Temple Grandin é uma mulher autista, e tem 64 anos. Na infância teve professores especiais, mas depois estudou em escolas de crianças normais. Como se sabe, crianças “normais” não perdoam crianças que sejam um pouquinho diferentes delas. Quando percebem que Fulano é “estranho”, elas mangam, zoam, perseguem, às vezes dão porrada. Temple Grandin diz hoje que tinha dificuldade em entender a razão daquilo: “Eu pensava que todo mundo pensava igual a mim, e não entendia por que eles me tratavam daquele jeito”. Todo autista é uma pessoa completa, e toda pessoa é diferente. Quando alguém tem uma condição especial como autismo, isso é apenas 10 ou 20%, e os outros 80 ou 90% dela são tão imprevisíveis quanto os de qualquer pessoa. Nenhum ser humano pode ser definido exclusivamente em função de alguma condição especial que possua, seja ela qual for.
Temple estudou Psicologia e tornou-se uma defensora dos “direitos humanos dos animais”, se bem me exprimo. Planejou fazendas, currais e matadouros menos estressantes para o gado. Mesmo reconhecendo a necessidade do sacrifício do gado para nos alimentar, ela resume sua reivindicação para eles em “uma vida digna e uma morte indolor”. Incapaz de sentir emoções, como muitos autistas, ela mesmo assim fez muito mais pelos bichos do que muita gente que se comove com a tragédia deles mas não move uma palha em seu favor (eu, por exemplo).
Aqui está uma palestra dela:
“O mundo necessita de todos os tipos de mentes”. É uma mulherona grisalha, com camisa florida de cowboy, um jeito meio masculino. Vi-a pela primeira vez anos atrás, num documentário da TV que mostrava uma engenhoca bizarra que ela construiu, a “máquina do abraço”, uma coisa feita de traves de madeira, roldanas e tudo mais. Ela entrava naquela estrutura, movia controles, e as partes de madeira pressionavam partes diferentes das costas, das pernas e dos braços dela, produzindo-lhe “uma indescritível sensação de bem estar”. Deve ser o que as crianças normais sentem quando são abraçadas e acarinhadas pelos pais. O fato de Temple ter precisado inventar uma trapizonga mecânica para obter esse efeito mostra, como diria Drummond, que “cada pessoa é diferente e somos todos iguais”.
Os autistas se fixam em pequenas obsessões, diz ela: animais, automóveis, livros. Pode-se usar essas obsessões para lhes ensinar matemática, desenho, história, etc. Infelizmente nosso ensino não é (nem tem como ser) personalizado. Existe um conjunto de fórmulas que todos devem assimilar até a graduação e o diploma. Quando os autistas forem maioria (estão aumentando!), talvez isso mude.
Por Braulio Tavares, Via Mundo Fantasmo