“Na solidão da escuridão, quase consegui sentir a finitude da vida e sua preciosidade. Não damos valor, mas ela é frágil, precária, incerta, capaz de terminar a qualquer momento, sem aviso”. (Livro: Marley e Eu)
O Luto é um processo que se inicia após o rompimento de um vínculo e estende-se até o período de sua elaboração – quando o indivíduo enlutado volta-se, novamente, ao mundo externo. O luto é um processo essencial para que nós possamos nos reconstruir, nos reorganizar, diante do rompimento de um vínculo. É um desafio emocional, psíquico e cognitivo com o qual todos nós temos que lidar. Inclui transformação e ressignificação da relação com o que foi perdido.
Contudo, você sabia que há uma classificação e tipos diferentes de luto? Pois bem, eu fiz uma pesquisa e montei de uma forma didática o que se refere cada tipo. Minha intenção é apenas que esta lista seja uma ferramenta de referência para que você possa entender os diferentes termos que utilizamos para explicarmos o processo de luto que determinado indivíduo e/ou uma comunidade está vivenciando.
Fiz uma troca proposital de palavra, por entender que o luto seja um processo natural após uma perda significativa.
Num processo natural, as reações à perda de algo significativo, muitas vezes, incluem impedimento e/ou desinteresse temporário na realização das atividades diárias do cotidiano, isolamento social, pensamentos intrusivos e sentimentos de saudade e tristeza, que variam e evoluem ao longo do tempo. Em alguns casos pode culminar num estado de depressão. O traço mais característico no processo de luto são episódios agudos de dor, com muita ansiedade e dor psíquica.
Apesar do luto ser um processo universal, cada indivíduo possui uma forma particular de reagir. Este processo varia de acordo com a faixa etária em que o indivíduo se encontra, o tipo de vinculação existente e as causas e circunstâncias da perda. Varia também de acordo com sua estrutura emocional, vivências e capacidade para lidar com perdas. Quanto à duração do processo, não existe uma resposta conclusiva.
O processo de luto é vivenciado pelas pessoas de forma individual e subjetiva, o que torna inadequado estipular um prazo para seu término. Segundo Worden, no entanto, quando se perde uma relação próxima é muito improvável levar menos de um ano e, para muitos casos, pode levar dois anos ou até mais. É fundamental que esse processo de enlutamento seja vivenciado até que ele seja elaborado, para que a dor da perda não fique reprimida. Tal processo se dá de forma lenta e gradual, com duração variável para cada pessoa.
A aceitação só se dá a partir de um longo processo de elaboração e ela não significa esquecer, disfarçar que nada ocorreu ou ainda não sentir dor quando lembrar. Na aceitação o sofrimento psíquico e/ou emocional passa a ser menos intenso, e o indivíduo enlutado passa, geralmente, a restaurar laços sociais, recuperando vínculos antigos e estabelecendo novas relações. Ele retoma a capacidade de se envolver em atividades cotidianas.
Existem situações em que o processo de luto não segue a evolução normal, ou seja, o indivíduo não consegue se reestruturar, podendo ocorrer fixação numa das etapas e, consequentemente, a não elaboração do luto. Nestas circunstâncias, o luto permanece não resolvido ao longo do tempo, durante vários anos, e, por vezes, para o resto da vida, interferindo no estado emocional da pessoa e impactando significativamente a sua vida. Nestes casos, em que há o prolongamento do luto, o denominamos de Luto Complicado. Este se caracteriza por uma melancolia duradoura, acompanhada em geral de profunda tristeza, problemas de saúde, distúrbios psíquicos e diminuição dos contatos sociais, o que exige processos de readaptação com a ajuda de profissionais habilitados.
Segundo Horowitz, o luto complicado é a intensificação do luto até o ponto em que a pessoa se sente sobrecarregada, recorre a um comportamento mal adaptado ou permanece interminavelmente num estado de luto, sem progressão do processo em direção a seu término.
Alguns fatores podem nos auxiliar a identificar que a pessoa está vivenciando este processo. Por exemplo: foco extremo na perda e lembranças da pessoa morta; intenso desejo ou anseio de encontrar a pessoa; dificuldade para aceitar a morte; dificuldade para realizar coisas do cotidiano; estado de humor permanentemente alterado; comportamento antissocial; ideação suicida e comportamentos autodestrutivos; sentimento que a vida não tem qualquer significado ou propósito. Esta sintomatologia também pode ocorrer num processo de luto, no entanto, no luto complicado estes sintomas não mostram sinais de evolução e/ou melhora ao longo do tempo. Segundo Prof. Parkes, “Complicated bereavement is complicated” (Luto complicado é complicado).
Na minha concepção, o luto antecipatório se inicia a partir do diagnóstico de uma doença crônica sem possibilidade terapêutica de cura. Entendido como um processo de construção de significado para a vida. Permite ao paciente absorver a realidade gradualmente em relação às perdas dos aspectos significantes do corpo, da consciência, da personalidade, da autonomia; permite resolver questões pendentes; expressar sentimentos; perdoar e ser perdoado.
O Luto Antecipatório é um fenômeno adaptativo, no sentido de que é possível, tanto ao paciente quanto aos familiares se prepararem cognitiva, emocional e espiritualmente para o acontecimento seguinte, que é a morte.
Parkes nos diz que todos os lutos são traumáticos, diferenciando o fato de alguns serem mais traumáticos que outros. Este processo se inicia quando o confronto com a morte se deu de forma violenta e avassaladora. Acidentes de trânsito e queda de um avião são alguns exemplos. Os eventos traumáticos são permeados de desamparo e horror. Há uma (re)vivência ilusória ou alucinatória da experiência traumática, que se dá por meio de flashbacks.
Esse processo é desencadeado por uma catástrofe natural e/ou catástrofe humana sem precedentes, que acarreta sentimento de profunda angústia e que abala a forma como vivemos. Expõe à sociedade sua vulnerabilidade e mostra que o mundo pode ser um lugar imprevisível. Exemplos: Holocausto, tsunami, atentado terrorista (WTC). O luto é vivenciado por todas as nações, etnias e crenças.
Este tipo de luto se apresenta quando a sociedade ou a comunidade na qual o sujeito está inserido não valida ou ignora a perda sofrida, seja pelo fato de o relacionamento não ser legitimado, seja pela perda não reconhecida, seja pelo enlutado ou pela morte não serem aceitos. Num processo de luto não reconhecido, pode não haver condições para expressar o pesar, os sentimentos e até mesmo os conflitos relacionados à perda. A perda pode ser vista como irrelevante. Exemplo: morte do animal de estimação. Este processo também pode ocorrer quando a perda não está relacionada a uma morte. Exemplos: separação conjugal e/ou aposentadoria.
Este luto é caracterizado pela ausência das reações normais de um processo de luto. No luto adiado, a pessoa não se permite sofrer e não expressará o pesar por um longo período após a morte de um ente querido. Algumas pessoas tentam ao máximo adiar a tristeza, até que um dia não conseguem mais. As influências familiares e culturais podem afetar o percurso natural de um enlutado. Em muitas culturas, por exemplo, os homens são incentivados a não chorar, pois este ato é visto como uma demonstração de fraqueza. Então, muitos não expressam suas dores e adiam a experiência do luto por longo período. O adiamento de um processo de luto pode causar algumas doenças de ordem psíquico-emocional.
Este luto é caracterizado quando o indivíduo não demonstra sinais exteriores frequentes num processo de luto, como tristeza e raiva. A tristeza é inibida, e o indivíduo não permite que a realidade da perda seja vivenciada. Em alguns casos, o indivíduo age como se nada tivesse acontecido e retoma suas atividades cotidianas rapidamente lotando suas agendas de compromissos. O indivíduo que inibe a sua dor e angústia pode apresentar queixas psicossomáticas.
Como pudemos ver, há várias maneiras de contextualizar um processo de luto. Como psicólogos, devemos sempre acolher este enlutado, independente de qual seja o contexto de sua perda, e oferecer-lhe escuta ativa e disponibilidade emocional para poder auxiliá-lo a ressignificar a perda sofrida.
Nazaré Jacobucci
Psicóloga Especialista em Luto
Member of British Psychological Society
Referências:
Casellato G. (Org.). O resgate da empatia: suporte psicológico ao luto não reconhecido. São Paulo: Summus; 2015. 264 p.
Fonseca JP. Luto Antecipatório: As Experiências Pessoais, Familiares e Sociais diante de uma Morte Anunciada. Campinas: Editora Livro Pleno; 2004. 183 p.
Franco MHP, Polido KK. Atendimento psicoterapêutico no luto. 1º ed. São Paulo: Zagodoni; 2014. 96 p.
Horowitz MJ. Pathological grief and the activation of latent self-images. American Journal of Psychiatry; 1980.
Parkes CM. Amor e Perda: as raízes do luto e suas complicações. São Paulo: Sumus Editorial; 2009.
Worden, J. Grief Counseling and Grief Therapy. A Handbook for the Mental Health Practitioner (2nd ed.). London: Routledge.; 1991.
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