e as ações de terceiros. Tudo começa e termina na mente, o equipamento mais sofisticado do universo.

Pessoas que sofrem de Transtorno Dissociativo de Identidade encontram tratamento exclusivamente na terapia. Não existe medicação para a doença. A terapia não tem a cura como objetivo, mas busca aproximar as personalidades, possibilitando que o comportamento do indivíduo se aproxime da perspectiva de um “eu” único. É uma forma de conviver melhor com seu repertório comportamental, buscando assim, às custas de ações mais laboriosas, o que todos nós buscamos diariamente: o equilíbrio entre a consistência razoável de nossa personalidade e as emoções do nosso consciente e inconsciente. Não por acaso, uma das 23 personalidades do protagonista de SPLIT encerra o filme afirmando que “somos aquilo que acreditamos ser”.

TEXTO ORIGINAL DE OBVIOUS

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